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Passaporte de sangue: NEOCOLONIALISMO DIGITAL
Ponto de Vista

Passaporte de sangue: NEOCOLONIALISMO DIGITAL

Enquanto a VSFGlobal e a Embaixada de Portugal não tomarem medidas concretas para corrigir esse sistema falho, e enquanto as autoridades cabo-verdianas continuarem a ignorar essa situação, a humilhação e o desespero dos utentes persistirão. É urgente que haja uma intervenção séria e comprometida para que a dignidade e os direitos dos cidadãos sejam respeitados. A esperança de um futuro melhor não pode ser sufocada por um sistema que deveria servir, e não punir, aqueles que buscam nada mais do que uma chance justa.

Em um canto esquecido de Praia, a VSFGlobal ostenta uma fachada de progresso e modernidade, prometendo soluções eficientes e acessíveis para quem deseja buscar novas oportunidades em Portugal. No entanto, por trás dessa fachada, esconde-se um sistema profundamente falho, que não só desaponta, mas também humilha diariamente centenas de cabo-verdianos.

O serviço de agendamento oferecido pela VSFGlobal, contratado pela Embaixada de Portugal, é um emaranhado de ineficiências e descaso. A plataforma online, que deveria simplificar a vida dos utentes, está viciada e manipulada. Agendamentos, que deveriam ser uma questão de clicar e seguir adiante, transformam-se em verdadeiros testes de paciência e resiliência. A cada tentativa frustrada, cresce a sensação de impotência e frustração.

O descaso com as pessoas é palpável. Longas filas se formam diante das portas da VSFGlobal, compostas por jovens, pais de família e idosos, todos com um sonho comum: um futuro melhor em terras lusas. No entanto, o tratamento recebido é de um desdém alarmante. A falta de supervisão e ação por parte das autoridades só agrava a situação. Os utentes são tratados com uma frieza burocrática que beira o desumano, como se fossem números e não pessoas com histórias, sonhos e aspirações.

Enquanto isso, o silêncio das autoridades cabo-verdianas é ensurdecedor. O governo, que deveria ser o primeiro a proteger seus cidadãos, parece alheio a essa realidade cruel. A inação é um sinal claro de conivência, um atestado de que os interesses dos mais vulneráveis são negligenciados em prol de uma relação diplomática questionável.

Para os jovens, a situação é especialmente devastadora. A ansiedade e a frustração se acumulam, levando muitos à beira do desespero. A discrepância nos valores cobrados para os agendamentos é absurda, uma barreira financeira intransponível para muitos. O sonho de uma vida melhor, de trabalhar e mudar o destino de suas famílias, é constantemente esmagado por um sistema que parece feito para falhar.

Esse cenário lembra tristemente o neocolonialismo. Os detentores de passaportes diplomáticos e seus filhos com cidadania portuguesa vivem em uma realidade paralela, alheios às agruras enfrentadas pelos filhos de agricultores e condutores. Estes últimos, que muitas vezes contam com a ajuda de parentes para enviar termos de responsabilidade, são tratados como cidadãos de segunda classe. Os "django's" de plantão, que desfrutam de privilégios inacessíveis à maioria, não conseguem – ou não querem – calçar os sapatos daqueles que estão na base da pirâmide social.

O que está em jogo não é apenas o acesso a um serviço de agendamento, mas o próprio direito de sonhar e lutar por um futuro melhor. A vida em Cabo Verde, embora digna, é marcada por desafios que muitos jovens querem superar. Eles sabem que em lugar nenhum a vida é fácil, mas desejam estar onde as oportunidades são maiores e onde podem melhorar a vida de quem amam.

Enquanto a VSFGlobal e a Embaixada de Portugal não tomarem medidas concretas para corrigir esse sistema falho, e enquanto as autoridades cabo-verdianas continuarem a ignorar essa situação, a humilhação e o desespero dos utentes persistirão. É urgente que haja uma intervenção séria e comprometida para que a dignidade e os direitos dos cidadãos sejam respeitados. A esperança de um futuro melhor não pode ser sufocada por um sistema que deveria servir, e não punir, aqueles que buscam nada mais do que uma chance justa.

Uma Falta de Empatia Crônica

O mais angustiante em toda essa situação é a completa falta de empatia por parte daqueles que têm o poder de mudar algo. Parece que a elite política e diplomática vive em um mundo à parte, onde os problemas do cidadão comum não passam de ruídos distantes. Seus filhos estudam nas melhores escolas, viajam livremente com seus passaportes portugueses e desfrutam de uma qualidade de vida que é um sonho distante para a maioria dos cabo-verdianos.

Os relatos de humilhação são numerosos. Pessoas que madrugam em filas, muitas vezes sem conseguir atendimento; famílias que gastam o pouco que têm na esperança de conseguir uma vaga para o agendamento, apenas para descobrir que os horários são constantemente adiados ou cancelados sem explicações. É um jogo cruel de esperanças esmagadas, onde cada falha do sistema representa um dia a mais de frustração e desespero.

A Luta pela Dignidade

Essa luta pelo direito de emigrar em busca de melhores condições de vida é uma luta pela dignidade. É a busca por um futuro onde o trabalho duro seja recompensado, onde as oportunidades não sejam um privilégio de poucos, mas um direito de todos. Cada jovem que adoece de ansiedade, cada família que se endivida na esperança de um agendamento bem-sucedido, é um testemunho de um sistema que falha em sua missão mais básica: servir as pessoas.

Os cabo-verdianos merecem mais. Merecem um sistema justo, transparente e eficiente. Merecem respeito e dignidade. E acima de tudo, merecem ser ouvidos. É hora de as autoridades cabo-verdianas e a Embaixada de Portugal reconhecerem o sofrimento que estão causando e tomarem medidas imediatas para reformar o sistema de agendamento da VSFGlobal. 

 

 

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