A sobrelotação dos jovens nos estabelecimentos prisionais de Cabo Verde
Ponto de Vista

A sobrelotação dos jovens nos estabelecimentos prisionais de Cabo Verde

Lamentavelmente, a população carcerária no país é essencialmente jovem, sendo que cerca de plenos 70% dos reclusos tem idade inferior aos 35 anos. A baixa taxa de escolaridade, um acentuado nível da pobreza e motivações de foro económico, acrescentado pelo uso de drogas, são fatores de motivação que levam muitos jovens a prática de crimes.

A Justiça constitui um bem fundamental e essencial no Estado de Direito elemento caracterizador para garantir o desenvolvimento de qualquer país. Nesta senda e tendo em conta a atual realidade dos serviços prisionais no país, revelam alguma apreensão, dos flagelos que nos assolam.

O direito penal moderno tem procurado adotar posições que promovam a aplicação de penas com um carácter mais ressocializador, na perspetiva daquele, que infringe as normas e condutas sociais, ainda que deva ser julgado e condenado, retorne ao seio social reeducado. Esta posição, hoje largamente assumida, defende que a punição constitui como um processo de reeducar o indivíduo. Contudo a prisão continua a ser vista como uma medida repressiva, que não tem, na maioria das vezes, conseguido atingir o seu fim que é a recuperação dos condenados/arguidos, e contribuem para que estes ao regressar à liberdade mantenham o sentimento e a tendência de reincidência na criminalidade cujo infelizmente é a dura realidade na cidade da Praia.

Lamentavelmente, a população carcerária no país é essencialmente jovem, sendo que cerca de plenos 70% dos reclusos tem idade inferior aos 35 anos. A baixa taxa de escolaridade, um acentuado nível da pobreza e motivações de foro económico, acrescentado pelo uso de drogas, são fatores de motivação que levam muitos jovens a prática de crimes.

As Cadeias, Central da Praia e de São Vicente, por exemplo, têm uma taxa de ocupação com o número de reclusos de aproximadamente duas vezes superior da sua capacidade total. Por outro lado, praticamente todas as demais cadeias apresentam igualmente evidências de sobrelotação. Razões apontam para a sobrelotação das prisões indivíduos oriundos, principalmente dos quadrantes mais desfavorecidas da população, faz-nos concluir que a pobreza e a exclusão social são as principais causas desta “triste realidade”.

Quando não se almeja alcançar logros palpáveis, mormente na criação de mais empregos, rendimentos e garantir a segurança, como tarefa do Estado, a consequência é o massivo número de jovens a cumprir penas nas prisões de Cabo Verde, revelando falhas de governação que precisam ser corrigidas. Assim mesmo, o país não pode continuar a perder mais vidas, com acentuados casos de agressão, delinquência urbana e sobretudo um aumento exponencial de prática de crimes de agressão sexual contra menores!

Se é certo que essa tarefa de regeneração não se mostra facilitada, desde logo, pelo contexto ditado, pela privação da liberdade, não é menos verdade que as probabilidades da regeneração a ser conseguida serem ainda menores, quando as condições prisionais são precárias, os direitos dos reclusos não serem respeitados e as políticas e programas de reinserção social serem ineficazes, apesar dos esforços dos técnicos sociais. Entretanto, faltam mais meios humanos, financeiros e técnicos, para um melhor trabalho de reinserção social em Cabo Verde.

Reiteramos que a atuação de todos os operadores do sistema judiciário, caso não forem acompanhadas de políticas públicas consistentes de forma estratégica pelo governo, mediante ações sociais e educativas, especialmente orientadas para a juventude com forte capacidade de reação aos fenómenos que vem surgindo no país, poderá comprometer a futuro das próximas gerações.

Em matéria de Justiça, Cabo Verde demanda vários desafios de forma que urge adotar reformas que se adequem as novas realidades e reais necessidades, com vista a termos uma sociedade mais pacífica, e evitem onerar o Estado, sobretudo com altos custos para a manutenção dos serviços prisionais e dos reclusos no cumprimento das penas, como por exemplo:

• Reforço substancial dos técnicos no sistema de reinserção social nomeadamente, psicólogos e assistentes sociais;

• Aumento considerável de ações de formações sobretudo nas áreas profissionais e técnicas permitindo que os jovens saiam com um ofício após o cumprimento das penas nas prisões de Cabo Verde;

• Acelerar as medidas para a redução da aglomeração de reclusos nas celas com impactos reais na diminuição da sobrelotação das prisões em Cabo Verde;

• Mais investimentos estruturais, com programas especiais, mais formadores, educadores e técnicos especializados nos centros sócio-educativos do país.

 

Admar Varela

14/02/2023

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