Neste país considerado de brandos costumes, reina uma sensação de que a sociedade se esqueceu que ainda tem o direito à indignação. É tanta brincadeira de mau gosto com coisas muito sérias que as pessoas ficam perdidas entre dois sentimentos – rir ou chorar. Protestar não faz parte da ementa. Coletivamente se assumiu que o melhor caminho mesmo é brincar. A ver se a gente se entende!
As entidades públicas, entenda-se governo, querem transformar o país num circo de diversão.
É verdade. As insistências do governo em entupir os olhos e os ouvidos dos cabo-verdianos com meias verdades – ou será mentiras enfeitadas de meias verdades? - sobre a Cabo Verde Airlines (CVA) é uma manobra de diversão, ou uma brincadeira de mau gosto simultaneamente cómica e estúpida.
Cómica, porque coloca o país numa situação de escárnio perante o seu povo, e estúpida, porque insistir em encenações para confundir o entendimento coletivo em plena era das TICs, é coisa que nem o próprio trapalhão do diabo faria.
Observando os factos que entre nós acontecem, facilmente se percebe que o país está perante um governo imbecil, que não acerta o passo nas questões essenciais da governação e aposta teimosamente num discurso de animação, com profundos danos no equilíbrio emocional da coletividade.
O processo governativo tem que ter resultados na economia, na vida das pessoas e no bem-estar coletivo. Alguém certa vez escreveu que discursos não governam o país, não resolvem os problemas e não criam soluções, mas, sim, as ações, as medidas de política, reais e mensuráveis, no tempo e no espaço.
O funcionamento da CVA, uma empresa estratégica em qualquer parte do mundo, não pode ser tratada como uma banda de animação, na esteira do que tem sido o timbre deste governo.
Pois, é verdade! Alguém consegue classificar o discurso do ministro dos Transportes e Turismo, ontem, 9 de novembro, na comunicação social, quando diz que o governo está a fazer todos os esforços junto dos islandeses para que a retoma do turismo seja feita com a CVA?...
Carlos Santos disse o que disse, minutos antes de presidir à apresentação do programa “Tourism Recover”, desenvolvido pelo Instituto do Turismo de Cabo Verde (ITCV), em parceria com Accelerator Lab do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
“Entendemos e estamos a trabalhar neste sentido. São dois trabalhos distintos, mas como também é do conhecimento de todos estamos a fazer um esforço enorme com a nossa parceira na Cabo Verde Airlines e estamos a fazer tudo para que isto se coincida e vamos continuar a trabalhar neste sentido”, garantiu, fazendo referência que estão a criar todas as condições para a retoma do turismo.
Apesar de todos os esforços de confidencialidade verificados ao longo dessa espinhosa parceria, as informações que cá fora chegam mostram que as relações entre o governo e o seu parceiro estratégico estão azedas. Olavo Correia, o principal rosto deste negócio, terá num passado recente assumido que efetivamente as coisas não iam bem e que o governo estaria a apalpar novos parceiros para a companhia.
Ora, enquanto se apalpa novas parcerias, o governo continua vinculando o tesouro público a novos créditos para financiar os Islandeses, sem que se perceba qualquer melhoria no funcionamento da companhia - não paga salários, não voa, enfim, não funciona.
E num ambiente empresarial desses, aparece o ministro dos Transportes e Turismo a falar de mais esforços do governo junto dos Islandeses… sem dizer que esforços, quando e como é que vão ser feitos.
Os principais países emissores de turistas estão a passar por momentos complicados de alastramento da pandemia. Muitos estão a regressar ao Estado de Emergência, pelo que não se percebe os esforços do governo para a retoma do turismo com a CVA. Quem são esses turistas? Onde estão? Que esforços são esses e com que meios estão sendo materializados?
Cabo Verde é um estado de Direito. As instituições democráticas estão vinculadas a vários princípios, entre os quais os da legalidade, da verdade, do interesse público, da eficiência e eficácia.
As ações e os discursos das entidades públicas devem obedecer esses princípios básicos, caso contrário nem brincando a gente se entende.
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