Motoristas de autocarro, vendedoras, taxistas e clientes estão a lidar com uma escassez de moedas na cidade da Praia, que chega a gerar acesas discussões e a causar prejuízos para alguns.
Na cidade da Praia, o preço de um percurso de autocarro é de 43 escudos (0,38 cêntimos do euro), mas, muitas vezes, os passageiros pagam com uma moeda de 50 escudos (0,45 cêntimos do euro) e recebem troco insuficiente, por falta de moedas, gerando discussões.
Fausto Gomes é condutor de autocarros públicos há vários anos e nunca tinha vivido uma situação idêntica. Viu-se obrigado a sair do veículo e deixou-o na paragem, para pôr termo a uma discussão com uma passageira, a quem não tinha trocos para entregar.
A cliente não desarmava, “estava chateada”, gritava e queria seguir viagem.
"Eu disse que naquela situação não ia a lugar nenhum, suspendi a viagem e disse para todos apanharem o próximo autocarro", contou o motorista.
Tudo por causa da escassez de moedas, que é tema nas ruas e nas redes sociais.
Fausto Gomes disse à Lusa que os conflitos por falta de trocos já têm originado casos mais complicados, em que é preciso chamar a polícia.
"O problema está mais na falta de [moedas de] dois escudos. Não está a circular, mesmo. Nós trocamos nas lojas, mas fazemos oito horas de serviço” e não é possível conseguir obter moedas que cheguem.
“Nem no banco, não há. E nós sofremos na pele, todos os dias", relatou, dizendo que a situação dura há cerca de um ano.
Por vezes cabe ao motorista cobrir do seu próprio bolso faltas, ao fim de cada dia, o que é cada vez mais frequente porque há cada vez mais passageiros a pagar por valor inferior, antecipando a falta de troco e “aquilo que sobra” nalguns bilhetes, não chega para a diferença.
Edite Vaz, empregada doméstica que apanhava o autocarro todos os dias para ir trabalhar, contou à Lusa que já deixou de o fazer, porque o motorista nunca tinha troco suficiente.
"Em minimercados também dizem que não têm e dão-nos uns ‘drops’ [rebuçados]", relatou.
Marlene Vaz, vendedora de frutas numa banca, na rua, no bairro de Achada Santo António, tem perdido tempo a procurar trocos nas imediações e, quando regressa, os clientes já foram embora.
"Outros nem esperam para irmos trocar, dizem que não têm tempo e acabamos por perder a venda", lamentou.
Ailton Gonçalves, taxista, disse à Lusa que já deixou clientes dentro do carro para ir à procura de trocos.
Noutras ocasiões, deixou os clientes saírem, “sem pagar, porque não há nada a fazer", ou seja, com o tempo que iria perder à procura de troco, pode apanhar outros passageiros.
Natalina Fernandes vende ‘fresquinhas’ (sumo gelado em saquetas) nas ruas da capital, por 20 a 25 escudos (0,18 a 0,22 cêntimos do euro), mas com a escassez de moedas, a venda tem ficado cada vez mais difícil.
"Perco muitas vendas porque há quem compre com [uma nota de] 500 (4,5 euros) ou de 1.000 escudos (nove euros), à espera de troco, mas não tenho", explicou.
A Lusa questionou o Banco de Cabo Verde (BCV) sobre o assunto, mas o regulador do sistema financeiro remeteu para um comunicado emitido a 02 de agosto, em que refere haver “um reforço do ‘stock’ de moedas, em curso”, como tem feito noutras alturas.
Anunciou ainda um estudo sobre o uso da moeda e uma campanha de sensibilização para que, quem as tenha guardado em casa, possa depositá-las nos bancos ou utilizá-las nos pagamentos do dia-a-dia.
O BCV indicou ainda desconhecer teorias que circulam para tentar justificar a escassez – como uma suposta fundição de moedas no país –, mas disse manter "estreita articulação" com a Polícia Judiciária, com vista à investigação de eventuais práticas ilícitas.
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