A linguista Dora Oriana Pires lança, hoje, o livro “O Cabo-verdiano, língua materna da República de Cabo Verde e sua introdução nas escolas do País”, no Centro Cultural do Mindelo, em São Vicente.
Em declarações à Inforpress, a linguista, que é deputada presidente da Assembleia Municipal de São Vicente e deputada nacional, explicou que se trata de um livro que resultou da sua tese de doutoramento e traz a preocupação acerca do ensino e valorização da língua cabo-verdiana e da formação dos professores.
“Resulta de um trabalho científico através do qual mostrou que a língua cabo-verdiana é uma língua como outra qualquer, é mais oral do que escrita, tem variantes assim como todas as línguas e que realmente precisa ser mais trabalhada para o ensino. Então, apresento propostas para formação de professores e a forma como ela deve ser introduzida no ensino”, explicou.
Segundo a mesma fonte, durante a pesquisa para a elaboração da tese, foram feitos alguns questionários através dos quais concluíram que os professores usam a língua cabo-verdiana, como apoio, para tirar dúvidas e para ajudar alunos a compreender a matéria.
E é por isso que, acrescentou, defende que deveriam introduzir a língua materna no Ensino Básico Obrigatório (EBO), porque é nessa fase que as crianças vão para a escola e, muitas vezes, têm “um impacto brusco com o português e a criança bloqueia o seu desenvolvimento intelectual”.
“Poderíamos instruir o ensino na nossa língua materna, talvez, do 1º ano do EBO até ao 4º ano, depois, introduzíamos o português até ao 9º ano do ensino secundário, com o ensino bilíngue. E depois, continuaríamos até o 12º ano com o português, os alunos poderiam desenvolver as suas competências orais e linguísticas na língua portuguesa”, propôs.
Para Dora Oriana Pires, se a criança tem a nossa competência oral na língua materna é preciso educá-la para conhecer e aprender a gramática na língua cabo-verdiana. E quando recebe ferramentas na língua materna e conhece a sua língua quer dizer que ela está melhor preparada para entender todas as línguas que lhe aparece pela frente, ajuntou.
Questionada se a introdução da língua portuguesa depois do 4º ano do EBO não prejudicará os alunos na aquisição das competências nessa língua, que serve de comunicação com outros países, a linguista afirmou que não.
“Não interfere em nada. Temos os Direitos Humanos que dizem que toda a criança deve ser ensinada na sua língua materna. E há muito tempo que a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) tem estado a insistir principalmente com os países ex-colónias, a chamá-los a atenção para o ensino da sua língua materna”, argumentou, defendendo que “uma criança tem a possibilidade de aprender quatro línguas ao mesmo tempo”.
Segundo a linguista, os cabo-verdianos nascem, criam e desenvolvem com a língua materna e quando vão à escola começam a falar somente o português e nada de crioulo. Na sua óptica esta situação “cria um bloqueio que não deixa a criança desenvolver de forma intelectual assim como outras que desenvolvem, de forma extraordinária, porque são ensinados na sua língua materna”.
Ademais, referiu que os cabo-verdianos vão estudar em outros países e não apenas em Portugal, pelo que se deve valorizar a nossa língua cabo-verdiana.
“Assim como são capazes de desenvolver competências na nossa língua também somos capazes de desenvolver em outra língua”, sintetizou.
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