MpD perdeu legitimidade política?
Colunista

MpD perdeu legitimidade política?

Um Governo pode ter seu mandato encurtado caso se verifique alguma ou algumas das hipóteses consagradas constitucionalmente para a sua destituição. O Governo do MpD ao se envolver tão intensamente na campanha para as eleições presidenciais a favor de um dos candidatos derrotados, sinalizou aos eleitores e aos partidos políticos da oposição que pode ter perdido a maioria eleitoral em caso de uma eventual eleição legislativa neste momento. Não há aqui confusão entre eleições legislativas e presidenciais, o fato é que os eleitores colocaram claramente em dúvida se neste momento o MpD mantém ou não a maioria absoluta do eleitorado caso as eleições legislativas voltassem a acontecer.

Nas democracias os concorrentes aos cargos políticos, partidos e candidatos, se submetem às regras institucionais previamente estabelecidas e reconhecidas para alcançarem os cargos em disputa.

À medida em que o jogo democrático é reiterado se consolida a cultura política do respeito e observância das regras tal que o resultado eleitoral para um ou outro candidato ou partido se tornam menos importante do que a confiança na lisura do pleito.

A representatividade do vencedor se torna tanto mais sólida e consistente quanto maior é a confiança dos concorrentes na honestidade do jogo e a democracia se fortalece com o reconhecimento que os vencidos atribuem aos resultados dos vencedores.

Nessa linha, na eleição presidencial do passado 17/10/21, a vitória do candidato José Maria Neves na primeira volta por 51,7% dos votos válidos se tornou significativamente mais importante com o reconhecimento desse resultado por parte dos vencidos, especialmente, do Carlos Veiga (42,4% dos votos), seu principal oponente naquela disputa.

A eleição não é um cheque em branco, é apenas um procedimento para se aferir a representatividade dos concorrentes ditada pelos eleitores e filtrada pelas regras de representação política adotada.

O eleito precisa mostrar e demonstrar ao longo do mandato conferido que é merecedor de confiança, ou seja, a sua legitimidade deve ser aferida e pode flutuar ao longo do mandato.

Em sistemas semipresidencialistas como é o nosso caso, a representatividade é conferida ao Presidente da República para um mandato de cinco anos e não existem instrumentos político-institucionais que o eleitor (através de seus representantes legítimos) poderá recorrer para abreviar esse mandato em caso de seu cumprimento incorreto.

A lógica desse figurino prende-se com o fato do PR não ser um “jogador” nesse xadrez político, mas tão somente um “árbitro” e “moderador” do sistema com poderes limitados.

Diferentemente ocorre com os partidos políticos, particularmente, o partido vencedor das últimas legislativas, o MpD.

Ressalto a diferença entre representatividade e legitimidade: o MpD em 18 de abril de 2021, ganhou por maioria absoluta uma representatividade outorgada pelos eleitores para um mandato de até cinco anos.

Ocorre que existem instrumentos político-institucionais para aferirem a legitimidade do Governo ao longo do mandato: a aprovação do programa do Governo, as moções de confiança e de censura, a verificação ou não de grave crise institucional.

Um Governo pode ter seu mandato encurtado caso se verifique alguma ou algumas das hipóteses consagradas constitucionalmente para a sua destituição.

O Governo do MpD ao se envolver tão intensamente na campanha para as eleições presidenciais a favor de um dos candidatos derrotados, sinalizou aos eleitores e aos partidos políticos da oposição que pode ter perdido a maioria eleitoral em caso de uma eventual eleição legislativa neste momento.

Não há aqui confusão entre eleições legislativas e presidenciais, o fato é que os eleitores colocaram claramente em dúvida se neste momento o MpD mantém ou não a maioria absoluta do eleitorado caso as eleições legislativas voltassem a acontecer.

A situação atual guarda semelhanças com o ocorrido em 2011 no aspeto formal quando o PAICV tinha ganhado as legislativas, mas o MpD fora bem-sucedido no apoio dado ao seu candidato vencedor às presidenciais naquele ano.

A diferença está no aspeto substantivo: em 2011, o eleitorado do PAICV se dividiu para apoiar dois candidatos diferentes do mesmo campo político na primeira volta e na segunda volta os apoiantes do candidato derrotado maioritariamente resolveram apoiar o candidato do outro campo político apoiado pelo MpD, Jorge Carlos Fonseca, que saiu vencedor.

Em 2021, o MpD e o Governo foram coesos para o apoio a um dos candidatos e este foi derrotado logo à primeira volta.

Em 2021, a liderança do MpD saiu muito contestada e fragilizada com o fracasso no apoio ao candidato às eleições presidenciais assim como acontecera com a liderança do PAICV em 2011.

As consequências dos erros tambarinas de 2011 foram sucessivas derrotas eleitorais, mas quais serão as consequências para os ventoinhas dessas turbulências eleitorais de outubro de 2021? 

Partilhe esta notícia

Comentários

  • Este artigo ainda não tem comentário. Seja o primeiro a comentar!

Comentar

Caracteres restantes: 500

O privilégio de realizar comentários neste espaço está limitado a leitores registados e a assinantes do Santiago Magazine.
Santiago Magazine reserva-se ao direito de apagar os comentários que não cumpram as regras de moderação.