Dois pormenores me chamaram a atenção na última semana. Digo pormenores porque, em boa verdade, aparentemente são situações que, não comportando gravidade extrema ou ilicitude, ainda assim, revelam sinais emblemáticos sobre as mundivivências das elites cabo-verdianas, do seu conceito de ética e da sua visão do mundo.
Começo por aquele facto que gerou mais sururu nas redes sociais e na comunicação social, incluindo a internacional. Refiro-me ao triste acontecimento verificado na Câmara Municipal dos Órgãos, onde o presidente cessante resolveu marcar seus últimos atos de gestão pelo pagamento do subsídio de reintegração a si próprio e à sua equipa, em vez de pagar os salários aos trabalhadores. Um facto, aliás, que suscitou de imediato a condenação generalizada da sociedade cabo-verdiana.
“Pelas Pessoas”, um pretexto para caçar o voto aos incautos
Será que o ex-presidente, Carlos Vasconcelos, cometeu algum crime? Aparentemente não! O pagamento do subsídio de reintegração está contemplado na Lei. A questão coloca-se, porém a outro nível: o da ética!
Para um ex-candidato que teve como slogan de campanha “Por São Lourenço dos Órgãos, pelas Pessoas”, no mínimo, não fica bem colocar 285 pessoas sem receberem os respetivos salários, principalmente num mês de festas natalícias.
Por outro lado, coloca à evidência que o slogan, afinal, não passava de um arrazoado de palavras tendo como único propósito caçar o voto aos incautos.
E, ainda, coloca-se uma outra questão: ao fazê-lo, o ex-presidente obstou a um direito trabalhista consagrado na legislação: o pagamento de salários, correspondentes às respetivas prestações laborais.
Apressados, vieram logo os apoiantes do ex-presidente avançar com exemplos de câmaras municipais que não teriam pago atempadamente salários a funcionários. Mas, a verdade é que não há conhecimento de nenhum presidente que se tenha dispensado do pagamento de salários para meter o dinheiro no próprio bolso.
O Fundo de Financiamento Municipal não estica e, muitas vezes, para serem garantidos compromissos com trabalhadores, câmaras municipais com reduzida capacidade de arrecadação de receitas vêm-se na obrigação de recorrer mesmo a pagamentos a descoberto.
Como se percebe, o problema aqui não é de legalidade, é de ética! E destapa a verdadeira natureza que faz mover vários políticos da praça: a ganancia!
O presunto de Óscar
Outro facto que suscitou sururu nas redes sociais foi uma foto publicada (que, entretanto, num súbito gesto de vergonha, apagou hoje mesmo) pelo Governador do Banco de Cabo Verde na rede social Facebook, posando ao lado de um presunto e de bebidas de custo inacessível à maioria dos cabo-verdianos.
Descontando a circunstância de Óscar Santos não perceber nada de presuntos, porque a faca que exibe na foto não é própria para fatiar os ditos (enfim, coisas de novo rico…), o exercício de ostentação do também ex-presidente da Câmara Municipal da Praia só lhe fica mal e pode (como foi) ser entendido como uma provocação aos milhares de homens e mulheres deste país que fazem das tripas coração para colocar nas respetivas mesas um prato que seja para garantir o sustento dos filhos.
Reparem bem na imagem: não se trata de uma foto de família em noite de consoada, é apenas a imagem de alguém sem noção do ridículo, fascinado pela sorte de ser novo rico. Deplorável!
Será que Óscar Santos não pode comprar um presunto e bebidas caras? Claro que pode e não é crime, é apenas a ostentação tola que lhe fica mal.
A título de conclusão, convirá dizer que, a este propósito, os exemplos até vêm de cima. Nos meus registos de imagens estão, ainda, as exibições gratuitas do vice-primeiro-ministro, posando em hotéis de todo o mundo, onde se hospeda em missão de serviço, passando a imagem de alguém que faz turismo à custa do erário público (embora não seja rigorosamente o caso).
Não é nada de novo, apenas as tristes figuras a que já nos habituaram as elites cá da tapadinha.
Comentários
Inox, 30 de Dez de 2024
...mesa é do tipo inox e por isso dispensa a toalha.
Oh, depois quem do direito, tem o dever moral de conferir o recibo dessa mordomia.
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Gust, 30 de Dez de 2024
Inda mas ku um mesa mal posto, nem tempo pa poi um toalha na kel mesa chik! kkkkkk
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Antonio, 30 de Dez de 2024
Esqueci-me dizer que nao aprecio certos comentadores que rodeiam , rodeiam e não dizem nada.
Comem a papinha fria que fica na ourela do prato, com medo de se queimarem no meio.
Perca de tempo
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Abtonio, 30 de Dez de 2024
O Senhor Pinho não tem papas na lingua.
Gostei de ouvir ontem domingo o debate da Salomé onde a Psicóloga Dirce pôs os dedos ba ferida, criticando os 4 dias de festa da Camara do Mindelo, em terra de carências varias.
VERGONHA que esses caras de lata convertem em cultura.
Apreciei tambem a abordagem sobre o surgimento dos novos ricos em vez de se acabar com a pobreza.
Que sirva de orientação o que ela diz.
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Casimiro centeio, 30 de Dez de 2024
Sempre que releio este Artigo, sinto-me impelido a comentar a subsequente reação. É que gosto de relê-lo. E isto faz-me lembrar da hipocrisia idiossincrática dos judeus da nossa terra, emblemada no aleivoso slogan :"SOMOS DIFERENTES, FAZEMOS DIFERENTE". Pois, professores menosprezados; saúde doente; país sem transportes; sociedade sem segurança; jovens sem emprego, em debandada; funcionários sem vencimentos. Em oposição: luxo, besunto, em mansões dos ruminantes obesos...
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Carlos Reis, 29 de Dez de 2024
Os maus exemplos dessas pessoas só provam que esses governantes não pensam nas pessoas. Basta ver também por exemplo que mais de uma centena de professores não recebem há mais de quatro meses os seus salários. Daí a pressa de enfiar goela abaixo o PCFR dos professores em pleno mês dedezembro. Pensam que fazem as pessoas de idiotas. E o pior é que não estão nem aí. Enquanto isso a turma dos metralhas recebem salários até adiantados.
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Zé P., 29 de Dez de 2024
Quem são essas pessoas que o MPD tanto quer mostrar serviço? Só se forem as suas própias pessoas, deviam mudar o slogan para "Pelas nossas pessoas", da mesma forma que Ulisses tinha outrora feito campanha: "Pelo partido" e só em segundo lugar "Pelo país".
Luisa Barbosa, 30 de Dez de 2024
"Pelas nossas pessoas". De facto este é o lema que melhor serve os interesses de certas pessoas que nos (des)governam. O MPD igual a si mesmo. A história se repete. Depois de quase 10 anos a governarem parecem que cansam do país e começam a surrupiar o povo.Responder
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Casimiro centeio, 29 de Dez de 2024
Amigo António Alte Pinho, nutro elevado respeito por ti e igual consideração pelo teu relevante Artigo, mas permite -me comentar á margem do mesmo, dizendo que se UCS, OC, ÓS. e os demais prosélitos são democratas, logicamente Hitler, Salazar, Marcelo Caetano, Mussoline e outros carrascos da mesma índole, são também democratas.Pois, são todos farelos do mesmo joio.Únicas diferenças existentes entre eles é o MÉTODO de matança e a ÉPOCA temporal de vivência!
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Victor Fortes, 29 de Dez de 2024
Além de esse comportamento de ostentação ser antiético, é também ilegal não pagar os servidores os seus salários a tempo e horas. Já diziam os laurentinos que Lela é mau!
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Domingos Cardoso, 29 de Dez de 2024
Vê-se claramente visto, que o nosso país está a precisar de mais responsabilidade e empatia dos "servidores públicos".
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Terra de burros, 29 de Dez de 2024
Como se diz...terra de burros cololo é rei, ou seja o modelo democrático instituído em Cabo Verde, carece de uma revisão profunda.
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