Vítimas gratas por estarem vivas após perderem quase tudo com as chuvas
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Vítimas gratas por estarem vivas após perderem quase tudo com as chuvas

 

José perdeu todos os pertences, Bebé ficou com a voz rouca de tanto chorar e Nelita perdeu o apetite, mas todos agradecem por estarem vivos após as fortes chuvas que causaram enormes estragos na cidade da Praia.

“Fiquei espantada, desorientada e em pânico”, desabafou à agência Lusa Maria Helena Andrade Alves, mais conhecida por Nelita, moradora no bairro de Jamaica, uma ribeira nas imediações do Aeroporto Internacional da Praia, a menos de três quilómetros do centro da cidade, que foi uma das zonas mais afetadas pelas chuvas que caíram durante o fim de semana.

Natural da ilha do Fogo, Nelita vive na Praia há 16 anos e construiu a casa na Jamaica há cerca de dois anos, onde mora com quatro filhos, que acordaram sobressaltados na manhã de sábado quando sentiram água entrar pela casa dentro.

Um tronco de árvore derrubou parte de uma parede do quintal e a água começou e invadir os quartos. Alertada pela irmã, Nelita só teve tempo de desligar o disjuntor, para evitar o pior com choque elétrico.

“Disseram-me para sair e fui para cima da casa. E agradeço a Deus porque principalmente salvei a minha vida e a dos meus filhos”, disse Nelita, vendedora no Sucupira, mas que perdeu a maioria dos pertences que tinha na sua habitação, onde a água atingiu uma altura de cerca de 50 centímetros.

Dois dias depois, a casa ainda está cheia de lama, tudo amontoado em cima de camas, mesas e no terraço, e Nelita conta com o apoio dos vizinhos para ultrapassar o momento.

“Eu não tinha nada. Consegui e volto a conseguir pouco a pouco”, afiançou Nelita, com os olhos marejados, mas garantindo que a esperança é a última a morrer.

A moradora explicou que foi no leito da ribeira da Jamaica que encontrou terreno e que as suas possibilidades deram para construir 

Mas, depois de perder quase tudo, pede agora às autoridades para a ajudarem a construir um muro para desviar o curso das águas e evitar que próximas cheias invadam a casa.  

“Nunca imaginei que isto poderia acontecer. Se imaginava, nunca teria construído casa aqui”, disse, por sua vez Maria Isabel Andrade Alves, mais conhecida por Bebé, também natural da ilha do Fogo, com casa construída paredes meias com a irmã Nelita.

Há 15 anos na Praia, Bebé mora na Jamaica desde 2011, está ciente dos riscos que corre por ser o leito de uma ribeira, mas explicou que não tem condições para morar noutro sítio.

Na manhã de sábado, ela, o marido, três filhos menores e uma sobrinha estavam todos deitados ainda, mas acordaram com a água das chuvas a entrar pela varanda da casa e já nem o portão conseguiram abrir.

“Fiquei desorientada. É algo que nunca me aconteceu. Fiquei traumatizada e a tremer”, contou à Lusa Bebé, que ainda tem a voz rouca de tanto chorar, e não conseguiu conter as lágrimas ao recordar tudo o que passou com a família.

Bebé, que também é vendedora ambulante, relatou que só teve tempo de tirar alguns fios de luz do chão e subir a correr para o terraço para salvar os filhos, mas perdeu a maioria dos pertences.

“Isso é que mais essencial, a preocupação com os meus filhos e a minha vida. Não me preocupei com mais nada, só com os meus filhos”, afirmou a moradora da Jamaica, que desde sábado está a dormir com a família em casa de vizinhos da mesma zona.

Mesmo depois do susto, Bebé garantiu que vai continuar a morar na ribeira da Jamaica e pediu “vontade” às autoridades para apoiar as pessoas mais afetadas, como o senhor José Alves Fernandes, 56 anos, também natural da ilha do Fogo.

Há 32 anos a viver na Praia, José Fernandes tem quatro filhos, que estão com a mãe noutro bairro, e deixou de pagar renda para morar sozinho há seis anos num barracão feito de chapas, ferro e madeira numa encosta na Jamaica.  

Talhante de profissão, Fernandes disse estar há praticamente seis meses sem fazer grandes trabalhos por causa das restrições impostas para evitar a propagação da pandemia do novo coronavírus, e agora passou pelo susto das chuvas a invadir a barraca.

José Fernandes contou que um vizinho, que viu a sua aflição no meio das cheias, abriu um buraco num dos lados da barraca para ele conseguir sair, mas do pouco que tinha, tudo ficou destruído.

“Estou praticamente na rua”, lamentou o morador, que conta com a solidariedade do vizinho e disse esperar por apoio da Câmara Municipal da Praia.

Na madrugada de sábado choveu com grande intensidade na cidade da Praia, provocando a morte de uma criança, várias inundações, desmoronamentos e destruição de viaturas e edifícios.

O primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, anunciou no domingo um programa de emergência para fazer face aos muitos estragados na capital do país, que tem ainda muitas zonas intransitáveis, lama e águas estagnadas por todo o lado e o trânsito caótico.

Em várias zonas já havia hoje trabalhadores e realizarem obras de desobstrução das principais vidas, em arranjos que deverão durar várias semanas para a capital voltar à normalidade.

Além da Praia, a chuva caiu durante o fim de semana em praticamente todo o arquipélago, provocando alguns estragos, mas deixando muita água e alegria sobretudo aos agricultores e criadores de gado.

Com Lusa

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