
A jornalista Aníria Teixeira foi correspondente da Rádio Televisão Cabo-verdiana em Lisboa, de 2023 a 2024. Quando passou pelo pior período de sua vida, ao perder o um filho aos cinco meses de gestação, foi dispensada por e-mail pela PCA da empresa, que rescindiu o contrato sem qualquer justificação. A alegação escudou-se num seco “por razões internas”. Nunca ninguém lhe deu qualquer resposta aos insistentes pedidos para que apontassem a razão da dispensa dos seus serviços. Tão-pouco, ninguém do Conselho de Administração lhe apresentou condolências.
Aníria Teixeira, 35 anos, com dez anos de carreira de jornalista, foi de 2023 a 2024 correspondente da Rádio Televisão de Cabo Verde (RTC) em Lisboa. E, embora uma das cláusulas do contrato determinasse que este poderia ser rescindido a qualquer momento, a verdade é que o Conselho de Administração da RTC nunca avançou com uma justificação objetiva.
Um seco “por razões internas” foi o argumento usado para dispensar uma jornalista com uma trajetória exemplar e uma jovem mãe que havia perdido um filho aos cinco meses de gestação. A rescisão do contrato, anunciada por e-mail pela PCA da RTC, Karine Miranda, precisamente trinta dias após ter saído do hospital e comunicado o ocorrido.
Mandada embora quando estava mais fragilizada
“Foram cruéis comigo”, diz Aníria Teixeira ao nosso jornal, mas também se poderia dizer “desumanidade”, “insensibilidade” ou “falta de empatia”. A jornalista foi mandada embora quando estava mais fragilizada e ninguém do Conselho de Administração ou das direções da RCV ou da TCV sequer lhe enviou as condolências. A única exceção foi a então chefe de Informação, Dina Ferreira que, também como Aníria, nunca foi informada das razões da rescisão do contrato da ex-correspondente em Lisboa. Aliás, ninguém na RTC, mesmo decorrido em tempo, conhece qualquer razão em desabono da jornalista.
Quando percebeu que tinha uma gravidez de risco, Aníria fez tudo direito, enviou um e-mail à PCA, com conhecimento dos dois outros membros do CA e das direções da RCV e da TCV, mas nunca recebeu qualquer resposta. E, apesar do seu estado crítico, continuou a trabalhar, sob grande sacrifício, até ao quinto mês de gestação.
“Enviei um e-mail, mas ninguém me respondeu. Continuei a trabalhar, só que já comecei a ficar ansiosa, a minha tensão começou a subir, estranhei não me dizerem nada”, diz-nos a jornalista, com a voz embargada pela revisitação de recordações que marcarão a sua vida para sempre.
É ainda Aníria Teixeira que prossegue, recorrendo à sua memória: “eu comecei a dizer ‘meu Deus, se eu perco o trabalho como é que vai ser com o bebê que está para nascer?’ Comecei a ficar muito preocupada”.
Partilhando a redação com a RTP África (na foto), Aníria recorda a empatia que sentiu da parte dos colegas portugueses: “os meus colegas são extremamente empáticos. Os repórteres de imagem não me deixavam carregar um tripé, era toda a gente com cuidados comigo”. Cuidados e empatia que nunca sentiu da parte de quem manda na RTC.
Uma falta de empatia que se traduziu na indiferença do CA e das direções da RCV e TC ao e-mail que a jornalista enviou após dois dias de internamento no hospital.
“A primeira coisa que fiz quando cheguei a casa foi enviar um e-mail. A única resposta que tive foi da PCA, trinta dias depois”, anunciando a rescisão.
Rescisão do contrato não indica razões objetivas
“Disse que, ‘por razões internas’, estavam a proceder à rescisão do meu contrato. E eu, então, enviei um e-mail onde anexei links de alguns trabalhos”, diz Aníria, questionando: “como é que rescindiu o contrato se a RTC estava a ganhar, se o meu trabalho estava a ser reconhecido”. Um reconhecimento, aliás, da própria RTP África.
O questionamento da jornalista faz todo o sentido, “por razões internas” não é argumento nenhum, quando se rescinde o contrato com alguém é por razões objetivas e tudo leva a supor que a rescisão nada teve a ver com o trabalho da ex-correspondente em Lisboa.
PCA reconhece, implicitamente, a qualidade do trabalho da jornalista
De facto, após a rescisão, a PCA ainda lhe enviou uma mensagem por WhatsApp a perguntar-lhe se estaria interessada em fazer um trabalho. Aníria voltou a questionar as razões da rescisão do contrato, mas foi ignorada por Karine Miranda que, depois, bloqueou a jornalista.
O pedido da PCA é, aliás, um reconhecimento implícito de que o trabalho era de qualidade, não é? “Precisavam de mim”, responde Aníria que, ainda hoje, não consegue encontrar razões para a rescisão do contrato.
No “fundo do poço”
Aníria Teixeira, como ela própria reconhece, chegou ao “fundo do poço”. “Se não tivesse tido a minha família, os poucos amigos a dizerem-me, ‘Aníria, a vida é preciosa’, dificilmente me teria reerguido, porque, nessa altura, eu pensava que tinha feito alguma coisa errada, mas não sabia o que era”. Mas, hoje, a jornalista, que teve de recorrer a apoio psicológico, sabe que não fez nada de errado.
“Hoje eu tenho essa consciência, sim, mas foi preciso muito trabalho”, diz Aníria, que superado o trauma da injustiça a que foi sujeita, passou da circunstância de vítima para o estatuto de sobrevivente.
PCA “destrata” funcionários
Atitudes deste tipo por parte da PCA e da maioria do Conselho de Administração não são únicas. Recentemente, uma jornalista da RTC, grávida, que exercia funções em São Nicolau foi, também, dispensada “por razões internas”. Mas há, ainda, vários relatos de funcionários da RTC que já foram reiteradamente “destratados” por Karine Miranda, como é o caso de uma ex-chefe do Departamento de Recursos Humanos que, farta das “desconsiderações” da PCA, acabou por ir embora da empresa, rescindindo o contrato por iniciativa própria.
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