Alguém anda a brincar de Governo! A posição do primeiro-ministro e presidente do MpD, Ulisses Correia e Silva, sobre a proposta da líder do maior partido da oposição, Janira Hopffer Almada, em relação ao processo de regionalização do país, só pode ser a de alguém que anda a brincar de Governo.
O chefe do Governo considera "perniciosa e perigosa" a proposta de reforma do Estado apresentada pelo PAICV, consubstanciada na redução do número de deputados, na introdução de listas uninominais nas eleições e, consequentemente, na remodelação completa da estrutura organizacional e administrativa do país.
O líder do partido da liberdade e da democracia tem a coragem de afirmar que a proposta da oposição atinge o “coração do sistema”, porque “são motivadas por contas aos custos da existência de deputados” e que, “lá no fundo, se estigmatiza a sua utilidade”. Na sua opinião, o deputado é imprescindível para o sistema - ou seja, tudo com e pelos deputados, nada sem os deputados - quando escreve que “optamos pela democracia representativa e nela o deputado, seja aquele com mais visibilidade e intervenção nas sessões parlamentares, seja aquele que raramente usa da palavra, é parte imprescindível do coração do sistema”.
Salta à vista que para Ulisses Correia e Silva o desenvolvimento do país conta muito pouco. Bem como a qualidade das estruturas do Estado. Para ele, basta a quantidade. O bem-estar social não tem expressão nas preocupações do primeiro-ministro do nosso país. Qualquer medida que ponha em causa os deputados, o bem-estar do sistema, é tiro no “coração do sistema”.
Estamos a falar de um micro-estado, com pouco mais de 500 mil almas, e apenas 4.033 quilómetros quadrados de superfície terrestre, composto por 10 ilhas, mas apenas nove são habitadas.
Neste momento, o actual sistema político consegue a honrosa proeza de eleger perto de 400 pessoas nas eleições legislativas e autárquicas, sem falar dos membros do Governo e outros altos cargos da administração pública, que também se regem pelo estatuto do cargo político. Somos um Estado cujo orçamento é suportado em mais de metade pela ajuda internacional, seja em forma de apoio orçamental, donativos ou empréstimos.
É num país com estas características e com este número de representantes políticos, é que Ulisses Correia e Silva veio apresentar uma proposta de regionalização com capacidade para fazer eleger mais uma centena de políticos regionais, que vão juntar aos cerca de 400 existentes, para todos juntos se alimentarem das tetas do Estado.
Entendeu agora, caro leitor, porquê que temos entre nós alguém que esteja a brincar de Governo!?...
Como levar a sério um homem, que num momento coloca os partidos no topo da pirâmide dos regimes democráticos, e logo a seguir despreza-os, considerando-os "perniciosos e perigosos", só porque este ou aquele não quer ler pela sua cartilha.
Para Ulisses Correia e Silva, o princípio da eficiência e eficácia na gestão dos recursos públicos, a racionalidade e até mesmo o chavão de menos Estado, que, diga-se em abono da verdade, é palavra de ordem do seu MpD, só são válidos quando o propósito é vender as empresas públicas, é descapitalizar o Estado a favor de privados.
De contrário, todo o pensamento, toda a proposta que visa a protecção da eficiência e eficácia do Estado, é perniciosa e perigosa, para além de ser populista e representar uma afronta para o coração do sistema – entenda-se para o bem-estar dos deputados.
Caro leitor, é evidente que falta aqui seriedade e sentido de Estado ao primeiro-ministro do nosso país.
Vê-se que o MpD nunca esteve interessado na regionalização do país. Aproveitou, isso sim, de tudo isto apenas para ganhar as eleições.
Porque, todo o processo de regionalização, por mais defeituosa que for, requer uma profunda reforma do Estado e dos seus órgãos representativos.
E o nosso primeiro-ministro sabe que nós sabemos que ele sabe disso!
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