Sobre o Ministério Público
Ponto de Vista

Sobre o Ministério Público

Nos termos dos arts. 222º e 224º da Constituição da República de Cabo Verde compete ao Ministério Público exercer a ação penal e defender a legalidade democrática, os direitos dos cidadãos, o interesse público e os demais interesses que a Constituição ou a lei determinarem. Os representantes do Ministério Público atuam com respeito pelos princípios da imparcialidade e da legalidade.

Atuar com respeito pelos princípios da imparcialidade e da legalidade significa que o Ministério Público em toda a sua ação, nomeadamente no exercício da ação penal, em todas as suas fases, não se orienta por outro qualquer interesse que não o da legalidade, o que implica objetividade, ou seja, a lei não pode ser afastada, mesmo em razão da preocupação pessoal de alcançar outros valores socialmente relevantes, nomeadamente uma certa conceção pessoal ou social de justiça. A justiça está na lei.

Serão poucas as leis fundamentais, mesmo nos países com regimes democráticos mais consolidados, que consagram expressamente a imparcialidade dos agentes do Ministério Público, embora esse ideal corresponda as exigências do justo processo.

A imparcialidade é essencialmente de natureza cultural e pode apreciar-se de maneira subjetiva e objetiva. Naquela perspetiva, significa que os agentes do Ministério Público devem atuar com serenidade, sem paixão, prejuízo ou interesse pessoal; nesta, na perspetiva objetiva, que nenhuma suspeita legítima exista no espírito dos magistrados a não ser por razões puramente técnicas, como simples hipótese de trabalho, sempre consciente e revogável.

Mesmo nas fases jurisdicionais em que o Ministério Público assume a posição formal de parte, é uma parte meramente instrumental, para permitir o contraditório sobre a prova, porque o seu partido é a lei e a sua função promover a justa aplicação da lei em ordem à realização da justiça. Por isso também que se a prova produzida não for bastante para afastar a dúvida sobre a culpabilidade (beyond a reasonable doubt, na expressão da common law), que justifica a instauração do processo, o Ministério Público deve promover a absolvição do acusado e não se limitar a pedir justiça, o que pode e é geralmente interpretado como abdicação do exercício da sua função de magistrado.

Presunção de inocência do suspeito/acusado até à condenação transitada, como regra do processo, e imparcialidade dos magistrados, juízes e Ministério Público, são princípios cardinais do processo penal democrático.

Questão é que a prática, sobretudo neste tempo de populismo, não desvirtue o exercício das funções e as degrade com procedimentos musculados próprios de regimes de inspiração totalitária.

* Advogado

Partilhe esta notícia

SOBRE O AUTOR

Redação

    Comentários

    • Este artigo ainda não tem comentário. Seja o primeiro a comentar!

    Comentar

    Caracteres restantes: 500

    O privilégio de realizar comentários neste espaço está limitado a leitores registados e a assinantes do Santiago Magazine.
    Santiago Magazine reserva-se ao direito de apagar os comentários que não cumpram as regras de moderação.