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Moção de Censura. Um apelo ao Parlamento para defender a credibilidade do Estado   
Ponto de Vista

Moção de Censura. Um apelo ao Parlamento para defender a credibilidade do Estado  

A ASSEMBLIA NACIONAL, enquanto centro do sistema político, é chamada a pronunciar sobre a governação do país. É seu dever defender Cabo Verde e os cabo-verdianos. Se a Casa do Povo falhar, é todo o Estado de Direito que falha na sua efetivação e afirmação. Não é admissível satisfazer com mínimos de interesse público ou de transparência quando é possível alcançar mais e melhor, sou seja, o máximo.

O Grupo Parlamentar do PAICV apresentou uma Moção de Censura contra o Governo pela “falta de transparência na gestão dos recursos públicos do país”. É muito preocupante para um país que recentemente celebrou 48 anos de independência e conta já 33 anos de Democracia.

Um dos compromissos mais emblemáticos do atual Governo é o reforço da transparência e o combate à corrupção, tendo adotado o célebre lema: “somos diferentes, fazemos diferente”, o que torna paradoxal este mesmo Governo estar agora a ser acusado da falta de transparência e de prática de corrupção.

Na verdade, a falta de transparência na gestão dos recursos públicos nacionais tem sido um grande entrave ao processo de desenvolvimento deste pequeno país, insular, com uma população estimada de apenas meio milhão de pessoas.

Não é por acaso que a transparência é um imperativo constitucional. É que só uma administração aberta e transparente, que em princípio nada tem a esconder ao cidadão, será capaz de promover a participação da sociedade para constuir o bem-estar social e qualidade de vida das pessoas, enquanto fins últimos da administração pública em regimes ditos democráticos. A transparência é, pois, uma exigência constitucional com enorme potencial de prevenção geral da corrupção (corrupçãozinha dos amiguinhos e dos favorezinhos), artigo 240.º, n.º1, da CRCV.

Das informações tornadas públicas, a Moção de Censura ora apresentada tem como pano de fundo o processo de privatização das empresas do Estado e os relatórios da Inspeção-geral das Finanças sobre os fundos de ambiente e turismo. A mesma fala também de sonegação de informações importantes sobre a governação do país, acusação essa que, sendo verdade, há de ser sempre um escândalo que compromete seriamente o Governo e mostra que algo vai muito mal com o Estado de Direito que a Constituição da República diz que Cabo Verde é.

Na verdade, de nada vale os dicursos do Governo, quando aparece no espaço público a dizer que prima pela transparência, que combate a corrupção. Não! O Governo deve afastar qualquer suspeita de intransparência e corrupção no exercicio das suas funções. Tal como a mulher de César, um Governo tem que ser sério, porque parecer sério não chega.

É preciso agir de forma consequente. A ausência de transparência oculta a atuação administrativa e levanta a suspeita da corrupção, ou seja, se não há transparência não há “aparência de honestidade”, dando lugar a desconfianças e à promoção de percepções e suspeitas de corrupção. A transparência contribui decisivamente para assegurar a boa imagem e o bom nome da Administração Pública, gerando confiança nos cidadãos.

Esta Moção de Censura demostra a extrema importância da transparência no contexto atual da governação do país. Está muito claro no entendimento dos cabo-verdianos, que nos últimos anos as práticas deste Governo não têm priorizado o interesse público, antes dão primazia a  interesses particulares, muitas vezes de ordem pessoal e de grupinhos, deixando um rasto de suspeições e descofianças no seio da sociedade, com impacto negativo no processo de desenvolvimento e na paz e harmonia sociais.

Quando o país sente e até respira a corrupção, embora envolta na fumaça da negação e da poliquice balofa, mesmo em presença de provas, mas sem punição, consequência de uma justiça lenta, deficiente (com as desculpas de sempre de que não há verbas), submissa, em certo sentido cúmplice do Governo, o país caminha a passos largos em direção ao descrédito e ao colapso social e político.

A ASSEMBLIA NACIONAL, enquanto centro do sistema político, é chamada a pronunciar sobre a governação do país. É seu dever defender Cabo Verde e os cabo-verdianos. Se a Casa do Povo falhar, é todo o Estado de Direito que falha na sua efetivação e afirmação. Não é admissível satisfazer com mínimos de interesse público ou de transparência quando é possível alcançar mais e melhor, sou seja, o máximo.

Os cabo-verdianos não devem aceitar os mínimos, quando os máximos podem ser atingidos. Daí o apelo à Assembleia Nacional, no sentido de, nesta oportunidade, corrigir o que vai mal na governação do país, para que a medida sirva como um antídoto para essa doença que tem assolado o país nos últimos anos, antes que a enfermidade da corrupção, do compadrio, do laxismo e da intransparência se entranhe nas instituições públicas, fazendo sucumbir o Estado de Direito Democrático.

Por último quero deixar uma frase de famoso Maquiavel: “Um povo que aceita passivamente a corrupção e os corruptos não merece a liberdade. Merece a escravidão. Um país cujas leis são lenientes e beneficiam bandidos não tem vocação para a liberdade. Seu povo é escravo por natureza. Um povo cujas instituições públicas e privadas estão, em boa parte, corrompidas, não tem futuro. Só passado.

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