As eleições internas são uma ferramenta crucial para modernizar os partidos políticos, aproximando-os da sociedade e aumentar as suas responsabilidades. Apesar dos desafios, sua vantagem central reside na capacidade de gerar lideranças legitimadas pela base, programas mais pluralistas e uma imagem de renovação — fatores essenciais para recuperar a confiança em instituições políticas, hoje em crise em muitas democracias. Para maximizar seus benefícios, porém, é essencial mudar esses processos com mecanismos de transparência, educação política e inclusão de grupos com pouca representatividade no seio dos partidos.
As eleições internas nos partidos políticos são processos pelos quais os membros / militantes de um partido político (associação política) escolhem seus líderes, candidatos a cargos públicos / políticos e definem diretrizes em termos de programa de governação do partido e do país. Esses mecanismos de democracia intrapartidária têm assumido relevância no cenário político contemporâneo, especialmente em contextos onde há pressão por transparência e participação, onde todos querem estar nos órgãos de decisão, onde o que conta e interessa não é ter qualidade enquanto político e profissional, mas sim pertencer ou estar em lugares onde se tomam as decisões. Abaixo, destaco as principais vantagens e desafios associados às eleições internas, partindo do princípio que o PAICV, hoje mais do que nunca deve, enquanto esquerda moderna e progressista, se quiser ser alternativa à governação do país em 2026, encarar as eleições internas como momento de fortalecimento das bases, de reforço da democracia interna e de afirmação da cultura de disputa como sal da democracia. Senão vejamos:
Vantagens das Eleições Internas nos Partidos Políticos:
1. Fortalecimento da Democracia Interna- As eleições internas devem ser momentos de revitalização do partido e de mobilização das suas bases com o intuito de proporcionar à todos as ferramentas necessárias e os elementos de fortalecimento nas discussões sobre as mais diversas questões da vida política nacional, regional e internacional. As eleições internas num partido como o PAICV, deve permitir que a base do partido participa ativamente nas / das decisões, reduzindo o ‘centralismo’ nas mãos de ‘cúpulas’ ou lideranças oligárquicas. As eleições internas no PAICV devem ser encaradas como o momento de proporcionar o aumento da democracia interna e o garante da legitimidade das decisões, já que líderes e candidatos são escolhidos por voto, não por indicação ou hereditariedade. Além disso, as eleições internas em todos os partidos políticos, e o PAICV não foge a regra, deve ser momento de Engajamento e mobilização da Base - Membros do partido se sentem mais valorizados e conectados ao partido quando têm voz ativa, o que fortalece a militância e a mobilização durante campanhas eleitorais.
2. Legitimidade Externa- Está provada que os partidos que adotam processos democráticos internos tendem a ser vistos como mais credíveis pelo eleitorado, especialmente em sociedades que valorizam a transparência, a meritocracia e a cultura de competitividade. Em Cabo Verde, temos tido a cultura de ver os candidatos à liderança a serem escolhidos por meio de eleições internas, dando assim maior respaldo popular, pois refletem preferências dos militantes. Estamos a falar das eleições para o presidente dos partidos políticos do arco do poder.
3. Renovação e Diversidade- As eleições internas em muitas paragens proporcionam e facilitam a ascensão de novas lideranças, incluindo jovens, mulheres e militantes que chegam a liderança sem o apoio da máquina do partido, que muitas vezes são marginalizadas em processos fechados. O importante é que a nova geração do e no PAICV mude radicalmente o modus operandis, alicerçando as suas candidaturas ou as disputas internas em competição de ideias, evitando a estagnação dos programas dos partidos, a fulanização, a discussão de pessoas, o grito de surdos pelo candidato mais bonito, mais sexy, mais amigo de....apadrinhado por...entre outros aspetos que não abona a nossa democracia e muito menos a geração do séc. XXI, que necessariamente está ‘condenado’ a competir com base em ideias, propostas alternativas, visão de futuro, humildade, zelo, companheirismo, respeito pelo outro, nada de petulância e muito menos a perspetiva de acharmos que somos os únicos capazes. O outro nas disputas internas deve ser encarado como sendo tão capaz quanto eu. Podemos não concordar com as opiniões e as posições do nosso colega do partido, mas não temos o direito e muito menos o dever ético-moral de não as respeitar.
4. Redução de Conflitos Internos- Um partido de esquerda moderna não deve ter medo de eleições internas e muito menos de disputas. Os processos eleitorais claros, transparentes, democráticos e equitativos, realizados debaixo de normas ou regras claras e transparentes, afastam toda e qualquer tentação de indicações, reduzindo riscos de conflitos ou dissidências. Hoje, sabe-se que quando as decisões são coletivas tendem a ser mais aceites do que imposições de dirigentes ou de centralismos exacerbados. O PAICV deve naturalizar as eleições internas e transformá-las em momento de encontro e festa com os militantes lá onde eles estiverem.
5. Adaptação às exigências Sociais - Em um contexto de crescente desconfiança em relação à política tradicional e aos políticos tradicionais ou de carreira, partidos com eleições e disputas internas demonstram sintonia com as demandas sociais, a ligação com às exigências da população, o estreito acompanhamento das mudanças e transformações que ocorrem no mundo e a uma maior exigência pela cidadania eleitoral e a prestação de contas. O PAICV como um partido de esquerda moderna e progressista, que deve realizar o seu múnus na interação social, ou seja, sabe-se que o PAICV teve desde as suas origens como preocupação central dar vazão às necessidades e preocupações da sociedade, ela nunca deve posicionar-se contra ou dessintonizado com as reais ambições do povo das ilhas. E, o povo das ilhas decidiu viver em democracia, pelo que as eleições internas é também momento de sintonizar com um programa de esquerda para governar o país em todas as suas dimensões: económica, social, cultural, política e administrativa. O PAICV é um partido societário, que se define e realiza em termos programáticos na interação entre a sociedade, as dinâmicas sociais e as mudanças e transformações que ocorrem no mundo.
6. Preparação para Eleições Gerais - Candidatos que passam pelo crivo das disputas internas desenvolvem habilidades de campanha, construção de redes de apoio e comunicação, tornando-os mais preparados para as eleições nacionais, uma vez que as eleições internas devem ser momentos de aprimorar a democracia, a participação cívica, o gosto pelo debate de opiniões e de propostas alternativas, o saber lidar com as opiniões contrárias, o respeitar a posição dos outros e dos adversários na política, enfim, eleições internas devem servir para apresentação de projetos exequíveis para o partido e para o país. No PAICV, nenhum candidato à liderança deve almejar chegar a Presidente deste partido histórico com uma ‘mão cheia de nada outra de coisa nenhuma’. Ninguém pode almejar ser presidente sem mostrar o portfólio.
7. Contexto Atual e Relevância - Combate ao Populismo e Personalismo/culto de personalidade: Em meio à ascensão de lideranças autoritárias e personalistas, com a crescente eleiçoes de líderes populistas na Europa e nas Américas, as eleições internas devem reforçar a institucionalização da democracia com base nos partidos políticos, ou seja, dá força ao partido e as suas ideologias, acabando por tirar da arena política, aquilo que na filosofia chamamos o combate sereno ao culto de personalidade, ou quiçá eliminarmos de vez o culto à personalidade, que no fundo é uma cultura colonial e que hoje roça a pobreza ou a miséria intelectual.
Desafios e Críticas: Na modernidade, época das luzes, de globalização e do império das navas TIC’s (tecnologias de informação e comunicação), as eleições quer gerais, regionais ou locais acarretam riscos de Fraude e Manipulação, pelo que as eleições internas num partido político, também está envolto nestes riscos. Mesmo em eleições internas, há casos de compra de votos, favorecimento de grupos dominantes ou uso de máquina partidária para influenciar resultados. As eleições internas no PAICV, cujo intuito é preparar-se para ser alternativa à governação do país, devemos fugir a sete léguas qualquer tentação deste género.
Constata-se também, em muitos casos o risco de Fragmentação/Divisão: Disputas internas feitas à margem do cumprimento de normas ético-legais podem dividir o partido e enfraquecê-lo publicamente. Hoje, com o império das redes sociais, como dizia Umberto Eco, o risco de tornar algumas opiniões em verdade absoluta é enorme e acarreta custos elevados para a democracia interna e para a vitalidade dos partidos após disputas internas.
Conclusão - As eleições internas são uma ferramenta crucial para modernizar os partidos políticos, aproximando-os da sociedade e aumentar as suas responsabilidades. Apesar dos desafios, sua vantagem central reside na capacidade de gerar lideranças legitimadas pela base, programas mais pluralistas e uma imagem de renovação — fatores essenciais para recuperar a confiança em instituições políticas, hoje em crise em muitas democracias. Para maximizar seus benefícios, porém, é essencial mudar esses processos com mecanismos de transparência, educação política e inclusão de grupos com pouca representatividade no seio dos partidos.
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