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Orlando Dias. “Tenho percurso para liderar a Comissão da CEDEAO”
Política

Orlando Dias. “Tenho percurso para liderar a Comissão da CEDEAO”

Entrevista com o deputado nacional e vice-presidente do Parlamento da CEDEAO sobre a sua disponibilidade para presidir a Comissão da CEDEAO. "Estou trabalhando nisso há mais de um ano", afirma.

 

Santiago Magazine – Por que se disponibiliza para presidir a Comissão da CEDEAO?

Orlando Dias - O processo do exercício das funções da presidência da Comissão da CEDEAO não é candidatura, não é um cargo electivo, mas sim, disponibilidade. Alguma imprensa tem estado a falar de candidatura, mas é um conceito errado. Quero que isso fique claro, ou seja, que é disponibilidade.

Há mais de um ano que nós temos estado a trabalhar nisso a nível do Parlamento da CEDEAO – e também a nível de outras instituições da CEDEAO – no sentido e Cabo Verde assumir a presidência da Comissão. E também temos estado a articular durante este tempo com as autoridades cabo-verdianas. É evidente que fizemos um trabalho interno. Primeiro, nos contactos: articulamos, de certa forma influenciamos para que Cabo Verde começasse a regularizar os seus compromissos com a CEDEAO, em termos financeiros, para que de facto (como é a vez de Cabo Verde, em termos de ordem alfabética já esteve Benim e Burkina Faso), Cabo Verde esteja em condições de assumir a presidência da Comissão.

E na sequência da manifestação do Comissário Isaías Barreto Rosa, através da comunicação social, tive também que manifestar minha disponibilidade.

Portanto, foi nessa sequência que me disponibilizei, mas é um cargo que depende do Estado de Cabo Verde, ou seja, a pessoa que irá desempenhar esta função será designada pelo Estado, mas não será, seguramente, a aprovação da Cimeira dos Chefes dos Estados e dos Governos.

SM - O facto de ocupar o cargo que ocupa e já ocupou, e a sua experiência, dá-lhe vantagem para vir a ser escolhido?

- Disponibilizei-me porque conheço a CEDEAO que estou a lidar desde 2001. Estou no Parlamento da CEDEAO há muitos anos, tenho excelentes relações interpessoais com as entidades da região, e isto conta muito. O Parlamento da CEDEAO é um Parlamento comunitário por onde passa ex-ministros, ex-primeiro-ministros, pessoas que já foram deputados do Parlamento e agora estão no Governo, portanto é uma relação criada com dirigentes dos países da CEDEAO que poderá ajudar no exercício do cargo.

Quero dizer que conheço bem a CEDEAO e considero que tenho percurso para isso. Já estou nas andanças da política há muitos anos, e também tenho responsabilidades em Cabo Verde. Além de dizer que, neste momento, sou vice-presidente do Parlamento da CEDEAO, sou deputado eleito pelo círculo da África na Assembleia Nacional de Cabo Verde, médico de profissão, tenho mestrado em saúde pública, fui membro do Governo, ou seja, as condições estão reunidas para isso.

A mais-valia é o reforço da integração económico, política e social de Cabo Verde na CEDEAO, mas também a nível da CEDEAO, implementação de programas importantes de desenvolvimento, reforço da cooperação entre a CEDEAO, União Europeia, Estados Unidos, China e Rússia, defender as especificidades de Cabo Verde para ver como se pode compensar Cabo Verde, tendo em conta as nossas especificidades, melhorar as relações bilaterais entre os países que fazem parte da CEDEAO, ter mais investimentos privados, ou seja, impulsionar o investimento privado a nível da Comunidade, trabalhar no sentido de incrementar a industrialização dos países dos países da nossa Comunidade.

Portanto, reforçar a credibilidade das instituições comunitárias, consolidar a democracia, a boa governação e a gestão transparente dos bens públicos, para além de garantir a paz, a segurança e a defesa dos direitos humanos a nível da nossa sub-região.

Basicamente, são essas as linhas gerais. É evidente que todo o trabalho será feito depois da designação e tem que haver articulação entre a Comissão e outras instituições da CEDEAO e, sempre em articulação com os diferentes Estados que fazem parte da Comunidade, visto que cada um tem o seu interesse que deve ser levado em conta.

O presidente da Comissão vai-se ocupar da Comunidades. É evidente que como cabo-verdianos, os interesses de Cabo Verde serão levados em boa conta, mas sem esquecer que toda a comunidade deverá tido em conta e sempre em articulação com as diferentes instituições da CEDEAO, para que qualquer investimento seja feito a base de consenso.

«Sou vice-presidente do Parlamento da CEDEAO, sou deputado eleito pelo círculo da África, médico de profissão, tenho mestrado em Saúde Pública, fui membro do Governo... ou seja, as condições estão reunidas para isso.»

SM - Conta com o apoio de quem? Já tem suporte do Governo de Cabo Verde?

Neste momento estou disponível como os outros. Caberá ao Governo e ao Presidente da República, o Estado, na altura devida dizer quem será o designado de Cabo Verde. Eu não posso agora entrar nesses pormenores. Sei que venho trabalhando nisso há mais de um ano. Neste momento é prioritário que seja Cabo Verde a assumir a presidência, a questão de nome de quem é que vai desempenhar vem numa segunda fase.

O mais importante é fazermos um trabalho diplomático sério, com todos os países da CEDEAO, sobretudo os grandes países, nomeadamente Gana, Nigéria, Senegal e outros países da sub-região, para que haja um consenso a volta de Cabo Verde, porque as decisões a volta da Cimeira dos Chefes de Estado e dos Governos, para terem efeito, elas devem ser consensuais.

Então é preciso que haja um consenso a nível da Comunidade, a nível de todos os Estados para que seja Cabo Verde a assumir. A partir do momento que é decidido que é Cabo Verde a assumir a presidência da Comissão, aí o Estado de Cabo Verde tem todas as condições de escolher a melhor pessoa que considerar para desempenhar essas funções a nível da nossa comunidade.

SM – O que é que pode trazer de diferente à Comisso da CEDEAO? Isto é, o que podemos esperar da sua liderança caso vencer esta disputa?

O mais importante não é quem vai exercer essas funções. O mais importante é que essas funções sejam exercidas, trazendo ganhos para a CEDEAO e para Cabo Verde, ou seja, é preciso que haja reforço da integração económica, política e social, que se dê atenção prioritária à garantia da paz, segurança e da defesa dos Direitos Humanos a nível da comunidade.

Também é preciso que se reforce a consolidação da democracia, a boa governação, e também que se dê atenção à gestão transparente dos meios disponibilizados para o funcionamento e reforço da credibilidade das instituições comunitárias, designadamente a própria Comissão, o Parlamento da CEDEAO, o Conselho de Ministros da CEDEAO, a Cimeira dos Chefes dos Estados e dos Governos, o Tribunal de Justiça da CEDEAO, GIABA, Organização Oeste Africana da Saúde.

Em relação à cooperação internacional, é preciso também que se reforce a relação de cooperação entre a CEDEAO, a União Europeia, os Estados Unidos a América, a China e a Rússia, que são parceiros privilegiados e desenvolvidos que pode ter um papel importante no processo do desenvolvimento económico, social e político da nossa sub-região para podermos garantir a felicidade das populações que é o objectivo máximo.

Para além dessas ideias, queremos defender as especificidades de Cabo Verde. Como sabe, Cabo Verde é um país insular, somos ilhas e penso que deverá haver alguma compensação. Por exemplo, se há um programa de desenvolvimento ligado a autoestradas, Cabo Verde não será beneficiado e, por isso, deverá ser beneficiado por outra via, designadamente os transportes marítimos e aéreos, turismo, sabendo que Cabo Verde pode ser transformado, num futuro próximo, como principal destino turístico na nossa sub-região e a CEDEAO poderá ter um papel importante nesse aspecto.

Também é preciso que se melhore cada vez mais as relações bilaterais entre Cabo Verde e os outros países que fazem parte da Comunidade. Também, penso que uma atenção especial e prioritária, deverá ir para a implementação dos programas de desenvolvimento dos mais diferentes sectores, designadamente nas áreas das infra-estruturas, da educação, da saúde, da luta contra a pobreza, de criação de empregos para os jovens, assim como uma atenção especial ao sector privado e a atração de investimentos externos. Até aqui tem-se apostado muito no funcionamento das instituições em detrimento de implementação de programas de desenvolvimento.

Ou seja, é preciso que aos poucos os recursos da Comunidade, em mais de 60%, sejam aplicados na implementação dos programas de desenvolvimento e só 40% no funcionamento as instituições. Essa também é uma reforma que deve ser implementada a nível da Comunidade.

SM – A influência politica pode ser determinante na região?

Posso garantir-lhe que se para ocupar esse cargo fosse através de eleições, eu já estaria eleito. Considero que tenho apoio de quase todos os Estados da sub-região. Aliás, quem me deu a ideia para me disponibilizar foram alguns dirigentes do Gana, da Nigéria, da Guiné Bissau, do Senegal e de outros países.

Se fosse pela via de eleição eu tenho certeza quase que absoluta que seria eleito depois da Cimeira dos Chefes do Estado, mas cabe ao Estado de Cabo Verde tomar essa decisão.

SM - Como vê a integração económica na região? Como pretende transformar essa unidade efectiva?

É preciso que seja reforçada a integração económica, dando mais atenção ao sector privado a industrialização da região, mas a CEDEAO vem crescendo durante muitos anos uma média de 6,5%, é possível que se aumente esse crescimento económico, que se impulsione mais. A nível dos transportes, Cabo Verde tem que ter ligação com os países da CEDEAO a nível marítimo e aéreo para que possa ter ganhos económicos.

«O reforço da integração de Cabo Verde na CEDEAO irá também promover o reforço de Cabo Verde com a União Europeia, Estados Unidos e os outros países desenvolvidos.»

SM - Cabo Verde, de certa forma, tem desaproveitado esse imenso mercado da CEDEAO, com poucas trocas comerciais e investimentos praticamente nulos, apesar dos incentivos com a Taxa Económica Comum. O que estará na base disso e como reverter esse quadro?

Penso que Cabo Verde está aquém daquilo que é desejável, mas nos últimos dois anos já se conhece melhor a CEDEAO em Cabo Verde. Foram realizadas mais reuniões, e creio que hoje os cabo-verdianos já têm consciência do que é a CEDEAO, ao contrário de há dois ou três anos.

O Governo actual tem como uma das prioridades no seu programa, a integração na CEDEAO, por isso, penso que é preciso reforçar essa integração pela via de melhoramento das relações que existem, da participação de Cabo Verde nos eventos da CEDEAO, como reuniões em que se tomam decisões, é preciso também que Cabo Verde assuma plenamente os seus compromissos para com a Comunidade, com o pagamento das taxas comunitárias, quotas, etc.

Mas é preciso também que se aposte na ligação entre Cabo Verde e os outros países da Comunidade pela via da melhoria dos transportes aéreos e marítimos, reforçar a diplomacia económica. O Governo já anunciou que brevemente vai nomear o embaixador de Cabo Verde junto da Nigéria e da CEDEAO, que era uma insuficiência.

Penso que com essa nomeação de um embaixador em Abuja para relacionar com a Nigéria e com a CEDEAO, irá reforçar as relações de Cabo Verde com os países da CEDEAO, com a própria CEDEAO, enquanto membro de pleno direito e isso irá dar um novo impulso em termos económicas e outros ganhos para Cabo Verde, ou seja, passará a ganhar mais em termos de implementação de programas comunitárias em diferentes áreas, como educação e saúde, mas sobretudo na área do turismo.

Cabo Verde tem grandes potencialidades turísticas. No meu ponto de vista é o país que pode ser um centro de turismo na nossa sub-região e o principal destino e com o reforço da nossa integração, poderemos aproveitar melhor o mercado que é grande de cerca de 350 milhões de habitantes e Cabo Verde é um mercado pequeno, portanto, quanto mais integrado estiver, melhor. O reforço da integração de Cabo Verde na CEDEAO irá também promover o reforço de Cabo Verde com a União Europeia, Estados Unidos e os outros países desenvolvidos.

SM - A criação da moeda única da CEDEAO é uma questão delicada para Cabo Verde, cuja moeda está indexada ao Euro por via do Acordo Cambial com Portugal. O que vai mudar e quais os argumentos para convencer Cabo Verde a aderir a esta nova moeda na região?

Esse é um problema complexo que vai levar muito tempo, porque é preciso harmonizarmos os aspectos. É uma questão mais crítica, é um processo que leva o seu tempo, não é uma questão fácil penso que vai levar um bom tempo para chegar lá, mas o mais importante é reforçar a integração económica e depois, conforme os países e a CEDEAO vai se desenvolvendo, vai se ver como é que se pode impulsionar isso.

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Redação