• Praia
  • 29℃ Praia, Cabo Verde
A desvalorização da ciência acarreta um custo elevado
Ponto de Vista

A desvalorização da ciência acarreta um custo elevado

A revolução científica é sem dúvida um marco na história da humanidade, ela teve o seu apogeu no século XVII, a onde ganhou a sua configuração sólida principalmente com o Galileu Galileia, Newton, Kepler, etc. e se prolonga até a atualidade, inovando e revolucionando. Após vários séculos desde que ocorreu a revolução científica, hoje encontramos numa era digital, todavia há nações que desvalorizam o conhecimento científico. Está desvalorização atinge vários patamares, desde o desconhecimento que se traduz numa falta de cultura geral, até a falta de investimentos, tanto nos recursos humanos como na tecnologia, inovação, artigos científicos, etc. É visível que em várias nações não se faz o uso adequado, nem o aproveitamento necessário de todos os recursos disponíveis, estudos e evoluções a níveis científicos, recursos estes que muitas vezes estão disponíveis a custo zero.

É preciso cultivar uma mentalidade política científica, não baseada na ignorância, de forma a evitar acontecimentos indesejáveis, como investimentos inapropriados ou fracassados, que pode se traduzir em desperdiçar economias que podiam ser aproveitadas de forma inteligente e suprir as necessidades populacionais. É preciso realçar que não existe desenvolvimento sem ciência e investir nela é investir numa área com retorno certo, a curto, médio ou longo prazo.

A ciência é sem dúvida o motor de arranque para o desenvolvimento, sem ela qualquer progresso fica comprometido. Não existe estados desenvolvidos que chegaram ao patamar atual, sem grandes investimentos nestas áreas. Rejeitar as recomendações científicas são atos de profunda ignorância, que pode ter como consequência o desperdício de quantidades imensuráveis de fundos que podiam ser aplicados em outras áreas. Acreditar que todo o mundo possui conhecimentos técnicos especializados é pôr a nossa segurança e a do nosso povo em risco.

Ignorar as recomendações científicas muitas vezes são vistas pelos investidores como atos de “espertezas”, eu vejo como um ato de tapar o sol com uma peneira, no qual tentasse solucionar problemas com medidas temporárias e ineficientes, com um único objetivo de adiar a responsabilidade de resolver de uma vez por toda, no presente o que terá de resolver no futuro, desta forma acredita-se que “sobra mais dinheiro”. Acredito que nenhuma nação queira soluções temporárias, isto demonstra uma irresponsabilidade e falta de compromisso, sem dizer que os problemas vão se acumulando e aumentando de escala no futuro.

Quando ignoramos as normas científicas nos tornamos primatas, seres que andam ainda a tentar perceber para quê que serve o fogo. Mas mesmo os primatas acabaram por investir na ciência, proporcionando a eles uma revolução, por conseguinte, uma evolução até a nossa geração. Sendo o maior objetivo o bem-estar maior para o presente e para as gerações futuras. Talvez precisamos entender o que é a ciência e porque ela é tão importante, não somente para comunidade científica, mas para toda a comunidade, para um desenvolvimento económico, a um nível sustentável e para perspetivar o futuro.

Vivemos no mesmo planeta Terra, por instantes na mesma era, mas estamos em tempos diferentes, uns estão mais avançados, explorando e projetando o futuro em outros planetas, outros ainda estão a viver na “idade da pedra”. Como é possível partilharmos o mesmo planeta e estarmos tão distantes uns dos outros? Talvez por detrás esteja uma mentalidade de desvalorização daquilo que realmente acrescenta valor.

Em ciências da terra, como a geofísica (meteorologia e oceanografia) muitas vezes tem um carácter de prevenção, todo o conhecimento e investigação são utilizadas de forma a antecipar acontecimentos que podem pôr em perigo a vida humana, ou que pode causar a desestabilização. Conhecendo o futuro consegue-se adaptar o presente de forma a prevenir danos indesejáveis. Talvez questionem, mas como conhecer o futuro se não somos Deus? Mas a verdade é que isto acontece todos os dias, em várias partes do mundo, através do uso da ciência. A prevenção está presente quando se usam as modelações numéricas para efetuar as previsões meteorológicas (com uma antecedência de 15 dias), quando se usa a inversão geofísica para descobrir possíveis epicentros sísmicos, quando somos avisados sobre uma possível erupção vulcânica, desabamento de terra, ciclones, secas prolongadas, entre as mais variadas formas de manifestações e atuações da ciência.

Graças a ciências, hoje existem satélites que estão a diferentes orbitas a volta do planeta terra, com sensores que nos permite estudar e avaliar o stresse hídrico, a vegetação, a temperatura do solo, incêndios florestais, precipitação, que regista as mudanças e analisa os comportamentos que não são possíveis identificar a olho nu. Sem falar no contributo que tem dado para o desenvolvimento de tecnologias e indústrias que revolucionaram as nossas formas de viver.

Uma casa que esteja localizada à beira de uma praia pode beneficiar de uma paisagem extraordinária, no entanto, de acordo com as previsões científicas também poderá ser prejudicada pelo aumento do nível médio do mar, por tempestades que acontecem todos os dias nos oceanos, entre outras. Ignorar estes factos podem levar não somente a destruição de bens matérias, como a própria vida. Outro exemplo é, num país que chove torrencialmente ou que neva, não pôr telhados nas casas de forma a “poupar dinheiro”, faz com que durante as épocas de precipitação as pessoas andem com as canecas a tirar água de dentro das casas.

A exploração de alguns recursos naturais de forma intensiva e inconscientes, sem quaisquer estudos podem levar a vários desastres naturais e desequilíbrio do ecossistema. Um exemplo prático em Cabo Verde, é a intrusão salina nos solos, nos poços de água subterrânea, a erosão costeira provocada pela exploração de areia, o avanço da linha de costa, a desertificação de várias zonas, etc. Assuntos estes que terei todo gosto de abordar nos próximos artigos.

Creio que os únicos momentos que valorizamos a ciência é quando adoecemos, durante as pandemias, ou em momentos de desastres a onde o mal já está feito. No entanto, todos os dias consumimos ciências, mas continuamos a desvalorizar e a não produzir, nem contribuir para o seu desenvolvimento.

Dos países que mais investem e que valorizam a ciência, destacam-se as maiores potências mundiais, os EUA, China, Alemanha, UK, Japão, Suíça, Singapura a onde investem até 5% do PIB em ciência. A Correia do Sul tornou-se um exemplo, pela rapidez com que eles eliminaram a pobreza, investindo fortemente na ciência. De uma forma geral, é notável a rapidez com que se deu o desenvolvimento de vários países da Ásia, e hoje eles dominam os Rankings mundiais de inovações, de investimentos, de tecnologias e indústrias, que estão diretamente associados a valorização científica.

*Mestre em Ciências Geofísica

Partilhe esta notícia

SOBRE O AUTOR

Redação