Hospital Regional Santa Rita Vieira debaixo de fogo cruzado
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Hospital Regional Santa Rita Vieira debaixo de fogo cruzado

As queixas, reclamações e denúncias chegam de todos os lados – trabalhadores, utentes, até pessoal com cargos de responsabilidade. Dizem que o clima interno é de ameaça e medo. Falta diálogo e partilha de informações e quem tem arcado com as faturas, psicológicas, espirituais e financeiras são os utentes, com perdas de vidas humanas e tudo. Só fim de semana último dois falecimentos são debitados pelos familiares ao descaso e negligência desse hospital regional – Mariana Lopes Brito, 94 anos, de Ribeirão Manuel, falecida no sábado, 19, e Afonso, 57 anos, de Nhagar, Assomada, falecido no domingo, 20, no Hospital Agostinho Neto.

Os familiares estão revoltados. Francisco Pereira Gonçalves, filho da Mariana, disse ao Santiago Magazine que após a “esteira” da mãe ele irá saber junto das autoridades porque razão a sua progenitora foi tão maltratada quando foi levada para os serviços de urgência do Hospital Santa Rita Vieira a pedido do próprio diretor da região sanitária, também este médico.

Este homem, que vive na Suíça, diz que ainda está a aguardar os resultados do teste que foi feito à sua mãe. Entretanto, estranha que o hospital tivesse ordenado o enterro do corpo da sua progenitora sem a presença dos familiares, sem as exéquias fúnebres, apenas porque suspeitavam que ela estivesse infetada com coronavírus.

Agostado com o tratamento dado à sua mãe pela médica Cremilda Sanches, coadjuvada pelos enfermeiros Antónia Alves e Valódia Andrade, este emigrante diz que vai buscar a justiça pelo tratamento dispensado à sua mãe, por aqueles que são pagos para tratar da saúde e da vida das pessoas.

Quanto ao Afonso, que era condutor profissional, a esposa confidenciou ao Santiago Magazine que até este momento ainda aguarda a resposta das autoridades sanitárias, concretamente o ministro da Saúde, o diretor Nacional da Saúde, em relação à sua carta de 15 de setembro, onde expunha o tratamento dado ao seu esposo no Hospital Regional Santa Rita Vieira, solicitando tomada de medidas.

Com efeito, 5 dias após ter enviado a carta com as denúncias o seu marido faleceu. Neste momento de nojo, Carmelita Teixeira diz estranhar que tenham afirmado perante a comunicação social que o marido morreu vitima de Covid-19, quando no boletim de óbito consta pneumonia.

Ato criminoso

Na sua carta, Carmelita Teixeira acusava de “pura incompetência e negligência por parte dos médicos” que atendeu o marido no Hospital Santa Rita Vieira, a quem atribui toda a responsabilidade pelo estado de saúde do marido e eventualmente pela sua morte.

Em desespero, Carmelita Teixeira pedia “a quem de direito que tome as medidas severas que se impuserem, pois as incompetências e negligências verificadas, num caso deste, redundam-se num ato criminoso”.

E explica a sua indignação, sempre questionando, com as seguintes informações: “Do dia 26 de agosto, quando fomos ao hospital pela primeira vez, para o dia 11 de setembro, dia em que passaram a suspeitar do covid, são 15 dias. Durante esses 15 dias, o meu marido esteve em casa com a família e no hospital, como qualquer outro doente normal, sendo 05 dias em casa (de 26 a 02) e 9 dias no hospital (de 02 a 11). Quantas pessoas lidaram e aproximaram-se dele, incluindo os próprios médicos, enfermeiros e auxiliares? Durante os 09 dias em que esteve internado em Assomada, ele esteve num quarto com mais cinco doentes e depois foi mudado para um outro quarto com mais cinco doentes internados. Que riscos foram submetidos esses doentes, pela INCOMPETÊNCIA E NEGLIGÊNCIA DOS MÉDICOS? No dia 04 de agosto, ele foi mandado fazer TAC na Praia, apenas como um doente de AVC, num Hiace normal do hospital, acompanhado por alguns amigos, familiares e uma enfermeira. Na clinica do TAC foi tratado como um doente normal. Que riscos aqueles que ali o atendeu correram? Durante os dias em que esteve internado, ele recebeu visitas todos os dias de muitos amigos e familiares. Que riscos foram submetidas essas pessoas todas? Durante o seu internamento em Assomada, eu, como esposa, o acompanhei todos os dias e noites, e um dia um amigo dele passou a noite com ele. Que riscos fomos submetidos? No tempo em que estamos, porquê que desde a primeira hora, ou seja, no dia 26, quando o meu marido chegou ali com fortes dores de cabeça, o pessoal médico do Hospital Regional Santa Rita Vieira não teve o cuidado e a precaução de o submeter a teste? Porquê que quando pedimos no dia 29, para lhe submeter a teste não tiveram o cuidado de nos ouvir? Porque?”

Perguntas cujas respostas dos respectivos destinatários, ainda aguarda, 10 dias após ter enviado a carta e 5 dias após ter sepultado o marido.

Palavra dos trabalhadores

Mas as críticas em relação essa unidade de saúde, que responde pela vida de cerca de 121 mil almas, não ficam por aqui. Muitos profissionais concordam com as queixas dos utentes, reafirmando que o hospital funciona muito mal, debaixo de ditadura, do medo e das ameaças.

Sempre sob anonimato, informaram ao Santiago Magazine que o hospital não tem um aparelho de Raio X há já algum tempo. Os técnicos já nem sequer aparecem no trabalho, recebem o seu vencimento em casa. Falta um ortopedista há mais de um ano. Não há ambulância. Os doentes são transportados em viatura Hiaces para o hospital central da Praia, sem qualquer conforto.

O hospital não tem um serviço de neonatologia. Neste particular, informam que gestantes têm dado entrada no hospital com semana incompleta de gravidez, por exemplo, 32, 33, 34 semanas, que deveriam ser evacuadas para Praia, todavia, permanecem na região e as crianças nascem prematuras para depois serem enviadas à Praia. Nesta aventura, tem acontecido a morte de recém-nascidos, por causa da demora nas transferências e falta de ambulâncias para socorrer as parturientes em tempo.

Assim, ainda as mesmas fontes, entre 1 e 8 de setembro morreram 2 prematuros nessas condições.

No hospital, acrescentam, o descontentamento é generalizado, mas reina um silêncio absoluto, por medo de represálias, com punições arbitrárias e outros tipos de ameaças e bullying laboral.

No dia 22 de setembro este diário digital enviou um email ao diretor do Hospital Regional Santa Rita Vieira, Imadoeno Cabral (foto) dando-lhe conta que o jornal pretende avançar com uma peça sobre diversas denuncias relacionadas com o funcionamento da estrutura de saúde que ele dirige, entretanto, passados 3 dias ele não reagiu.

O jornal espera, todavia, contar com a sua contribuição posterior para o esclarecimento dessas e outras situações que poderão estar a criar problemas no funcionamento de uma estrutura de saúde que cobre uma região com cerca de 121 mil pessoas.

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