In memoriam de Francisco Correia Varela,
chamado Chico Xan, relembrando os acontecimentos
da noite de 19 de Maio de 1974, na cidade da Praia
Vozes
e vozes
ressoando
no âmago
da Voz nossa
monumental e telúrica
Vozes
e vozes
percutindo
na pele húmida
da miséria
pelejando
sob o espectro
dos arcabuzados
do Monte-Agarro
arquejando
sob o perfil dos íntimos
das pedras frias do Tarrafal
Vozes
e vozes
jorrando
múltiplas
sobre o corpo
da terra lavrada
lavrando-se
Vozes
e vozes
metamorfoseando-se
subterrâneas
esquivando-se
suburbanas
ao decrépito ventre
da cidade sitiada
Vozes
e vozes
crepitando
céleres
defronte
das fardas de combate
das metralhadoras
dos homens-máquina
cuspindo a morte
sobre a secular idade
de Maio ainda
incerto e clandestino
Vozes
e vozes
velejando
na ondulação
da rua
serpenteando
em doirada sinestesia
de luto e de dança
Vozes
e vozes
irrompendo
do dorso sangrento
dos meses
ajoelhados ínclitos
ante Maio 19
e sua pose guerreira
defronte dos muros
da cidade acossada
e dos seus lusos ocupantes
Vozes
e vozes
velozes
atrozes
suspensas
no matraquear do ódio
crepitando
faúlha
a faúlha
de desassossego
jorrando
gota
a gota
de sangue
estalindo
chama
a chama
de resiliência
estralejando
estóicas
e heróicas
por entre a bruma
da revolta
Vozes
e vozes
límpidas
lapidarmente Vozes…
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