Meditação Sobre o País do Basalto
Cultura

Meditação Sobre o País do Basalto

 O meu país é o que o mar não quer

Ruy Belo

 

 É por certo a dor de cada dia

que faz o peso do homem sobre a terra

fá-lo irmão do fogo e das moventes nuvens

sem a apreensão

que os maus fados preconizam

oh quem pudesse de olhar posto

sobre o passado e o futuro dizer

tenho o tamanho do que vivi

para continuar bastam-me

estas mãos estes pés e estes olhos

para a gente que se espraia

sobre o chão da vida

eu tenho apenas estas pobres palavras

é pouco muito pouco

mas é nelas que enredado vivo

com seus ferros e seus gumes

e se não erro certos perfumes

que deixa a gente viva do meu país

caminhando pela vida acima

naturalmente

como quem dá os bons dias

ou ao fim da rua

sobre o basalto escuro

faz um pobre desenho a giz

não me perguntem não sei o que diz

mas com altiva doçura

transponho-o de um salto

como quem cruza

as fronteiras de um outro país

mas é aqui o meu país

canteiro corrido com ar de petiz

barro vermelho basalto negro

polidos

com cuidados de aprendiz

da mansidão

que cai sobre estes umbrais

avesso das bravias bravatas

dos que astuciosa e insidiosamente

atiçam o norte contra o sul

e erguem a língua traiçoeira

como um corrimento fétido e alucinado

mas há o bafo limpo da gente sorridente

de mãos calosas e abraço quente

há as praias de sol silente

morrendo nos batentes do dia

mas a semente da vida plantando

na cerviz do habitante

erguido sobre a pedra da matriz

e há sobretudo a promessa

que reconhece

no fulgor dos campos

entrado outubro

mesmo quando alguém lhe diz

hoje morreu um homem

de seu nome chamado luiz

não morreu porque quis

mas porque a morte meretriz

o marcara com a sua bissetriz

então a tristeza essa velha atriz

baila sobre os campos do meu país

onde não cresce a flor de lis

mas aprende a gente a ser raiz

sob o vento vício veloz

sulcando o tempo buscando a foz

é isto sim é isto o meu país

pátria pequena

sem cláusulas minuciosas

para a servidão que lhe prometo

honradamente nas palavras

nem virtuoso nem iluminado

mas de face erguida e boné na mão

saudando a gente alevantada do meu país

Consulte aqui o vídeo do autor, declamando o poema. https://www.facebook.com/EmbaixadadeCaboVerdeemPortugal/videos/293083101838191/?vh=e

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