I
Outrora, viajei-me muitas vezes entre as duas Lagoas. A primeira de São Domingos e outra, a de Santo Antão. Apaixonei-me pela Lagoa da ilha de Santo Antão, ou melhor, da Lagoa, a fronteira. Porque não existe falso fácil. Na Lagoa apesar das desnudes das rochas e da vasta bacia hidrográfica a esfarfalhar-se para abraçar o denso nevoeiro do Planalto Leste que se desenha quando os olhos se abrem de espanto perfeito na sua crueldade e na sua bondade genuínas. O Sol amiúde bate calmamente na pacata e silenciosa localidade e a exaustão visual se apodera de nós e irradia um poderoso magnetismo. Entro e o fim do mundo caí-me em cima do cucuruto como se fosse pássaros voadores. Qual menino filho do mar e das rochas! Dá para se filosofar como uma pedra não é apenas uma pedra. Lá, pespegam somas de beijos no pescoço de meninas que se refugiem ao lado de burros de quem pedem-nas mais um beijo para depois ouvirem o vento que vem da pele sedosa e ver o Sol nascer do intenso calor dos seus molhados corpos.
II
Lagoa levou-me a recordar o filme “The Blue Lagoon” de (Henry De Vere Stacpoole) ou Lagoa Azul que narra a história de duas crianças isoladas algures numa ilha tropical paradisíaca no Sul do Pacífico. Longe da civilização onde, os anjos entoam o Hossana. Elas crescem sozinhas na ilha e se apaixonaram aos poucos à medida que atingem puberdade. Sem cama, sem mesa e não cheiram mal! Nessa história ocorreu-me também a simbólica imagem do quadro de Picasso: “As Mulheres de Guernica”. Ai-ai! Guernica a obra-prima absoluta presente no imaginário de quantas que denunciam ou denunciaram as infinitas tragédias de seios desnudos que mais parecem balas apontadas à indiferença.
III
Na Lagoa as casas são filhas do redemoinho do pó e do vento e os olhos são os faróis da vida. Dá para se recriar histórias de casas de papel de embrulhos imaginárias! Parei... Parece-me que “O amor que não se esquece a pensar que amanhã se há-de esquecer”. Na Lagoa, renascem todas as manhãs uma espécie de desabafo sobre a espuma dos dias e a passagem dos mesmos. Amem! Ai-ai, quando cai a noite ninguém poderá esquecer dos seus filhos, nem do Morpheus nem do Hypnos.
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