O julgamento, esta manhã, do processo de Arlindo Teixeira no Supremo Tribunal da Justiça foi suspenso até ás 15 h, tanto por haver um eventual impedimento ou não do juiz Anildo Martins para conduzir o julgamento (por analisar), quanto pelo facto de o Procurador-geral da República, Luis José Landim, ter exigido a expulsão de Amadeu Oliveira do caso porque ele não paga quotas à Ordem dos Advogados de Cabo Verde. Argumento que Oliveira logo contrapôs, alegando, entre outros, que desde 2013 o Tribunal Administrativo lhe deu razão e o mandou exercer a advocacia em todo o território nacional, além de a própria PGR, ter suscitado a inconstitucionalidade material dessa norma junto do STJ, desde 2006.
A audiência de julgamento do caso referente ao cidadão Arlindo Teixeira - antes condenado a 11 anos de prisão, depois baixado para nove pelo Supremo e, entretanto, mandado soltar pelo Tribunal Constitucional depois de cumprir 2 anos, oito meses e vinte e seis dias de cadeia - começou à hora marcada, mas, como era previsível, logo com os mesmos constragimentos do passado dia 25 de Fevereiro.
É que, de novo, o STJ impediu que mais pessoas entrassem na sala onde ia decorrer a Audiência, declarando que só o advogado de defesa de Arlindo Teixeira, Amadeu Oliveira, tinha autorização para estar presente, o que, no entender deste causídico, configura uma flagrante violação do Artigo 211º da Constituição da República.
"O Supremo Tribunal de Justiça, mais uma vez, violou hoje a Constituição da República quando impediu que pessoas do Povo entrassem para assistir ao julgamento. Eles apenas abriram uma excepção para o Senhor Embaixador Adjunto da República da França, que foi autorizado a entrar, e mais ninguém do povo. Verifica-se, claramente, uma violação da Constituição da República", observou Amadeu Oliveira, afirmando, no entanto, que não é contra a presença desse Alto Oficial da Embaixada de França, para assistir ao desenrolar dos acontecimentos no STJ, uma vez que, ao abrigo da Convenção de Viena, os Serviços Consulares devem prestar assistência aos seus cidadãos. E como Arlindo Teixeira tem nacionalidade francesa, fico satisfeito e vejo com bons olhos o facto de a sua história ter despertado a atenção da Embaixada de França no que se reporta à assistência judicial".
Mas o que incomodou o advogado é o ter sido vedada a presença de cabo-verdianos para acompanhar esse julgamento, onde se vai reanalisar todas as provas anteriormente introduzidas, num processo com cerca de 2 mil páginas. É por isso que Oliveira insiste para que o povo tenha possibilidade de assistir ao julgamento. É isso que o revolta. "Os cidadãos cabo-verdianos também direito a entrar naquela audiência pública. Entretanto foram todos impedidos, incluindo mais uma advogada da equipa de defesa, ou seja deixaram entrar eu e mais uma advogada, impedindo outra da equipa de estar presente numa sala que podia perfeitamente receber pelo menos mais cinco pessoas", constestou Amadeu Oliveira.
PGR ao serviço da OACV
Ultrapassada a questão da assistência pública, Amadeu Oliveira e a sua equipa aceitaram as condições impostas para não prejudicar o seu cliente, Arlindo Teixeita, que, depois de perder tudo com esse processo que o mantém retido em Cabo verde há mais de cinco anos, está a deambular em São Vicente como pobre coitado.
Só que, mal começaram os trabalhos, Amadeu Oliveira e o Procurador Geral da República entraram em choque. Luis José Landim, o PGR, terá exigido que o advogado seja expulso do processo porque não paga quotas à Ordem dos Advogados de Cabo Verde, logo, sem licença para exercer a função. Amadeu Oliveira reagiu de pronto e com grande veemencia, criando um ambiente de cortar à faca entre os dois, que o juiz Anildo Martins teve de intervir para acalmar os ânimos, perante o olhar atónito do adjunto do Embaixador de França.
"Foi muito lamentável a atitude aguerrida do senhor Procurador Geral da República, Dr Landim, que mostrou ter como primiera preocupação o seu afastamento do processo, como se existiesse em Cabo Verde outro jurista que conhece o processo tão bem". Reproduzindo as palavras de Oliveira: "ele entrou muito agressivo e a atacar-me pessoalmente, para pedir a minha expulsão do processo como advogado de defesa, alegando que eu não pago quotas na OACV. Ora, ele esquece que sendo um processo-crime, o Arlindo Teixeira pode escolher para o defender quem bem entender, até uma pessoa que não é advogado para ser seu defensor. E se eu gozo da confiança de Arlindo Teixeira como seu defensor oficioso não pode o PGR querer a todo o custo afastar-me do processo", sustenta Oliveira.
Aliás, para Amadeu Oliveira, o PGR "está a fazer jogo", pois "sabe muito e anda a esconder, e isto é grave e preocupante não para mim mas para a República de Cabo Verde". "Vejamos: o dr Landim entrou com uma capa de defesa dos Estatutos da Ordem dos Advogados, dizendo que recebeu hoje uma nota do bastonário da OACV dizendo que não podia exercer porque não estava a pagar quotas. Isto é verdade, eu não pago quotas. Mas o Dr. Landim sabe e não diz, o que de certo modo é uma desonestidade, que eu já interpus um recurso administrativo em 2013 contra a OACV, nesta questão de quotas, e a Juíza Dra. Januária Costa, que era juiza do Tribunal Administrativo, reconheceu-me razão e mandou-me exercer em todo o território nacional. Só que a OACV recorreeu para o STJ em 2014. Registe bem o que estou a dizem: o recurso referente a questão das quotas da OACV está no Supremo Tribunal desde Abril de 2014 (o número do recurso é 104/2014 de 6 de Abril) e já vamos em Março de 2021, um processo fácil, ainda até hoje, volvidos 7 anos, o STJ ainda não decidiu sobre esse processo. O Dr. Landim tem conhecimento disso, mas em vez de defender a Constituiçâo da República e, na qualidade de PGR defender o direito de todo o cidadão ter acesso a justiça em tempo devido, ele entra num julgamento se importando somente em expulsar o advogado Amadeu Oliveira com o falacioso argumento do não pagamento de quotas".
Tribunal Administrativo deu razão a Amadeu
Para Oliveira, a postura do PGR é preocupante e mostra o que se está a fazer com Cabo Verde. "A República de Cabo Verde e a Justiça está gravemente doente, sobretudo com intervenções da Procuradoria Geral da República desse calibre. Isto porque o actual PGR está a contradizer não a mim, mas sim a contradizer a juiza Januária Costa que me mandou exercer, e está a contradizer a própria Procuradoria Geral da República, porque o anterior PGR, Franklin Furtado, já tinha suscitado, junto do STJ, a inconstitucionalidade material dessa norma que proíbe o advogado de exercer a sua profissão só por uma questão de quotas. Portanto, já existia uma posição oficial da Procuradoria-Geral que foi assumida pelo Dr Franklin Furtado, actual Procurtador-Geral Adjunto. Entretanto, não sei porquê, a Procuradoria-Geral, agora, muda de posição e vem pugnar, querer forçar a expulsão de Amadeu Oliveira do processo, com ataques pessoais a meu respeito e dizendo coisas que não vale a pena repetir na comunicação social".
O julgamento acabou sendo suspenso, para continuar às 15h30, também porque foi suscitado, por Oliveira, um eventual impedimento contra o juiz Anildo Martins continuar a conduzir o processo, facto que estará a ser analisado, para ser decidido com urgência.
Sobre a questão do não pagamento de Quotas à OACV e sobre a postura do actual Procurador Geral da República, Oliveira promete responder, por escrito, de forma pública, num artigo de jornal, de modo a ver se essa questão fique clarificada, até para que a Procuradoria Geral da República "não caia em cenas tristes como essa". É de realçar que, colocada a questão, o Juiz Anildo Martins que presidia o julgamento, indeferiu logo liminarmente a pretensão do Procurador Geral da República, sem embargo de se voltar a analisar a questão em outra sede.
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