Será o Mundo uma família
Ponto de Vista

Será o Mundo uma família

I

A NOSSA CASA

Não iria deixar escapar o que foi afirmado e antes bem pensado pelo Presidente da República de Portugal Marcelo Rebelo de Sousa, por ocasião das celebrações do 5 de Outubro, dia da implantação da República Portuguesa. Pessoa que diz o que pensa e pensa no que diz.

De destacar o sentido de trazer o conceito democracia à terra, sobretudo uma democracia que garante os direitos de todos, sem discriminações. Que a Educação, a Saúde e a Segurança Social não sejam razão para mais ostracizações, discriminações, separações, guetos sociais e culturais, antes pelo contrário proporcione aos cidadãos novos caminhos, novas escolhas para a vida, aproximando-os. Logo, a convergência nacional para a prossecução dos objetivos que a todos pertencem, recaindo em nós todos as responsabilidades para os atingir, sem deixar ninguém para trás. Objetivos comuns, no respeito e tolerância pela diferença. Sendo fundamental para a prática e continuação dos objetivos a interiorização pessoal e quotidiana do “exercício da humildade cívica”.

Muito importante! Deve ser audível a todos. Recebidos positivamente e de espírito aberto os ensinamentos. Incluindo todos os governantes, todos os presidentes da república, a todos os políticos, aos artistas, ao mesmo tempo que deve ser levado à prática, à condução política das pessoas, sem demagogias, sem exercícios intelectuais verbalizados no posicionamento e significado das palavras.

Num dos muros laterais do Templo Hindu – Telheiras, Lisboa -, mais precisamente aquele virado a Este, estão colocadas sete (7) lápides (ou 7 notas musicais?), da minha esquerda para a minha direita, na posição em que me encontro para ele virado:

Budismo, Cristianismo, Fé Baha’i, Hinduísmo, Islão, Judaísmo, Tradições Chinesas. Com um dizer “O Mundo é uma Família”.

Não há Esquerda, não há Direita ou Centro. Há pessoas! Ricos, pobres, remediados, afortunados, desafortunados. Deverão ser os ricos a empreender o equilíbrio e a justiça económico-sociais? Deverão ser os pobres? Os remediados? Por que não os infelizes, ou os nascidos com as nádegas viradas para a lua. Ou recomeçar tudo de novo? Da estaca zero! Será alguma vez possível? Julgo que não. Estaca zero?

O hinduísmo apela à existência de uma Família. Concordo, no sentido de termos origens em comum e de fazê-las perpetuar neste planeta que não pertence aos humanos. Não é a sua Casa original. Será que terão Casa? A nossa Casa é a nossa condução moral, ética, política, social e cultural. A nossa Casa é o salto! Salto qualitativo.

Seremos então seres humanos aqueles viventes pensantes (apetrechados de inteligência) esperando ainda a vinda do Messias, para ganharmos e tomarmos a consciência de quem somos, o que somos e o que devemos fazer, de modo a nos tornarmos melhores, crescermos, dando assim o salto qualitativo - moral-ético-político-social-económico - necessário. Com os saltos quantitativos e qualitativos da ciência e da tecnologia tem-se vindo a demonstrar que nos aproximamos rapidamente do gatilho físico da destruição. O crescimento imoral. O decrescimento moral, a negligência indigente impedindo sempre. Infetam mundo inteiro! Mutilamo-nos, destruímo-nos, alteramos radicalmente a face da Terra. Conflito permanente, quando não é mesmo guerra com outras espécies viventes autóctones do planeta, levando-os à sua destruição.

Seremos todos seres humanos ou existirão criaturas pensantes que não trazem a destruição em si, dentro delas? Mera pergunta que não é apenas de retórica. É fundamentalmente substantiva. Hoje, cada vez mais concorre-se, disputa-se com a Natureza e suas espécies autóctones, como se fosse algo a fazer desparecer, para além da doentia tendência de ir eliminando o semelhante. Ao invés, deveríamos ajudá-la, entendê-la, compreendê-la, participá-la, complementá-la. Sendo uma família, temos então o dever de continuar habitando este Planeta, como para além dele, com melhor qualidade de relacionamentos, confortos materiais e espirituais.

II

INCORREÇÕES, IRREGULARIDADES, DISFUNCIONALIDADES

Trazendo à lide a realidade dos países falantes da língua portuguesa, verificamos que as coisas funcionam cheias de incorreções, irregularidades, disfuncionalidades. Atemo-nos apenas a Portugal, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Guiné e Brasil.

Portugal, depois de libertar-se da má e corrupta governação, encara o futuro com otimismo. Há um PR ativo, interventivo, participativo, democrático, com preocupações e ações concretas nas realidades sociais e suas injustiças. Inquieto, ativo na composição da Justiça Social e equilíbrios políticos. Há um governo que, em minha opinião, segue um caminho que não é incorreto de governação, além das contas do Estado, das dívidas externas e seu equilíbrio, está preocupado com o cidadão, a sua educação, o social e o económico, em harmonia, no plano geral da política interna e externa do país, com o PR.

Cabo Verde é um país desgovernado, com governos que não governam o país, com o atual PR JCF cheio de apetites pelo petróleo de um país desgovernado por párias e ditadores, a Guiné-Equatorial. Com desprezo pela História, Língua e Cultura (que é fundamental para a unidade de um país) do Arquipélago. Com governos que desprezam o Ensino, a Educação, a língua portuguesa, a língua crioula, a formação das crianças e jovens, que omitem intencionalmente a verdade sobre a História, Cultura e Crioulo de Cabo Verde. Com um Primeiro-ministro (Ulisses Correia) que contrata (contrastando com a normalidade dos usos e costumes legais e administrativos) com empresas da família que vive na Suécia para produzir manuais de Matemática, demonstrando uma vez mais o desprezo pelo Ensino, pela Educação e pela língua portuguesa. Pergunta-se: o que pode esperar-se deste holograma de Estado?

O mesmo ou pior pode dizer-se acerca do atual governo de São Tomé e Príncipe (outro holograma de Estado), onde já se importam topas ruandeses para o controlo público das pessoas santomenses, onde já se fala em caminhar-se para uma ditadura militar, ameaçando os valores e restos de democracia existentes ainda no país. Alertaram o seu PR, mas este ao que parece também anda adormecido, ou parece ser também um pau-mandado de alguém acima e mais forte que ele. PR e o Primeiro-ministro Trovoada são os subscritores e propagandistas número um da adesão da Guiné-Equatorial à CPLP. A ditadura expressa, a antidemocracia já existem de facto em São Tomé, sendo Trovoada, concomitantemente com JCF os grandes impulsionadores, causadores e garantes da adesão daquele país totalitarista e ditador da Guiné-Equatorial ao agora clube privado em linguajar português (cplp).

Quanto à Guiné-Bissau, verificamos a sua permanente inconstância, instabilidade, sem rumo aparente. De fronteiras abertas ao mundo internacional do crime, tal como Cabo Verde e São Tomé.

Sobre o Brasil temos muito a temer sobre o Presidente Temer. Aguardemos que a justiça funcione, que encontre o caminho do equilíbrio e da estabilidade. Todos precisamos de um Brasil adulto e democrático, com justiça social e económica.

Angola, Moçambique, Timor! Timor que procura intensamente o seu crescimento, o que me faz olhar com esperança o seu futuro. Acredito no seu futuro justo e equilibrado. Moçambique e Angola ainda trabalham na busca da democracia. Confio nos povos!

III

A FALTA DE COERÊNCIA ENTRE A PALAVRA E A AÇÃO

Mas de momento o que deixa mais prementes preocupações ao meu espírito é o completo desajuste entre as palavras e atos, condutas de São Tomé e Cabo Verde (Governos e Presidentes) em relação às suas próprias realidades, aquelas que os rodeiam diariamente. Das palavras jurídicas e constitucionais não se vê reflexo no real concreto, material e quotidiano das pessoas. São uns burlões das palavras!

Não é possível aceitar pessoas, governos que, sob a máscara das palavras democráticas, de inspiração democrática, existentes nas suas respetivas Constituições, libertem o seu apetite voraz pelo petróleo da Guiné-Equatorial, causando a adesão à CPLP de um governo pária e ditatorial, violador de todos os direitos do ser humano, implicando todos os outros países falantes da língua portuguesa nessa voracidade. Não podemos aceitar ser corrompidos nos bastidores da vida por pessoas sem valores morais, éticos, políticos, sociais, culturais, sem valores de democracia. Não podemos aceitar ficar encurralados pela gula de uns, encurralados num mundo de fascismo tropical, de praia, sol e turismo, encapotado por uma democracia de palavras. Não podemos permitir que um PR (JCF) venha declarar o seu apetite pelo crude de Obiang, justificando-se com o apetite dos outros sete países, ao reforçar o seu apoio àquele país com ênfase para a sua democracia que não é perfeita. Imperfeita é a de Portugal, considero eu. Naquele país inexiste!

Cabo Verde também tem sido governado por uns parasitas, vivendo por conta do dinheiro (empréstimos externos) que é destinado diretamente e unicamente em proveito do Povo. Os goves de CV aplicam o referido dinheiro emprestado para seu próprio uso privado e interesses particulares. Não o aplicam na sua totalidade às necessidades do país e das pessoas. Por esta razão, elas e o país andam falhos, falidos, insolventes, cheios de problemas sociais e económicos e com verdadeira pobreza material.

São governantes sem ideário político de governação. Não têm pensamento político. Têm pensamento oportunista. Esta é que é a infeliz realidade de Cabo Verde e de São Tomé.

No que toca a CV, já na década de trinta do século XX havia afirmado a sua independência cultural. Não precisava de independência política. Pois sempre esteve integrado na Administração e no quadro da organização administrativa do Império Colonial Português, tendo a autêntica noção e consciência que sempre foram cidadãos portugueses, súbditos do Rei e da monarquia portuguesa, jurídica e constitucionalmente pensados, desde o século XVI.

Pois, a Claridade, movimento intelectual, cultural, político, social, elegeu sempre a Pessoa, o Povo e a sua Terra como suas preocupações fundamentais, estruturantes para prossecução dos objetivos pretendidos. A sua dignificação, a sua exaltação, a sua elevação. O elogio do esforço do trabalho, do estudo, aprofundamento e seus desenvolvimentos. Não deixar ninguém para trás foi a sua força motriz, intelectual, espiritual e cultural. Foram valores históricos, linguísticos, culturais, socais, económicos e políticos que enformaram aquele pensamento cabo-verdiano. NÃO DEIXAR NINGUÉM PARA TRÁS! A democracia social, política, económica, cultural e étnica refletida nas concretas vidas das pessoas, individualmente consideradas e no seu conjunto é o que suporta a Claridade nos seus fundamentos existenciais. Conscientes da realidade ou realidades das Ilhas, da pobreza geográfica, climática, refletida nas realidades materiais delas imanentes, pretendiam desenvolver a riqueza espiritual, cultural e histórica que sabiam existir nas gentes da Terra. Não é uma democracia badalada de revista em punho e falada pela formalidade das palavras plasmadas em papéis, sem mais outra consequência. A Claridade pretendia defender as liberdades e a democracia, um pensamento laico que agregava uma concepção do ser humano como Pessoa, mais do que como cidadão, ambicionando que o Estado tivesse no seu ideário político de governação a função, entre outras, de garantir a solidariedade social a favor dos que mais precisavam e da justiça social. Era a favor do mundo do trabalho e das academias, da sua dignidade e elevação. A favor da liberdade de pensamento, liberdade de expressão e da liberdade imprensa. A Claridade foi vítima e foi perseguida pelo fascismo de Salazar. Aos pós-independência de CV (que trouxe a falta de independência das pessoas e do País), na pessoa hoje do atual PR JCF, dá um jeito enorme continuar com a estigmatização, discriminação, censura na comunicação social e perseguições políticas, veladas ou não, dentro das próprias fronteiras. Dá jeito continuar com um fascismo mascarado por uma Constituição da República que apenas existe escrita no papel. Apenas no plano formal. Engana todos os que são relativamente próximos e o resto mundo.

O atual PR de CV JCF e o atual governo do Arquipélago têm sido um péssimo contributo para a questão História/Crioulo, como aquele apelidou quando quis passar “uma festinha nos meus cabelos alvos”.

No que respeita à Claridade (única substância válida existente em CV para a condução política e social de uma comunidade), esta foi perseguida pelo fascismo, Mário Soares, depois, condecorou um dos seus vultos, Baltasar Lopes da Silva. Hoje, JCF e os governos sucessivos do Território desrespeitam, maltratam, desprezam. Querem apagar de vez da memória coletiva cabverdiana.

Na verdade, os cabverdianos residentes no Arquipélago, especialmente estes - pois diz-lhes respeito toda realidade lá vivida, com toda a legitimidade -, acordam todos os dias para enfrentar a duríssima vida das Ilhas, enquanto uns preocupam-se com imagem própria, penteadinhos e de estilinhos "in", sofás de vidro, mulheres de porcelana e espermatozoides de pedra saltando de alegria nas almofadas de plástico ressequido ou outras coisas que o POVO não precisa para a sua vida de limitações e restrições materiais, económicas, financeiras, de pão, de arroz, de milho, de peixe e carne e legumes, académicas, filosóficas, espirituais, culturais, históricas, linguísticas... Não! POVO NÃO PRECISA de pessoas que só olham ao espelho e inventam realidades e não olham para a realidade concreta que os circunda e rodeia diariamente. Para essa REALIDADE não querem mesmo saber dela. Não é com eles. Eles estão noutra que não em Cabverd!

Pois, hoje em S. Tomé, CV e Guiné-Bissau não existe liberdade de pensamento, liberdade de expressão e liberdade de imprensa! Existe perseguição política, medo, ameaças veladas ou não, coação moral e física, censura jornalística, censura no Ensino, censura na Educação, censura histórica, linguística e cultural. Existe apenas a democracia formal das palavras (exercício intelectualizado), do posicionamento e significado delas. Delas, as palavras desligadas do real concreto. Verdadeiro quisto maligno!

CV, ST e GB não merecem viver o que vivem. Na verdade, o pensamento democrático e humanista NÃO DEIXAR NINGUÉM PARA TRÁS, não existe naqueles países: quase a totalidade das suas gentes são deixadas para trás, sem dó nem piedade (é o salve-se quem puder). Locais que nos lembram guerra, pobreza, mortes por fome e exploração do ser humano não merecem continuar com os estigmas, discriminações e ostracizações que já deviam fazer parte da História, servindo hoje de ensinamento para a construção de um mundo melhor. Para que possam contribuir ativamente na constituição digna de uma família mundial.

Os governantes desses países ignorando quase por completo a sua História, ignorando os valores da democracia, ignorando os princípios da convivência respeitadora e tolerante pelo seu semelhante, esquecem-se intencionalmente da sua História muito recente.

Não são dignos do lugar e das funções que desempenham!

José Gabriel Mariano, Lisboa, 11/2017

Beliscar das auroras

“al-ves nen ê ka pobreza ki ta da + revolta

ou ki + ta duê ….

Ki + ta duê ê ostentason di grandeza”

Onda Kriolu

I

O tempo decide

Porque o espaço é temporal

Que pelos lugares diga-se

Pactuar a mediocridade humilha-se

Olhamos a temporalidade que já passou

No mesmo chão que já deixou

II

Porque espaço é temporalidade

A decisão traz no tempo

A dor que faz chorar

Depois quer revoltar

Não é ser pobre a pobreza

Que vincou na geografia

Falta de sustento na certeza

É ostentação de riqueza

Desafinada em toda sua beleza

No chão que brota

Injustificada

Toda ostracização bem estratificada

Não é a pobreza que dói

É o mal que corrói

Neste beliscar das auroras

Quando ouvimos o bater das horas

Seu ritmo compassado afirmar

O tempo decide

Porque o espaço é temporal

Raphael d’Andrade,

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