Prisão de Ribeirinha, a Bastilha de Cabo Verde! (iii)
Ponto de Vista

Prisão de Ribeirinha, a Bastilha de Cabo Verde! (iii)

Tinha dito ao Dr. Amadeu Oliveira que a sua luta configurava uma corrida de maratona e não uma corrida de cem metros e que poucos estariam dispostos a colaborar com ele, enfrentando os que ganham com este sistema injusto, lutando a favor do status quo, sobretudo num país onde impera a cultura do medo e da autocensura, um país cujo povo tem no seu DNA o receio de enfrentar quem tem poder.

“E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso entendimento (…)” Romanos 12:2

 

Quem inventou a lâmpada elétrica não tinha diploma algum da física. Por isso, não me peçam documento algum, para escrever ideias sobre leis, crimes e sanção penal, pois que a vida, a ciência, é tudo questão de bom senso e de equilíbrio. No entanto, não estou aqui a desvalorizar o estudo organizado de um assunto numa instituição de ensino.

Desde 20 de julho de 2021, temos na Cadeia de Ribeirinha em São Vicente, em prisão preventiva, o Dr. Amadeu Oliveira. Prisão preventiva, um recurso extremo, de natureza cautelar, decretada quando não houver outra medida alternativa e eficaz.

Os pressupostos que suportam esta medida mais gravosa são: 

a)     O perigo de fuga do arguido – argumento longe da verdade e desprovido de qualquer fundamento válido no caso do Dr. Amadeu Oliveira, pois o mesmo esteve no estrangeiro recentemente, voltou para Cabo Verde e esteve disponível para se apresentar livremente nas autoridades policiais e judiciais sempre que for convocado para tal finalidade;

b)    Perturbação das investigações – não se coloca esta questão e nada a apontar que justifique a prisão preventiva do Dr. Amadeu Oliveira, visto que todos os dados são oficiais e estão na posse das autoridades, pelo que cai por terra qualquer fundamento neste sentido;

c)     Perturbação da ordem pública – se alguém que esteja a pelejar pela melhoria do sistema judicial, que tem feito denúncias graves contra atores relevantes do sistema judicial e se se entender que isso constitui delito e põe em risco a sociedade, então é melhor tomarmos a posição no ranking dos países que são a lanterna vermelha do Estado de direito e da democracia; assim a prisão preventiva do Dr. Amadeu Oliveira é justificável;

Com efeito,

Inexistindo estes fundamentos para a prisão preventiva do Dr. Amadeu Oliveira, estamos diante de:

        i.         Uma prisão arbitrária e ilegal, por violar a lei e, provavelmente, fundamentada em pressupostos discricionários aceites apenas nos países cujas instituições são capengas, frágeis e ineficientes; Portanto, o Dr. Amadeu Oliveira é um prisioneiro político de um Estado que assume a democracia e o estado de direito nas suas leis e instituições, mas que, na prática, age como uma ditadura brutal, pois a linha divisória que separa o ponto de partida e o ponto de chegada do poder judicial e do poder governamental é uma autêntica confusão; (veja a CRCV art.º135 nº1 alínea f – quem nomeia o Procurador Geral da República, na prática, é o Governo, o que implicitamente impõe um conflito de agencia, uma vez que o PGR não é livre para avaliar a legalidade dos atos governamentais, facto que limita, por si só, o estado de direito e a democracia!)

      ii.         Uma prisão revanchista e vingativa, em decorrência das várias denúncias feitas contra “A NÃO JUSTIÇA”, contra este sistema medíocre de justiça, cuja produtividade e lisura dos agentes da justiça têm sido postos em xeque pelo Dr. Amadeu Oliveira;

Tinha dito ao Dr. Amadeu Oliveira que a sua luta configurava uma corrida de maratona e não uma corrida de cem metros e que poucos estariam dispostos a colaborar com ele, enfrentando os que ganham com este sistema injusto, lutando a favor do status quo, sobretudo num país onde impera a cultura do medo e da autocensura, um país cujo povo tem no seu DNA o receio de enfrentar quem tem poder.

Também são quinhentos anos da escravidão, mais quase cinquenta anos de um Estado soberano capturado pela corrupção, que faz a apologia da cultura de “cotxipó”, álcool e festas e, ao mesmo tempo, persegue os que pensam o futuro de Cabo Verde de forma racional, como o caso do Dr. Amadeu Oliveira, provocando o efeito multiplicador do medo na alma deste povo!  

Enfim, para terminar, vinte dias se passaram desde a prisão injusta do Dr. Amadeu Oliveira, pelo que é dizer com Georges Bernanos que “oespetáculo da injustiça acabrunha-me, mas isso deve-se provavelmente ao fato de ela despertar em mim a consciência dos atos de injustiça de que sou capaz!”
 
Amândio Barbosa Vicente     

Praia, 08 de Agosto de 2021.

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