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O ano de 2022 não podia terminar pior
Ponto de Vista

O ano de 2022 não podia terminar pior

Não gosto de lugares comuns, nem de generalizações, mas não erro ao afirmar que a comunidade cabo-verdiana nos Estados Unidos está de luto e chora o passamento do Valdir Alves.

Lembrei-me hoje do meu primo Xande Silva, que desapareceu há três anos e o dia, embora esteja de férias, não me soube bem. Quando a Valéria chegou à casa, disse-lhe “não tive um bom dia, não sei por quê, um dia estranho". 

É então que recebo a notícia de que o meu camarada, amigo, colega, Valdir Alves partiu sem dizer tchau. Tinha na agenda telefoná-lo amanhã, para a nossa conversa quinzenal e lhe desejar um 2023 com total recuperação física.

Desde que adoeceu, ligava-lhe a cada 15 dias para saber da saúde, dos últimos exames, como se sentia, dizer-lhe que mantivesse a fé em Deus, que diariamente orava a Deus por ele e tentava motivá-lo. Da última vez, não gostei da voz dele e fiquei muito preocupado com algumas situações físicas que enfrentava. Embora tentasse mostrar muito positivismo.

Não gosto de lugares comuns, nem de generalizações, mas não erro ao afirmar que a comunidade cabo-verdiana nos Estados Unidos está de luto e chora o passamento do Valdir Alves.

Ele era o homem que ligava a comunidade, através dos seus programas de rádio, de Cabo Video, na tv, e de vários outros produtos criados por ele, sempre com Cabo Verde e a comunidade no centro. Era promotor cultural, desportivo, um activista por Cabo Verde.

Desde 1992, que eu saiba, foi o único jornalista cabo-verdiano profissional a trabalhar na comunidade, entregando-se e desgastando-se física e emocionalmente. Mas nunca parou, trabalhava horas e horas, reinventando formas de colocar os seus programas no ar, num mercado onde cada segundo é pago e cuja comunidade patrocinadora é muito pequena.

Valdir soube ficar no fio da navalha, tendo de um lado os paicivistas e do outro os mpdistas, todos pensando ser os donos da verdade. Cobriu tudo o que era evento, não deixou comitivas que vinham das ilhas sem referência, procurou o diálogo sempre, os microfones dele estiveram sempre abertos para opiniões, comentários, para lembrar a terra ou pedir música. Os artistas, de cá e de lá quando passavam por aqui, entravam casa adentro pelos microfones e câmeras do Valdir e seus colegas.

Nunca se cansou de colaborar com a imprensa em Cabo Verde.

E que colega chegou aos EUA e não contou com o apoio do Valdir???!!!

No meu caso, sempre que precisava de uma informação, de um contacto, ligava para ele e, sem qualquer espírito de secretismo ou suposta exclusividade, respondia positivamente. Quando adoeceu e liguei, nas primeiras vezes, ele começava a querer dar notícias, e tinha de lhe dizer “é apenas para saber da saúde, como estás, camarada?!”

Sentirei, sim, muitas saudades, meu camarada, da tua amizade, da tua competência, da tua presença apenas.

A diáspora e Cabo Verde, espero, saberão colocar-te no pedestal que nunca gostastes, mas que conquistastes pela tua forma de ser e teu trabalho.

Embora possa aparentar ser totalmente fora do contexto protocolar, sou da opinião que o Estado devia assumir o enterro do Valdir, com o destaque que ele merece.

Nós continuamos a caminhada, camarada.

Das nossas conversas, acredito que terminaste os teus dias de bem com o Criador.
À família um abraço solidário neste momento tão difícil. Deus enxugará as vossas lágrimas.

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