MANUAL DO 10.º ANO DE LÍNGUA E CULTURA CABO-VERDIANA – NOTA DE ESCLARECIMENTO 
Ponto de Vista

MANUAL DO 10.º ANO DE LÍNGUA E CULTURA CABO-VERDIANA – NOTA DE ESCLARECIMENTO 

...a Equipa repudia veementemente as calúnias pessoais proferidas por vozes autoritárias, bairristas, xenófobas e profundamente misóginas, as quais responderão, oportunamente, no fórum apropriado e nos termos da lei. A Equipa reitera o seu compromisso em continuar a trabalhar em prol da valorização e promoção efetiva da LCV, pela via da sua oficialização, ensino e investigação.

Na sequência dos artigos publicados neste órgão a respeito do Manual do 10.º Ano de Língua e Cultura Cabo-verdiana, a saber:

i)                    A ABERRAÇÃO LINGUÍSTICA CONSTANTE DO MANUAL DE LÍNGUA E CULTURA CABOVERDIANAS, publicado online a 2 março de 2025;

ii)                O berdianu não está em processo de padronização e sim de didatização, publicado online a 3 março de 2025;

iii)              A Tanga Rota da Pandialetalidade [ou os propósitos supremacistas/bairristas de dona Dominika e suas nacionais e desalmadas ajudantas, ora erigidos como vera língua do povo das ilhas], publicado online a 12 de março de 2025;

iv)                O Crioulo Berdianu e a Incapacidade Político-Administrativa em Cabo Verde, publicado online a 14 de março de 2025.

Para esclarecimento da opinião pública redige-se o presente direito de resposta, para ser publicado conforme o estabelecido no capítulo VI da Lei de Imprensa (diploma nº 73/VII/2010, de 16 de Agosto).

A equipa produtora do Manual do 10.º Ano de Língua e Cultura Cabo-verdiana (conceptoras e validadoras; doravante Equipa), face à gravidade da desinformação que tem circulado nas redes sociais e em órgãos de comunicação social, sente-se no dever de esclarecer o grande público quanto a alguns dos princípios orientadores (socio)linguísticos, pedagógicos e didáticos, há muito atestados em literatura especializada e em contextos semelhantes à ecologia linguística cabo-verdiana, que fundamentam todas as opções adotadas na elaboração do Manual, inclusivamente a escolha de uma proposta de ortografia pandialetal para a voz das autoras.

Contextualização
O Manual (disponível em: https://minedu.gov.cv/manuais62) tem como base o Decreto-Lei n.º 28/2022, publicado no Boletim Oficial n.º 68, I Série, de 12 de julho de 2022 (disponível em: https://boe.incv.cv/Bulletins/Details/A2022/S1/BO68/4313), que cria a disciplina, bem como o respetivo programa (https://minedu.gov.cv/recursos_educativosprogramas_escolares/79), elaborado em estrita conformidade com esse diploma legal.

Fundamentos (socio)linguísticos
Com base no conhecimento de que todas as línguas variam, sem que isso comprometa a comunicação entre os falantes, reconhece-se a Língua Cabo-verdiana (doravante LCV) como um conjunto de nove variedades dialetais. Todas elas, independentemente do número de falantes, são:

-        Dotadas de igual valor identitário e linguístico;

-        Dignas do ensino e da escrita;

-        Parte integrante, de facto e por direito, do património linguístico cabo-verdiano.

Não reconhecer este princípio equivaleria a hierarquizar as variedades segundo o número de falantes, conferindo supremacia à variedade de Santiago e relegando as demais para um plano secundário — instrumentalizando o ensino para impor uma única variedade.

Fundamentos pedagógicos e didáticos

A proposta baseia-se na pedagogia da variação e visa fomentar a competência multidialetal ou variacional. Assim:

-        Cada participante da sala de aula (professor e alunos) utiliza a sua variedade nativa;

-        Promove-se a interação e a intercompreensão entre alunos de diferentes variedades;

-        Trabalha-se, de forma consciente e sistemática, a compreensão oral e escrita, assim como o funcionamento da língua, de todos os dialetos, de Santo Antão à Brava;

-        Ensina-se a gramática da LCV, de forma contextualizada, com base em regras comuns e específicas de cada variedade, utilizando o conceito de regras variáveis (Labov, 1966 e posteriores).

Desse modo: i) consciencializa-se os alunos sobre a unidade e diversidade naturais da LCV; ii) desenvolve-se atitudes positivas face à variação linguística; iii) combate-se preconceitos linguísticos.

A proposta de ortografia pandialetal

Considerando os pontos anteriores e, ainda: i) o princípio ético de não usar o contexto educativo para impor qualquer variedade; ii) a inviabilidade material de grafar as nove variedades em comandos e instruções; iii) a vantagem de uma ortografia unificada, que não é incompatível com a diversidade linguística e iv) a possibilidade de agir social e tecnicamente sobre as línguas, a Equipa optou por uma proposta de ortografia pandialetal, inclusiva e integradora de todas as variedades.

Essa ortografia:

-        Usa o alfabeto oficial da LCV;

-        Representa todas as variedades em pé de igualdade, mesmo que os traços específicos não estejam todos explícitos;

-        Permite a leitura e a pronúncia por qualquer falante, sem substituição da sua variedade nativa.

Tal proposta não é nova, pois como afirma Veiga (2000:25; destaque nosso):

As variedades regionais continuarão a existir. Cada ilha continuará com a sua própria expressão dialetal. Apenas a língua oficial utilizada no ensino e na administração oficial, particularmente através da escrita, será a variedade unificada.

Não se trata, portanto, de padronizar a LCV, criando uma nova variedade. Como detalhado na página 205 do Manual, a proposta de ortografia pandialetal:

- Aplica-se apenas aos comandos e textos explicativos (voz das autoras);

- Não se recomenda o seu ensino aos alunos;

- Os alunos são expostos a textos orais e escritos autênticos grafados no Alfabeto Cabo-verdianos (AC) oficial  (https://boe.incv.cv/Bulletins/View/7345) de todas as variedades, ou seja, praticam o AC e analisam textos no AC, comparando-os com a grafia de autor.

- Está inserida na investigação-ação prevista para a fase experimental da disciplina (cf. artigo 15.º, n.º 2, alínea b) do supracitado Decreto-Lei n.º 28/2022).

As opções ortográficas adotadas estão descritas nas páginas 205-207 e baseiam-se em conhecimento profundo das estruturas fonética, fonológica e morfossintáticas das variedades da LCV, resultado dos diversos trabalhos aprofundados de investigação, desenvolvidos pelas autoras na última década, em variedades nunca antes estudadas.

As autoras, seguindo as melhores práticas de investigação, assumem explicitamente (p. 205 do Manual) abertura à revisão fundamentada das opções, desde que estas sejam cientificamente justificadas e baseadas na prática reflexiva dos docentes, e não em discursos pseudocientíficos ou preconceituosos. Comprova essa abertura a reunião nacional com todos os professores da disciplina de Língua e Cultura Cabo-verdiana já organizada pela DNE, por sugestão da Equipa, no dia 13 de março 2025.  

Todos os membros da Equipa atuaram como investigadoras seniores, reconhecidas pelos seus respetivos centros de investigação e pares, e não como representantes da Associação da Língua Materna Cabo-verdiana (ALMA-CV). Repudiam, por isso, os discursos negacionistas que desprezam a ciência em favor do senso comum desinformado — tendência infelizmente crescente.

Em relação aos honorários, nenhum membro da equipa recebeu sequer metade do equivalente a um mês de ordenado auferido na sua categoria, pelo trabalho desenvolvido entre maio de 2024 e janeiro de 2025, pago pela Porto Editora, no âmbito contratual, facto que pode ser comprovado a qualquer momento.

Finalmente, a Equipa repudia veementemente as calúnias pessoais proferidas por vozes autoritárias, bairristas, xenófobas e profundamente misóginas, as quais responderão, oportunamente, no fórum apropriado e nos termos da lei. 

A Equipa reitera o seu compromisso em continuar a trabalhar em prol da valorização e promoção efetiva da LCV, pela via da sua oficialização, ensino e investigação.

Praia, 08 de abril de 2025

A Equipa produtora do Manual do 10.º Ano de Língua e Cultura Cabo-Verdiana

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Comentários

  • Balantim Semedo, 12 de Abr de 2025

    Agora que é muita confusão. Ninguém percebe nada deste emaranhado de esclarecimentos, informações e comentários avulsos sobre uma matéria tão séria e transversal. Viva a língua de todos nós.

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  • Informação, 12 de Abr de 2025

    Os extratos do comunicado estão na ordem correta, lidos de cima para baixo. A numeração não tem nenhum significado no presente contexto.

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  • Informação, 12 de Abr de 2025

    7. A Comissão Científica da DALMACV-PT composta, in casu, por Ana Josefa Cardoso, Dulce Pereira, Alice Matos, Nélia Alexandre e Hans-Peter (Lonha) Heilmair informa que o processo de análise e reflexão sobre o "Manual de Língua e Cultura Cabo-Verdiana" se encontra em curso. Esta reflexão crítica de leitura do manual incide sobre três tópicos: i) Questões Linguísticas; ii. Questões Pedagógico-Didáticas e iii. Questões de Política de Língua.

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  • Informação, 12 de Abr de 2025

    6. Os participantes da Reunião Ordinária, de 5 de Abril de 2025, da Assembleia da lamentaram profundamente que, na elaboração do "Manual de Língua e Cultura Cabo-Verdiana", se tenha completamente ignorado o estipulado no Decreto-Lei nº 28/2022, que cria a disciplina de língua cabo-verdiana no 10º ano de escolaridade e determina que a presente fase deve ser considerada como de didatização do ensino da língua materna cabo-verdiana, sendo.

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  • Informação, 12 de Abr de 2025

    5. o mesmo ensino se deve processar na variante da língua materna cabo-verdiana de cada ilha e no alfabeto oficial da língua cabo-verdiana que é o Alfabeto Unificado para a Escrita do Cabo-Verdiano (ALUPEC).

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  • Informação, 12 de Abr de 2025

    4. Pelo contrário, e contrariando o Decreto-Lei acima referido, decidiu-se avançar para a padronização da língua materna cabo-verdiana mediante a adoção de uma variante/variedade, denominada “crioulo interdialetal”, inexistente até agora, quer na forma escrita, quer ainda na forma oral, pois que não utilizado por nenhum escritor, escriba e/ou escrevente em e/ou de língua cabo-verdiana e por nenhuma população e/ou comunidade de língua cabo-verdiana,

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  • Informação, 12 de Abr de 2025

    3. agravando-se, outrossim, a situação com a grafia do mesmo “crioulo interdialetal” num alfabeto que, pretendendo ser uma atualização do ALUPEC, encerra e acarreta graves distorções do mesmo alfabeto e das bases da escrita da língua cabo-verdiana, constantes do diploma legal que outorga ao ALUPEC o estatuto de alfabeto oficial da língua cabo-verdiana.

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  • Informação, 12 de Abr de 2025

    2.Os participantes da Reunião expressam, em nome da mesma organização, as suas mais profundas e sérias reservas quanto à substância essencial do mesmo "Manual de Língua e da Cultura Cabo-Verdiana" e à tentativa, que consideram prematura, ínsita no mesmo manual, de padronização da língua materna cabo-verdiana.

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  • Informação, 12 de Abr de 2025

    1.Por isso, instam o Governo, os responsáveis do Ministério da Educação e do Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde a refletirem seriamente sobre o processo em curso da aprovação e da correlativa utilização do "Manual de Língua e de Cultura Cabo-Verdiana" e a ponderarem com urgência a possibilidade da sua suspensão imediata.

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  • JLT, 12 de Abr de 2025

    Esse texto não é nada, não rebate nada, é frouxo, pífio, nem consegue acusar com nomes à frente, como faz o autor do artigo principal, o poeta José Luiz Tavares. Goste-se ou não da forma contundente como ele aborda as questões, com crivo literário, ele não foge ao embate. De quantos podemos dizer o mesmo? Os trolls sem rosto não contam, mas o IP não mente. Mesmo na terra do Trump os apanhamos.

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  • Vera Duarte, 11 de Abr de 2025

    Parabéns à Equipa organizadora deste apelativo Manual LCV pela clareza e cientificidade deste esclarecimento, tornado necessário pela misoginia, bairrismo e baixeza de alguns dos comentários sobre ele expendidos...é de La Palisse que o caminho só se faz caminhando e este é o início de uma bela caminhada...muita força a TODAS!!!

    • Alexandre Honrado, 11 de Abr de 2025

      Esta é viva? Uma covarde, matrona de todos os esquemas culturais lamacentos deste país, que anda pelas caixas de comentários, por incapacidade de produzir uma única opinião válida em espaço público, mas sobretudo por covardia moral.
    • Lingua di Kau Berdi ka ta mori!, 11 de Abr de 2025

      Misoginia? E isso porque se critica uma aberração linguística, por uma banda que alienadas, deviam estar presas, pelo despilfarro de fundos públicos, repito, numa aberração, que o único propósito é evitar SUPOSTO domínio da língua matriz caboverdiana Santianguense! Nos lingua, nos alma, nos pátria!

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  • Bandeira e Pompa, 11 de Abr de 2025

    Esta equipa não tem nomes e categoria académica? Assumam a vossa responsabilidade para se saber quem está por trás da obra. Não se sintam pressionados nem tenham medo de atribuir paternidade ao trabalho. Qual é o problema?

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  • mrvadaz, 11 de Abr de 2025

    Já descarreguei e li o famoso manual: uma aberração completa. Não é muito inteligente inventar um manual escolar, ignorando por completo a maior variante falada no país. As Alices que se cuidem.

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