Cabe ao poder executivo definir os salários dos cargos públicos. O salário de cada cargo, em regra, deve basear-se nos conhecimentos exigidos pela função, complexidade das atividades desenvolvidas e responsabilidades pelas tarefas ou apresentação dos resultados exigidos;
A Administração Pública como entidade do Estado, cuja missão é a prestação de Serviço Público, deve assegurar a retenção dos seus quadros com base numa politica salarial equitativa, por forma a evitar fugas de quadros dentro da própria Administração Pública;
A discrepância salarial entre quadros comuns e privativos na Administração Pública tem sido objeto de critica ao longo de vários anos, entretanto, muito pouco se tem feito para estancar a situação.
O Quadro comum que em princípio era regra, passou a ser exceção, uma vez que com evoluir dos tempos, associado às politicas salariais mais atrativas praticadas nos chamados quadros privativos, a fuga de quadros no seio da Administração publica tornou-se uma realidade crescente entre os servidores públicos.
Em 2013, o Governo de então, ciente da necessidade de alterar o quadro existente, aprovou por Decreto-lei nº 9/2013 de 26 de fevereiro, o novo Plano de Cargos Carreiras Salários para os quadros comuns da Administração Pública, com intuito de manter o equilíbrio salarial entre os dois quadros.
Pelo menos, é o que ficou estampado no preâmbulo do referido Decreto-lei ao anunciar que, o propósito visado com a medida é, justamente, responder a um conjunto de situações de ineficiência na gestão de recursos humanos na Administração Pública e que “procura, num só tempo, racionalizar os processos, simplificar os procedimentos e dar respostas tanto das organizações como os indivíduos”;
Por outro lado, considera que a proliferação de quadros privativos não tem fundamentos sólidos, já que a quantidade de quadros privativos na Administração Pública tornou-se bem superior a dos quadros comuns, ademais, criando situações de uma enorme discrepância salarial entre quadro privativos e comuns, com a agravante ainda de mesmo entre os quadros privativos, não existir paridade salarial;
Todavia, na nossa opinião, as boas intenções manifestadas no preâmbulo do Decreto-lei em referência, não terão efeito prático, designadamente através do imprescindível aumento salarial para o pessoal do quadro comum. Basta que se consulte os anexos 1-A e 1-B, partes integrantes desse dispositivo legal, para se concluir que não houve aumentos salariais para minimizar tal discrepância, e que a resolução de problema de paridade salarial entre os quadros privativos ficou, uma vez mais, adiada.
Efetivamente, o que houve é o alargamento do desenvolvimento de carreiras, de tal ordem que tornou ainda mais desmotivante, para quem inicia e deseja continuar a sua carreira no quadro comum., Ou seja, se um jovem, recém formado, se ingressar na carreira da Administração Pública mesmos nas condições em que haja concursos internos regulares e tenha obtido resultados excelentes (Avaliação de Desempenho, e outros requisitos estabelecidos), fica condenado a atingir a idade de aposentação sem alcançar o topo da Carreira..
Da pesquisa que fizemos, de 2013 a 2021, foram implementados mais de uma dezena de Planos de Cargos Carreiras e Salários, com politicas salariais diferenciadas, o que veio agudizar ainda mais tais discrepâncias salariais entre quadros comuns e privativos;
Uma situação, de resto, injusta e desmotivadora e que empurra um numero expressivo de cidadãos a ter que se submeter a situações de injustiça impostas por um quadro legal que trata servidores do Estado de forma desigual, apesar de serem titulares dos mesmos direitos (detentores dos requisitos, enquanto servidores públicos, para ingressarem em qualquer dos quadros, comum ou privativo).
Naturalmente que há tarefas cujo grau de complexidade é maior e, por conseguinte, justificam salários diferenciados, mas é preciso que sejam instituídas balizas claras e que haja rigor na fiscalização dos atos administrativos, para evitar arbitrariedades na definição de politicas salariais setoriais.
O quadro que ora se apresenta demonstra com clarividência as discrepâncias salariais existentes na Administração pública,
Para não ser extensivo tomou -se em devida conta, apenas as categorias de ingresso nos três grupos de categoria profissional a saber:
Pessoal de Apoio operacional de Nível I,
Pessoal Assistente Técnico de Nível I
Pessoal Técnico de Nível I
O perfil profissional para ingresso de cada uma das categorias profissionais acima referenciados é o mesmo, entretanto, a política remuneratória é dispara, conforme espelha o quadro.
Como se pode verificar as discrepâncias salariais na Administração Pública são abismais, razão pela qual a massa salarial na Administração Pública aumentou significativamente nos últimos anos;
Entretanto, conforta-nos saber que existe um anteprojeto de uma Nova lei de Base de Emprego Público, que poderá alterar a realidade descrita no presente artigo. Estamos em crer que o poder executivo irá tomar medidas de politicas assertivas, para por cobro à essa situação, que tem gerado muita desmotivação no seio da Administração Pública, criando condições objetivas para o recrutamento e manutenção de pessoal técnico qualificado susceptível de assegurar a continuidade de politicas publicas definidas, independentemente do partido que sustenta o governo;
É inquestionável que na Administração Pública Cabo-verdiana há muita descontinuidade na implementação de políticas publicas, tanto na área de recursos humanos como noutras áreas e convém ressaltar, que a área de recursos humanos tem sido das mais afetadas;
Essas descontinuidades devem-se muito à mudança de Governos e de instabilidade nas nomeações dos dirigentes superiores, contratados fora de Administração publica e que no fim do mandato regressam aos seus serviços de origem, provocando por vezes ruturas na implementação de politicas públicas.
A Administração Pública não pode continuar refém dessas situações criadas pelos sucessivos governos. A implementação de Carreiras de Administradores Públicos aprovado por decreto lei nº24/2005, de 11 de abril, não inibe as nomeações de Diretores Gerais razão pela qual não se entende, o que está subjacente ao sucessivo adiamento da implementação de Carreira de Administradores Públicos;
Os Partidos Políticos com assento parlamentar deveriam trazer esse tema para a centralidade do debate, com vista a calendarização da sua implementação, para o bem de Cabo Verde.
Praia, 21 de março de 2022
Comentários