Cabo Verde tem mostrado que é possível progredir mesmo com recursos limitados. O Dia Internacional dos Direitos Humanos deve servir como um lembrete de que os avanços alcançados são motivo de orgulho, mas também de que os desafios que permanecem precisam inspirar uma ação coletiva. Que sejamos todos agentes de mudança, comprometidos com um futuro onde os direitos humanos sejam verdadeiramente universais e acessíveis a todos os cabo-verdianos.
O Dia Internacional dos Direitos Humanos, comemorado no dia 10 de dezembro passado, foi uma oportunidade para refletirmos sobre os progressos e os desafios que Cabo Verde enfrenta na promoção da dignidade e dos direitos fundamentais de todos os seus cidadãos. Apesar de reconhecidos avanços, há uma crescente perceção pública de que o país enfrenta sérios desafios em áreas-chave, como economia, segurança e inclusão social.
Avanços reconhecidos
Cabo Verde é frequentemente apontado como um exemplo de estabilidade democrática e avanço social em África. O acesso ampliado à educação e à saúde, a consolidação da igualdade de género e a proteção da infância são resultados de políticas que promovem o desenvolvimento humano. O país também se destaca no cenário internacional, tendo ratificado quase todas as convenções regionais e internacionais de direitos humanos e participado ativamente em organizações como a CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) e a CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa).
Esses avanços são fruto de esforços conjuntos entre governos, sociedade civil e cidadãos, que trabalharam arduamente para construir uma nação mais inclusiva e igualitária. Contudo, não podemos ignorar os desafios persistentes que ameaçam comprometer esses ganhos.
Os Desafios Persistentes
Apesar dos avanços, pesquisas recentes, como a do Afrobarometer, revelam uma insatisfação crescente dos cabo-verdianos com a gestão do Governo em diversas áreas. Cerca de 91% dos cidadãos avaliam negativamente o desempenho no combate à inflação, enquanto 83% acreditam que o Governo vai mal no combate à criminalidade. Problemas como corrupção, acesso insuficiente à água potável e saneamento, e a incapacidade de criar empregos são apontados como áreas críticas.
O desemprego é, desde 2002, considerado o principal problema do país, citado por 55% dos entrevistados. Esse desafio é seguido pela preocupação com a saúde (51%) e com o crime e a segurança (48%). Além disso, as disparidades entre zonas urbanas e rurais continuam a limitar o acesso a serviços básicos para muitas famílias.
A emergência climática também representa uma ameaça crescente, colocando em risco os direitos das populações mais vulneráveis. Como nação insular, Cabo Verde enfrenta os impactos diretos das mudanças climáticas, que exigem soluções sustentáveis para garantir a segurança alimentar e o acesso a recursos essenciais.
A nível internacional e regional, Cabo Verde ratificou praticamente todas as convenções e tratados. No entanto, o país enfrenta diversos desafios para implementar plenamente os princípios e obrigações estabelecidos nesses instrumentos. Dentre eles, destacam-se:
a) Limitações institucionais e capacidades técnicas na implementação efetiva das convenções e monitoramento e relatórios que exige instituições fortes, bem equipadas e com pessoal capacitado. Cabo Verde enfrenta dificuldades relacionadas a recursos financeiros limitados e escassez de especialistas em direitos humanos. Não obstante o esforço do Governo, nomeadamente, com a criação da Comissão Interministerial para a Elaboração dos Relatórios, persistem limitações em termos de recursos e capacidades técnicas. A preparação de relatórios periódicos para os órgãos de tratados internacionais é complexa e demanda uma coordenação interinstitucional robusta. Recorde-se que Cabo Verde ratificou a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos em 2 de junho de 1987 tendo apresentado o seu primeiro e único relatório (relatório inicial) em 1996, abarcando o período 1987-1991. Em atraso, estão 13 relatórios;
b) Alinhamento com os instrumentos internacionais - apesar das ratificações, a adaptação das legislações nacionais aos padrões internacionais é bastante lenta. Algumas áreas, como o combate à violência baseada no gênero, a proteção de crianças e direitos das pessoas com deficiência, ainda requerem melhorias significativas na legislação e na sua aplicação prática;
c) Educação em Direitos Humanos, divulgação e sensibilização - muitos profissionais da justiça e outros setores-chave e a sociedade em geral, não têm conhecimento suficiente sobre os compromissos internacionais, o que dificulta sua aplicação. Por outro lado, existe a necessidade de maior conscientização pública sobre os direitos humanos e os compromissos assumidos internacionalmente;
d) Violência Baseada no Gênero - apesar de esforços, persistem desafios em lidar com a violência doméstica e outras formas de discriminação contra as mulheres, mesmo com instrumentos como a CEDAW - Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination Against Women (Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres) e o Protocolo de Maputo (Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos relativo aos direitos da Mulher);
e) Proteção das Crianças - a implementação do Protocolo Facultativo sobre a Venda de Crianças e Pornografia Infantil exige mecanismos mais eficazes de proteção, investigação e responsabilização;
f) Pessoas com Deficiência - apesar da ratificação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, barreiras institucionais ainda dificultam sua inclusão plena.
Uma Resposta Necessária
Para enfrentar esses desafios, é fundamental um compromisso renovado com a justiça social e os direitos humanos. O combate à pobreza e à desigualdade deve ser o centro das políticas públicas. Medidas eficazes para criar empregos, melhorar os serviços de saúde e educação, bem como combater a corrupção, são essenciais para restaurar a confiança dos cidadãos no governo.
A educação em direitos humanos também deve ser uma prioridade. Apenas através da conscientização e do empoderamento dos cidadãos poderemos construir uma sociedade onde cada indivíduo possa exercer plenamente os seus direitos. Nesse sentido, o papel das organizações da sociedade civil é indispensável. Elas devem continuar a monitorizar as ações do governo, denunciar abusos e promover boas práticas.
Conclusão
Cabo Verde tem mostrado que é possível progredir mesmo com recursos limitados. O Dia Internacional dos Direitos Humanos deve servir como um lembrete de que os avanços alcançados são motivo de orgulho, mas também de que os desafios que permanecem precisam inspirar uma ação coletiva. Que sejamos todos agentes de mudança, comprometidos com um futuro onde os direitos humanos sejam verdadeiramente universais e acessíveis a todos os cabo-verdianos.
*Licenciado em Gestão & Marketing e Mestre em Gestão de Empresas; Especialista em Mecanismos Regionais (Africanos) e Internacionais de Direitos Humanos
Comentários
Casimiro centeio, 20 de Dez de 2024
As nossas palavras não podem mudar o Mundo, mas a nossa atitude.
As melhores respostas relativas às nossas perguntas, serão encontradas no dicionário TEMPO!
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Casimiro centeio, 20 de Dez de 2024
Com o devido respeito pela opinião em apreço, mas em Cabo Verde não se pode/deve falar dessas "blasfémias" . O Dr. Amadeu Oliveira, está "apodrecendo" aos poucos entre as grades, sem que ninguém queira saber das acusações que fez publicamente contra os autores da Justiça desta terrinha ! Há tantas coisas absurdas irreconciliáveis com a doutrina do Estado de Direito Democrático que ninguém ousa tocar...
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