Os dois partidos da oposição cabo-verdiana acusaram hoje o Governo de falta de transparência e má gestão no contrato com a CV Interilhas, pedindo o resgate da concessão após decisão arbitral que condena o Estado ao pagamento de compensações.
"Trata-se de mais um caso que evidencia falta de transparência, má governação e total irresponsabilidade do Governo no que respeita ao contrato de concessão do serviço público de transporte marítimo interilhas celebrado com o grupo português ETE em 2019", afirmou o presidente da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID), João Santos Luís, numa conferência de imprensa.
João Santos Luís afirmou que o Estado deve avançar para o "resgate dessa concessão que lesa francamente o interesse público".
"O resgate é uma figura legal, legítima, que permite ao Estado pôr fim a uma concessão quando o interesse público está em causa ou quando há incumprimento contratual. Ambas as situações estão presentes neste caso", explicou.
O presidente da UCID criticou o contrato, dizendo que foi feito de forma "apressada, sem consulta pública ou diálogo alargado com os outros atores políticos".
"Foi um contrato com o grupo ETE, que até então não havia demonstrado capacidade comprovada para assegurar um serviço de transporte marítimo regular, eficiente e sustentável entre as nossas ilhas", apontou.
Revelou ainda que o partido remeteu, desde 2019, uma denúncia formal à Procuradoria-Geral da República, alertando para indícios de ilegalidades, falta de transparência e potenciais prejuízos para o erário público.
"Nem a procuradoria agiu, nem o Governo se designou a dar explicações ao parlamento ou ao povo. Desde então, temos assistido a um verdadeiro colapso operacional e estratégico. Agora estamos perante um escândalo, um litígio secreto entre o Estado e o grupo ETE, julgado no Tribunal Arbitral e sem qualquer informação ao parlamento e ao povo cabo-verdiano", sublinhou.
O deputado do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), João do Carmo, considerou que o "país está perante um escândalo" e que a decisão do Tribunal Arbitral, que condenou o Estado a pagar milhões de euros à CV Interilhas, é um "retrato devastador da irresponsabilidade, opacidade e submissão política".
"O PAICV exige a suspensão imediata de qualquer compensação futura enquanto não forem apuradas todas as responsabilidades e avaliado o verdadeiro impacto financeiro da concessão", afirmou.
Além disso, defendeu um novo modelo de transporte marítimo "de base nacional, eficiente e sustentável, com forte regulação pública e participação ativa das comunidades insulares".
"Cabo Verde não pode continuar a ser governado de improviso, propaganda e clientelismo. O país precisa de transparência, seriedade e visão de futuro", apontou.
Na quinta-feira, o Governo anunciou que vai recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça para anular a decisão arbitral que condena o Estado ao pagamento de compensações à CV Interilhas, concessionária dos transportes marítimos domésticos em Cabo Verde.
A contestação surge quatro dias depois de a CV Interilhas ter anunciado um investimento de 19 milhões de euros na aquisição de navios, justificando a aplicação da verba com uma "decisão arbitral favorável" que reconheceu montantes em dívida por parte do Estado, acumulados desde 2021.
A CV Interilhas é uma sociedade constituída em 2019 com a qual o Governo de Cabo Verde estabeleceu um contrato de concessão, por 20 anos, para o serviço público de transporte marítimo de passageiros e carga entre ilhas.
A empresa faz ligações marítimas entre as ilhas de Cabo Verde com uma frota de quatro navios.
A firma é liderada pelo grupo português ETE, que detém 51% do capital social (através das suas participadas Transinsular e Transinsular Cabo Verde), cabendo o restante a 11 firmas cabo-verdianas.
Em Cabo Verde, o Grupo ETE conta com uma área de aproximadamente 4.000 metros quadrados de armazenagem coberta, incluindo áreas de temperatura controlada, estando presente nas principais ilhas.
Detido exclusivamente por capitais portugueses, o grupo ETE tem operações próprias em nove países, emprega mais de 1.330 colaboradores e gera um volume de negócios anual superior a 325 milhões de euros.
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A equipa do Santiago Magazine