O presidente da República acaba de decretar o estado de Emergência em todo o território nacional para os próximos 20 dias (0h00 de hoje a 17 de Abril), o que acontece pela primeira vez na história do Cabo Verde democrático. A medida restritiva dá ao governo poderes para, por exemplo, proibir a livre circulação, a emigração, o culto religioso, o direito do trabalho e dos trabalhadores e até encerrar empresas. “Um teste à solidez da nossa democracia”, admitiu Jorge Carlos Fonseca.
Como já estava previsto, o presidente da República decretou hoje, por volta das 13h00, o Estado de Emergência a todo o país a partir das 00h00 deste sábado para domingo até às 00h00 do dia 17 de Abril.
O decreto-presidencial já foi encaminhado para publicação imediata no Boletim Oficial, a partir do qual caberá ao Governo a execução prática desta medida de excepção constitucional decretada pelo Chefe de Estado.
Jorge Carlos Fonseca, na sua declaração ao país, admitiu que foi uma decisão difícil e que nunca imaginou ser ele um dia a decretar o Estado de excepção em Cabo Verde, mas ajuntou que tal foi possível após auscultar os partidos políticos, confissões religiosas, governo e a Assembleia Nacional, que autorizou esta medida que acaba por renunciar temporariamente a bens essenciais ao exercício da democracia.
«O Estado de Emergência é um precedente que apresenta riscos à nossa democracia, mas não haverá nenhum apagão da democracia e do estado de direito. A democracia vai continuar, só que com algumas limitações a certos direitos»
O chefe de Estado justificou esta decisão, que retira alguns direitos aos cidadãos, com a necessidade de munir o governo de um instrumento constitucional que lhe permita melhor actuar no combate ao Covid-19, restringindo, com mais força, a circulação e aglomeração de pessoas.
“Pelos elevados riscos que a doença acarreta, somos convocados a realizar esforços de grande envergadura, que implicam entrega total, sacrifícios importantes, como a renúncia temporária de bens essenciais ao exercício da nossa cidadania democrática plena. Pela primeira vez na nossa história somos obrigados, em defesa da vida, da saúde e do bem-estar das pessoas e da nossa sociedade, a utilizar um instrumento previsto na Constituição da República, que é a declaração do Estado de Emergência”, começou por afirmar o presidente da República.
“Não duvido que a situação em que vivemos, com uma pandemia com grande potencial de disseminação e de destruição de vidas, de saúde e de economia, configura um quadro excepcional, que deve impor medidas excepcionais. Assim, após profunda reflexão, da auscultação de amplos sectores da sociedade, de consultar o Conselho da República e de ouvir o Governo e obter a autorização da Assembleia Nacional, na qualidade de presidente da República, tomei em consciência e com pleno sentido de responsabilidade a decisão de declarar o estado de Emergência e o decretar em todo o território nacional”, anunciou o chefe de Estado.
«O governo pode proibir a actividade de certas empresas no geral ou que integre determinados sectores, pôr limitações às actividades das empresas, e até requisitar serviços a empresas privadas, além de mandar encerrar empresas. A liberdade de culto é outro direito que pode ser suspenso»
Para saber mais ao detalhe como irá funcionar este Estado de Emergência preparamos um explicador, em que quem responde é o próprio presidente da República. Veja aqui nas Perguntas & Respostas:
E agora, o que vai mudar na prática com a declaração do Estado de Emergência?
Para já, trata-se de uma medida que vai implicar directamente no direito de todos à circulação, emigração, culto religioso, direito ao trabalho e direito dos trabalhadores, assim como mexer com o direito à propriedade e iniciativa económica privada, direito a reuniões, manifestações e greve.
“Isto também é um teste à nossa democracia, à solidez das nossas convicções democráticas. O Estado de Emergência é um precedente que apresenta riscos à nossa democracia, mas nós todos temos de estar cientes de que a partir da meia-noite de hoje não haverá nenhum apagão da democracia e do estado de direito. A democracia vai continuar, só que com algumas limitações a certos direitos, em função de uma ameaça de uma calamidade pública. Temos de estar todos atentos, ouvir as recomendações, cumprir as recomendações…”, explicou o presidente da República, sublinhando tomou essa decisão “com elevado sentido de responsabilidade, conhecendo os riscos, mas a consciência perfeita de que isto era importante e decisivo para vencermos esta epidemia do Coronavírus em Cabo Verde”.
“Vamos estar num estado de emergência com restrições de direitos, aqueles que estão no decreto presidencial, mas, de resto, tudo funciona, o direito à vida, à liberdade física, à liberdade de consciência, à liberdade de religião, à liberdade de informação, liberdade de imprensa…”
Quem irá aplicar estas medidas?
“A execução do estado de Emergência é da responsabilidade do Governo, ainda que o próprio decreto-presidencial preveja que o Executivo deve informar em permanência o presidente da República e a Assembleria Nacional das medidas que irá adoptar”, disse Jorge Carlos Fonseca.
Que liberdades concretas estão em causa?
“O decreto define claramente os direitos e as medidas que podem ser adoptadas no Estado de Emergência: por exemplo, em relação ao direito de liberdade, inclui o direito à deslocação, o direito à emigração, o direito à circulação nacional e internacional de pessoas. O Governo pode proibir viagens nacionais e internacionais, de qualquer meio aéreo, terrestre ou marítimo; o decreto pode implicar o confinamento compulsivo no domicílio, quarentena domiciliar obrigatória, num estabelecimento de saúde ou num lugar previamente definido pelas autoridades de saúde, que pode ser um hotel ou num hospital de campanha… Isto quer dizer que o estado de emergência vem garantir ao Governo, com clareza e segurança, adoptar medidas com uma capacidade de convencimento mais forte”, informa JCF.
Isso significa quarentena obrigatória a todos?
O PR explica: “Até agora têm sido recomendações e conselhos, e seria bom que todos os cidadãos acatassem as medidas, como confinamento no domicilio ou proibição de circulação entre as ilhas por meios marítimos, por exemplo. O Estado de emergência vem permitir que o Governo, não havendo adesão voluntária de um ou de outro, possa impor coercivamente essas medidas, nomeadamente a chamada quarentena obrigatória. O governo pode também proibir a actividade de certas empresas no geral ou que integre determinados sectores, pôr limitações às actividades das empresas, e até requisitar serviços a empresas privadas (um hotel, por exemplo). Há ainda a possibilidade de mandar encerrar empresas. A liberdade de culto é outro direito que pode ser suspenso, porque implica aglomeração de pessoas”.
Todos os direitos são afectados?
Não, apenas os referidos pelo decreto-presidencial. “O importante é que os cabo-verdianos percebam isto: nenhum direito ou liberdade que a Constituição confere a cada um pode ser suspenso, a não ser nos casos indicados pelo decreto presidencial do estado de Emergência. Simplesmente o presidente da Republica deu ao governo, dentro das balizas definidas, aplicar medidas mais fortes. Nenhum direito que não estiver aqui mencionado pode ser suspenso por qualquer autoridade, nem governo nem qualquer outra autoridade”, garante o presidente da República.
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