O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e investigador guineense João José “Huco” Monteiro considera que as contradições entre os guineenses exploradas pelos colonialistas portugueses resultaram no homicídio de Amílcar Cabral em 20 de janeiro de 1973..
Numa retrospetiva daquilo que foi o processo histórico da Guiné-Bissau, para assinalar o 50.º aniversário do assassinato de Amílcar Cabral, na Guiné-Conacri, “Huco” Monteiro explicou que enquanto Cabral defendia uma rotura total com o colonialismo, alguns nacionalistas advogavam por mais acesso dos nativos à sociedade colonial.
Cabral queria a independência da Guiné e Cabo Verde, na base de unidade entre dois territórios sob a direção de um mesmo movimento de libertação, uma ideia que, notou Monteiro, também não era aceite.
“As pessoas achavam que a perspetiva de unidade era uma forma de legitimação da dominação dos cabo-verdianos. Não era a perspetiva do Amílcar, mas as pessoas desconfiavam, até porque Amílcar dizia sempre 'eles (os nativos da Guiné) até não estão contra mim estão é contra os outros naturais de Cabo Verde'”, explicou o também sociólogo.
“Huco” Monteiro afirmou que Amílcar Cabral, apesar de pertencer à elite cabo-verdiana, conviveu, no seu regresso à Guiné, nos anos 1950, com “alguns notáveis guineenses” e a envolver-se socialmente.
Aquele posicionamento fez como que Amílcar Cabral fosse aceite pelos guineenses, ao contrário de outros originários de Cabo Verde, na altura “a nata” da administração pública, referiu “Huco” Monteiro.
“Era bem especial, era diferente. Mas havia sempre essa contradição. É na base dessa contradição explorada pelos portugueses, instrumentalizada pelos portugueses, que levou ao assassinato de Amílcar Cabral”, observou o também investigador do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP).
Assumido “Cabralista”, designação não oficial que é dada a alguém que estuda e pratica o ideário de Amílcar Cabral, “Huco” Monteiro compreende toda a dinâmica que levou ao assassinato do líder nacionalista, por ter ocorrido num momento em que estava iminente a proclamação da independência da Guiné-Bissau, notou.
“Amílcar Cabral disse no discurso no dia 1 de janeiro de 1973 que ele ia proclamar a independência da Guiné-Bissau. Portanto, é nesse momento que se deu todo o complot, toda a conspiração que levou à sua morte. Não morreu antes”, frisou Monteiro.
O investigador e atual dono da Universidade Colinas do Boé em Bissau não tem dúvidas em afirmar que “os portugueses se aproveitaram das contradições” motivadas pelo projeto de Cabral de unidade entre a Guiné e Cabo Verde e a iminência da independência da Guiné para “conspirarem à favor do seu assassinato”.
“Huco” Monteiro defendeu ainda que a Guiné-Bissau “está hoje como está” porque ocorreram desvios no projeto pensado por Amílcar Cabral.
“A independência da Guiné só tinha sentido na forma como foi sonhada por Amílcar Cabral. Amílcar morreu e nós perdemos completamente”, concluiu Monteiro.
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