A Ordem dos Advogados de África, que representa 100.000 profissionais africanos, pediu hoje a Cabo Verde para “libertar imediatamente” Alex Saab, considerado pelos Estados Unidos da América (EUA) testa-de-ferro do Presidente Nicolás Maduro, ameaçando pedir sanções internacionais ao arquipélago.
Em comunicado a que a Lusa teve acesso, a organização, fundada em 1971 e com sede na Nigéria, classifica a situação envolvendo o empresário colombiano Alex Saab, detido em Cabo Verde desde junho de 2020, quando viajava com passaporte diplomático venezuelano, enquanto “defensores e guardiães do estado de Direito” na Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e no continente africano, como “embaraçosa”, por “violar” o direito internacional, dado que possui “imunidade e inviolabilidade” devido ao seu estatuto de “enviado especial” do Governo da Venezuela.
“Assim, aconselhamos o Governo de Cabo Verde a seguir a linha da legalidade, respeitar o Estado de direito e libertar imediatamente o senhor Alex Saab para continuar com a sua missão legítima. Se Cabo Verde não seguir este caminho de legalidade, a Ordem dos Advogados de África pode ser obrigada a exigir sanções abrangentes contra o país por parte da CEDEAO, da UA [União Africana] e da ONU”, lê-se no comunicado.
Acrescentando a necessidade de defender a “tão estimada posição não-alinhada da África” - tratando-se de um conflito entre os EUA e a Venezuela, com centro de disputa em Cabo Verde -, a Ordem dos Advogados de África “apela ao presidente da Comissão da União Africana a tomar medidas imediatas para assegurar que os privilégios diplomáticos dos diplomatas africanos não sejam postos em perigo”.
“Uma vez que o embaixador Saab, um diplomata acreditado junto da União Africana [desde dezembro último], está atualmente detido num país africano, Cabo Verde”, sublinha o comunicado.
Alex Saab, de 49 anos, foi detido em 12 de junho pela Interpol e pelas autoridades cabo-verdianas, durante uma escala técnica no Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, na ilha do Sal, com base num mandado de captura internacional emitido pelos EUA, quando regressava de uma viagem ao Irão em representação da Venezuela, na qualidade de “enviado especial”.
O Tribunal da Relação do Barlavento, na ilha de São Vicente, já decidiu por duas vezes – a última das quais em janeiro, ambas com recurso da defesa – pela extradição de Alex Saab para os EUA.
O Governo da Venezuela exige a libertação de Alex Saab, garantindo que aquando da detenção no Sal, possuía imunidade diplomática, pelo que Cabo Verde não podia ter permitido este processo.
Contudo, e como alega a defesa de Alex Saab, liderada pelo antigo juiz espanhol Baltasar Garzón, a Ordem dos Advogados de África reconhece que no momento da detenção “não tinha sido emitido qualquer alerta vermelho” pela Interpol, o que só aconteceu “no dia seguinte”, 13 de junho, e que “nem no dia da sua detenção, nem nos oito meses seguintes”, foi fornecida à defesa do empresário colombiano “qualquer prova do mandado de detenção de apoio emitido pelos Estados Unidos”.
“O alerta vermelho foi cancelado a 25 de junho de 2020, mas Cabo Verde continuou a deter ilegalmente o embaixador Saab até que um pedido de extradição dos Estados Unidos chegou uma semana mais tarde. O pedido de extradição, que tinha as três primeiras páginas em falta, continha uma cópia do mandado de detenção emitido em nome de outra pessoa e não do embaixador Saab”, afirma ainda a organização, recordando que aquando da detenção, o diplomata comprovou junto das autoridades cabo-verdianas a sua condição de "enviado especial".
Na posição divulgada hoje, a Ordem dos Advogados de África critica ainda o Governo cabo-verdiano por ter assumido que não reconhece o Tribunal de Justiça da CEDEAO, ao não ter ratificado a adesão de Cabo Verde, o qual já emitiu decisões favoráveis a Alex Saab.
No comunicado, assinado pelo presidente da Ordem dos Advogados de África, Hannibal Uwaifo, a organização afirma também que o “comportamento ilegal do Governo cabo-verdiano pode não só desacreditar a CEDEAO e a UA”, mas “também abrir o caminho para os grandes países violarem o estatuto diplomático” de diplomatas africanos “por pretextos frágeis ou por conveniência política”.
“Esta situação inaceitável pode também encorajar outros países da CEDEAO e da UA a sucumbir a pressões ilegais, violar os protocolos e tratados da CEDEAO e a Convenção de Genebra. Isto, por sua vez, conduzirá ao caos e a uma quebra total da nossa tão acarinhada coesão como grupo sub-regional”, aponta a organização, no comunicado.
Por ter ultrapassado o prazo legal de prisão preventiva, o empresário colombiano foi colocado em prisão domiciliária no final de janeiro, mas sob fortes medidas de segurança.
Neste processo, os EUA, que pedem a extradição do colombiano, acusam Alex Saab de ter branqueado 350 milhões de dólares (295 milhões de euros) para pagar atos de corrupção do Presidente venezuelano, através do sistema financeiro norte-americano.
Em entrevista por escrito à Lusa, a partir da cadeia, em 08 de janeiro, o colombiano afirmou que é “inocente” das acusações dos EUA, classificando como “ridículo” que seja apontado como testa-de-ferro de Nicolás Maduro.
“Posso dizer categoricamente: sim, sou inocente”, afirmou Alex Saab.
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