O Tribunal de Contas detectou ilegalidades e irregularidades nas contas do Fundo do Ambiente e decidiu enviar o processo ao Ministério Público por suspeita de crime.
O polémico caso do Fundo do Ambiente, despoletado desde 2014, já tem decisão do Tribunal de Contas. O dossier, segundo o relatório do TC, feito no dioa 18 de Outubro último (confira neste link), vai parar ao Ministério Público para investigar eventuais casos de corrupção que terão ocorrido na gestão do Fundo do Ambiente nos anos 2012, 2013 e 2014 e que podem "merecer matéria de foro criminal".
O despacho do TC diz que "registam-se falhas de natureza diversa na tramitação dos processos financiados pelo FA configurando eventuais ilegalidades/irregularidades passíveis de responsabilidade financeira sancionatória e/ou reintegratória, nos termos dos art.º 35º e n.º 1 do art.º 36º da Lei nº 84/IV/93, de 12 de julho. Registam-se despesas no montante de 251.319.026$00, os quais os justificativos não chegaram a ser remetidos ao TC. Na ausência dos documentos justificativos estamos perante um potencial desfalque que tanto pode ser alcance ou desvio de dinheiro, passível de responsabilidade reintegratória, ao abrigo do n.º 1 do art.º 36º da Lei 84/IV/93 de 12 de julho, sem prejuízo deste tribunal remeter o processo ao Ministério Público para apuramento de eventual responsabilidade criminal, daí ter determinado que os três relatórios sejam remetidos ao Ministério Público".
A decisão do tribunal de Contas é esta: "Os Juízes da 2ª Secção, em Conferência, face ao que antecede e nos termos da alínea d) do ponto 1 do art.º 78º da Lei nº 24/IX/2018, de 2 de fevereiro que Regula a organização, a composição, o processo de funcionamento do Tribunal de Contas, deliberam: Não homologar a conta de gerência do Fundo de Ambiente, referente ao ano económico de 2014, objeto de verificação interna, por esta não respeitar os pressupostos estabelecidos no Decreto-Regulamentar 3/2012 de 12 de fevereiro, existindo muitas ilegalidades/ irregularidades suscetíveis de responsabilidade financeiras e potenciais outras ilegalidades que não foram esclarecidas e que podem consubstanciar-se em matéria de foro criminal. Ordenar: que o presente relatório seja remetido ao Ministério Público nos termos dos nºs 2 e º 6 do artigo 114º da Lei nº24/IX/2018, de 2 de fevereiro; Remeter uma cópia ao a) Ao Fundo do Ambiente; b) Ao Ministro da Agricultura; c) Ao Ministro das Finanças; d) Após notificação aos responsáveis citados no processo, se proceda à respetiva divulgação via internet, conforme previsto na alínea d) número 3 do artigo 10º da Lei nº 24/IX/2018, de 2 de fevereiro; e) Fixar o pagamento de emolumentos, conforme constante do processo".
O relatório referente ao ano 2013 observa que "tendo por base os dados recolhidos da Conta Geral do Estado de 20132 o valor das receitas arrecadadas da cobrança da Taxa Ecologia ascendeu a 570.875.097$00, montante que deveria ser transferido na totalidade para o Fundo. Porém, os dados da conta de gerência e do extrato da conta do Tesouro indicam que, em 2013, o Tesouro transferiu para o Fundo o valor de 242.649.002$00. Esta quantia encontra-se muito aquém do valor a transferir se atendermos que só da Taxa Ecológica o Fundo deveria receber 570.875.097$00, sem levar em consideração eventuais receitas provenientes de outras fontes. Cabe salientar que o TC não se encontra em condições de aferir se o valor transferido pelo Tesouro (242.649.002$00), se refere exclusivamente à receita gerada pela cobrança da Taxa Ecológica ou se advém de outras receitas, por falta de informação, não obstante as várias tentativas feitas pela equipa, fato este que carece de clarificação pelos responsáveis do Fundo".
Na sua alegação perante o TC, o ex-responsável Moisés Borges disse que “(…) a tramitação e execução das despesas (SIC), no âmbito deste projeto, no valor correspondente a 242.649.002$00(…), ou seja 80,72% do montante inicialmente inscrito (…) acerca da diferença de valores entre aquilo que supostamente deveria ser alocado ao Fundo do Ambiente e o montante efetivamente disponibilizado pelo Tesouro no projeto de investimento “Fundo do Ambiente”, bem como as origens dos recursos, se provenientes só da taxa ecológica ou outras fontes, conforme indica o relatório, informamos que não dispomos de dados que permitam esclarecer esse assunto pois, nunca nos foi informado sobre a proveniência dos recursos alocados ao referido projeto”.
“Sendo a arbitragem dos recursos orçamentais, desde a sua fase de elaboração e aprovação até a sua execução, feita e seguida pelo pessoal do Ministério das Finanças, esta questão deverá ser esclarecida, se assim for entendido, pelos responsáveis do Ministério das Finanças, designadamente junto da Direção Nacional de Orçamento e Contabilidade Pública e da Direção Geral do Tesouro”, ajuntou Borges.
Por sua vez, o ex-Ministro do Ambiente, Habitação e Ordenamento do Território, Antero Veiga disse ao TC que “(…) por ser o FA uma conta que funcionou sempre no Tesouro o signatário não tinha como saber a origem das receitas, apesar de inúmeras vezes ter solicitado informações a respeito ao então Ministério das Finanças e Planeamento.”
O Tribunal de Contas, na sua apreciação, faz saber que "é do entendimento do TC que, apesar de o Tesouro desde 2013 ter emitido uma nota ao TC em que alega não ter condições informáticas para emitir certidões de receita, considera-se que estão reunidas as condições para, de forma isolada, aferir o real montante transferido ao FA tendo em consideração que se trata apenas das receitas provenientes da taxa ecológica, cuja entidade que arrecada de acordo com a Lei da taxa ecológica, a saber a Direção Geral das Alfândegas e Repartição das Finanças, tem todos os registos que mensalmente são enviados a este Tribunal".
"Portanto, e tendo em consideração a consignação da receita em questão, entende-se que o Tesouro deve ter todos os dados desta operação. A falta de colaboração da DGT com o TC constitui uma infração financeira passível de responsabilidade nos termos das disposições combinadas do n.º 1 do art.º 22º e alínea h) do n.º 1 do art.º 35º da Lei n.º 84/IV/93, de 12 de julho", considera o Tribunal de Contas.
São três relatórios (2012, 2013 e 2014), todos com a mesma decisão do Tribunal de Contas e assinados pelo juiz conselheiro (relator neste dossier) Claudino Maria Monteiro Semedo, e os juizes adjuntos José Maria Mendes Cardoso e Victor Manuel Varela Monteiro.
Foto: rtc
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