O co-fundador e membro sénior da AfroPsis – Plataforma de Psicólogos Afrodescendentes, Henda Vieira-Lopes, destacou que a comunidade negra, em Portugal, tem estado ainda mais afastada dos processos da saúde mental, por causa dos preconceitos.
Em declarações à Inforpress, no âmbito do Dia Mundial da Saúde Mental, assinalado hoje, e para falar da plataforma AfroPsis, o psicólogo explicou que a mesma surgiu há dois anos, com um grupo de seis profissionais negros, justamente por constatarem que na área da psicologia, a questão da negritude e da africanidade “nem sempre é considerada, sem falar do preconceito que a comunidade negra tem em relação à saúde mental”.
Segundo a mesma fonte, o AfroPsis, por não ser uma estrutura centralizada, muito do que faz relaciona-se com a criatividade e disponibilidade de cada um dos membros, sempre com foco na área clínica, com intervenção na parte comunitária.
“Nós temos servido de rede de apoio uns aos outros e em termos de especificidades somos abrangentes e o nosso critério é serem pessoas ou famílias negras. Embora nós saibamos que existe aqui em Portugal pouco investimento a nível da saúde mental, no geral, porque toda a gente precisa, temos sentido que a nossa comunidade negra tem estado ainda mais afastada dos processos da saúde mental, por causa dos preconceitos que existem, considerando que é coisa de branco”, explicou.
Henda Vieira-Lopes contou que muitas das sessões que a AfroPsis tem feito é para divulgar o que é a saúde mental, tentando desmitificar que “não é uma coisa para malucos”, tendo notado que os maiores desafios das pessoas negras em Portugal têm a ver com a depressão, que muitas vezes nem percebem disso, questões familiares, problemas de comunicação e questões ligadas a várias violações sistémicas que existe devido ao racismo.
“Embora as pessoas vêm com algumas queixas mais típicas, essa questão da ansiedade, conflitos e da depressão surgem com uma série de questões que as pessoas estão a passar, desde a crise económica, em que as pessoas mais carenciadas sofrem ainda mais os seus efeitos, sendo que muita da nossa comunidade encontra-se nessa linha, por causa da dificuldade de emprego, por causa do racismo e da discriminação que existem para a obtenção do emprego”, frisou.
Psicólogo há 23 anos e com uma clínica em Lisboa, a Yanda Psicologia, Henda Vieira-Lopes é convicto ao afirmar que “ser negro é um factor de stress”, estando ligado a questão do racismo, porque “é muito mais fácil uma pessoa negra ficar excluída, por não se rever também em algumas das políticas ou algumas das vivências de comunidade em Portugal”.
“O racismo é sistémico que de certa forma obriga a que as pessoas tenham que fazer um esforço extra e tenham menos recurso, e à partida vêm de locais mais desprivilegiados, para conseguirem aceder aos mesmo níveis de conforto, sucesso e viabilidade financeira que a comunidade branca. Com isso não quer dizer que não existem pessoas brancas em situação de grande carência, mas que ser negro acaba por ser um factor que pesa para irmos mais ao fundo”, esclareceu.
“Nós, da AfroPsis, queremos trazer uma forma de passar informação, de trabalhar esta negritude de forma harmónica, também com a sociedade ocidental onde vivemos, para que isso, em vez de ser uma menos-valia, seja uma mais-valia (…). Conseguir criar uma estrutura que possa ir ao encontro daquilo que são as nossas necessidades”, finalizou.
O psicólogo com dupla nacionalidade, nascido em Portugal, mas é de Angola, povo Ambundo de língua Kimbundu, sublinhou que agora já são cerca de 40 psicólogos na AfroPsis en Portugal, sobretudo da Área Metropolitana de Lisboa, de todos os Países Africamos de Língua Portuguesa (PALOP), mais Brasil.
O Dia Mundial da Saúde Mental este ano tem como tema “A Saúde Mental é um Direito Universal”.
A criação deste dia foi da iniciativa da Federação Mundial da Saúde Mental (FMSM), através do então secretário-geral, Richard Hunter, tendo sido pela primeira vez celebrado no ano de 1992.
Actualmente, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece e assinala também a data.
Comentários