Quando é que serão dados os devidos esclarecimentos sobre o Património Arqueológico Subaquático de Cabo Verde que foi pilhado e vendido em leilões e quando este será devolvido ao país?
Navio Leymuinden, foi encontrado em 1993 na ilha da Boavista.
Muitos dos achados foram vendidos num leilão na “Christie's” em Amsterdão
Para relembrar a história desde o início:
Enquanto Primeiro Ministro, Pedro Pires criou em 1984 um grupo de trabalho para discutir com as entidades interessadas em pesquisa subaquática.
Este grupo era presidido por Renato Cardoso (conselheiro do PM) e integrava o DG da Marinha e Portos, e representantes do Ministério dos Transportes e Comunicações, do Ministério da Educação e Cultura, e do Ministro dos Negócios Estrangeiros.
A Lei 48/II/84 consagra que "todos os achados e despojos históricos encontrados no fundo do mar territorial de Cabo Verde ou nas suas águas interiores ou arquipelágicas ou por estas arrojadas são propriedade do Estado.
Com a entrada do novo regime polipartidário em Cabo Verde, o novo governo assina um contrato com a Afrimar em 1993. Esta foi a primeira empresa a receber autorização para explorar arqueologicamente os destroços subaquáticos das águas territoriais de Cabo Verde.
A Afrimar, empresa de capital social Sul-Africana, teve licença para explorar três destroços de embarcações específicas: o Leymuiden, o Hartweel e o Santo André, nomeadamente, na zona de Rifona e do ilhéu do Cascalho, na ilha de Boavista.
As intervenções subaquáticas ocorreram entre 1993 e 1995, em três verões seguidos e foram realizados com o mínimo de rigor e exigência científica.
Com a insuficiente fiscalização, aconteceram VÁRIOS desvios de peças arqueológicas, e não se conhecem as circunstâncias e o rigor das escavações.
Em 1995, é assinado outro contrato com uma empresa de nacionalidade portuguesa, representada pelo Duque de Bragança D. Duarte Pio, a empresa Arqueonautas World Wide.
O governo de Cabo Verde, representado pelo Ministro do Estado e da Defesa Nacional, Dr. Úlpio Napoleão Fernandes, concede uma autorização à referida empresa, para exploração dos vários naufrágios e destroços no nosso mar.
Uma das cláusulas do contrato com a Arqueonautas, segundo o artigo de 16 de Novembro de 2001, publicado na revista Visão, diz que “as águas do arquipélago passaram a PERTENCER à empresa Arqueonautas, com base numa licença que prevê que, depois de subtraídos todos os custos da operação, o lucro de TUDO O QUE FOR ENCONTRADO, é DIVIDIDO entre as partes”.
Tanto a empresa Afrimar como a Arqueonautas, leiloaram muitas peças recuperadas nas águas de Cabo Verde.
16 de Abril de 2019, a Lusa publica um novo artigo sobre um investigador português que elaborou uma base de dados e Mapeamento dos navios naufragados.
Este investigador da Universidade Nova de Lisboa (UNL) e Consultor Técnico e Científico do Instituto do Património Cultural de Cabo Verde estudou os navios naufragados nas águas cabo-verdianas, tendo comprovado a existência de 150 das 300 embarcações que se estima estarem submersas.
Segundo ele, considerava que a exploração comercial do mar cabo-verdiano por empresas de caça ao tesouro, tinha sido “catastrófica”, e deu espaço a pilhagens legais, de dezenas de navios naufragados.
A 17 Abril de 2019 Abraão Vicente, falava aos jornalistas no final da cerimónia de abertura da V Jornada do Projeto Mergulhar, sobre conservação e proteção do meio ambiente e promoção da eficiência dos recursos, que decorreu no Centro Cultural da Cidade Velha, ilha de Santiago.
O Governante garantiu que até ao final do ano de 2019, seria revista e aprovada a lei que protege os tesouros subaquáticos do país, tendo em conta que a única legislação existente (102/3/90) não chegou a ser regulamentada.
Nas suas declarações à Agência Lusa, Abraão Vicente disse o seguinte:
"Queremos configurar todo o quadro jurídico antes de fazer qualquer conceção, garantindo que toda a composição de barcos que façam essa exploração, contenha a presença da Polícia Nacional, da Polícia Judiciária e Polícia Marítima, no sentido de garantir que todos os bens recuperados em águas territoriais cabo-verdianas regressem a território cabo-verdiano, o que não está a acontecer", disse.
E acrescentou: "Temos informações de pilhagens de barcos afundados na Boavista, no Maio, na costa da Praia e na Cidade Velha".
(…)
"Mas não temos a segurança jurídica que permite fazer com que não aconteça o que aconteceu com o astrolábio de ouro que foi leiloado em Londres SEM O NOSSO CONHECIMENTO e sem que disso tivéssemos benefício nenhum.”
A 22 de Abril de 2019, a empresa Arqueonautas envia uma nota de esclarecimento à agência Lusa, onde garante que nesse período descobriu e reportou às autoridades perto de 90 naufrágios.
O presidente do conselho de administração da Arqueonautas, Nikolaus Graf Sandizell, reagiu desta forma:
"Estamos a falar de uma intervenção arqueológica subaquática licenciada pelo Governo, com metodologias adequadas e instalações de conservação no local", sustenta.
"Todos os artefactos resgatados foram conservados e restaurados no Centro de Conservação e Museologia e a maioria do material cultural recuperado permaneceu na Cidade de Praia", prossegue o esclarecimento.
Segundo o administrador da Arqueonautas, "os poucos artefactos que puderam ser exportados foram vendidos publicamente em leilão, sendo as receitas usadas para a continuação das expedições de resgate e para a conversão do Centro de Conservação em um museu".
De acordo com Nikolaus Graf Sandizell, durante o período em que vigorou o acordo com o Governo de Cabo Verde (de 1995 a 2002), "a Arqueonautas descobriu e reportou às autoridades perto de 90 naufrágios, contemporâneos e históricos, em águas territoriais do país".
PERGUNTO:
Se, segundo a ICOMOS, “para que o património cultural subaquático nos ajude, no futuro, a compreender e apreciar o meio ambiente, devemos, desde já, assumir as nossas responsabilidades individuais e coletivas, para assegurarmos a sua sobrevivência. A arqueologia é uma atividade pública; todos têm direito a consultar o passado para enriquecer a sua própria vida, e qualquer esforço para limitar o conhecimento do passado representa um entrave à autonomia da pessoa humana. O património cultural subaquático contribui para a formação da identidade cultural e pode servir, numa comunidade, para reforçar o sentido de pertença, a cada um dos seus membros. Se for gerido com cuidado, o património cultural subaquático pode desempenhar um papel positivo na promoção de atividades de lazer e do turismo. A arqueologia fundamenta-se na pesquisa, a qual enriquece o conhecimento da diversidade da cultura humana através dos tempos e apresenta novas perspetivas relativamente à vida no passado. Tais conhecimentos e perspetivas ajudam-nos a compreender a vida contemporânea permitindo-nos antecipar os futuros desafios. Numerosas atividades subaquáticas são, por si só, benéficas e desejáveis, mas podem ter consequências negativas para o património cultural subaquático, se os seus efeitos não forem atempadamente previstos.”
Quando é que serão dados os devidos esclarecimentos sobre o Património Arqueológico Subaquático de Cabo Verde que foi pilhado e vendido em leilões e quando este será devolvido ao país?
Comentários
Casimiro Centeio, 9 de Ago de 2024
Meus parabéns, Any Delgado, pelo inédito artigo.
Meus conhecimentos , em relação ao meu país, ficam mais ricos com a tua sábia contribuição.
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