Cabo Verde regista um aumento de Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC), enfartes, amputações em diabéticos e distúrbios emocionais devido ao afastamento dos serviços de saúde durante a pandemia de covid-19, disse à Lusa o bastonário da Ordem dos Médicos Cabo-Verdianos.
“As pessoas chegaram tarde, porque tinham medo de ir ao hospital”, disse Danielson Veiga, durante uma passagem por Lisboa, onde participou em sessões de formação cirúrgica e manteve contactos com parceiros da Ordem.
Este atraso na assistência médica e medicamentosa mostra agora o seu impacto na saúde, com um “aumento da mortalidade” resultante de mais casos de AVC, enfartes, agravamento de doenças crónicas, como quadros de hipertensão e diabetes, com as consequentes amputações.
A par destas doenças físicas, a pandemia aumentou os “distúrbios psicoemocionais”, bem como o consumo de álcool, com reflexos ao nível da violência, divórcios e descompensações emocionais.
“No serviço de psiquiatria, quase 90% dos doentes ficaram afetados e o serviço, de certa forma, teve de parar, porque os técnicos de saúde também ficaram afetados”, contou.
A pandemia de covid-19 teve “um impacto muito negativo em Cabo Verde, não só na vertente da saúde, como na economia. Mais de 600 mil pessoas foram afetadas, com 410 óbitos”, lamentou.
As consequências desta resposta de emergência ainda se estão a sentir, até porque “a pandemia ainda não acabou”: “Tivemos um grande atraso na marcação de consultas, sobretudo de doentes crónicos; as cirurgias também tiveram atrasos”.
O agravamento das condições de saúde também se deveu à falta de medicamentos, pois a sua venda dependia de receitas e estas de uma ida aos serviços de saúde, que diminuiu muito durante a pandemia.
Nesta “fase de recuperação”, Cabo Verde congratula-se com a forma como geriu a vacinação, constando do “top 10 dos países africanos com boa cobertura de vacinação”, observou o bastonário da Ordem dos Médicos Cabo-Verdianos, onde estão inscritos 650 profissionais, dos quais 400 no ativo.
A assistência médica em Cabo Verde conta com dois hospitais centrais e quatro regionais, sendo crónicas as dificuldades no acesso às ilhas que não dispõem destas estruturas.
“Há ilhas sem frequência regular de transporte e os doentes muitas vezes ficam retidos nas ilhas. Se alguém precisa de uma cesariana pode não ter acesso a um serviço de qualidade e se houver atraso pode ter fatalidade”, afirmou.
E adianta: “Já tivemos situações em que uma pessoa não foi diagnosticada a tempo com uma hemorragia interna numa das ilhas” e foi transportado de barco, acabando por morrer no caminho.
Os casos mais graves são atendidos via evacuação médica, sobretudo para Portugal, dependendo para isso de transporte aéreo, uma área em que Cabo Verde tem registado sucessivas dificuldades nos últimos tempos, agudizadas com a pandemia de covid-19.
Comentários