O Conselho Local da Cruz Vermelha em São Vicente demitiu-se esta semana, por incompatibilização com os responsáveis máximos da Cruz Vermelha de Cabo Verde, na Cidade da Praia.
Fonte da Cruz Vermelha em São Vicente, que pediu para não ser identificado, explicou à Inforpress que a renúncia dos dirigentes locais, aconteceu poucos dias após a tomada de posse do presidente da Cruz Vermelha de Cabo Verde (CVCV) que se recandidatou ao cargo.
Segundo a mesma fonte, o motivo para esta demissão tem a ver com os sucessivos “bloqueios, desautorizações e desrespeito” para com a estrutura local da Cruz Vermelha, em São Vicente, por parte dos funcionários na Cidade da Praia.
“Muitas coisas estão por detrás desta demissão. Um exemplo mais claro disso é que o presidente do Conselho Local quer realizar actividades e ele é bloqueado. Ele dá uma ordem e funcionários com apoio do Conselho Executivo e Administrativo na Praia contrariam a sua ordem quando os estatutos dizem que o presidente local tem autonomia porque é ele que conhece os problemas locais”, afirmou.
Conforme esta fonte, os problemas de desautorização do conselho local, que acontecem há muito tempo, são do conhecimento do presidente da CVCV que nada faz para pôr cobro a esta situação.
Acrescentou que a gota de água que fez transbordar o copo foi a “falta de respeito” para com o conselho local que “foi impedida de ter acesso ao link para assistir à tomada de posse” do presidente reeleito.
Além disso, também denunciou que o presidente da Cruz Vermelha de Cabo Verde foi “reeleito com base num novo estatuto que não tem respaldo legal”, porquanto “não seguiu os trâmites que deveria seguir”.
“O estatuto que tínhamos era de 1984. Para a aprovação do novo estatuto este deveria ser enviado à Cruz Vermelha Internacional, na Suíça, depois para o Presidente da República, em seguida para a Assembleia Nacional e só depois ser publicado no Boletim Oficial, mas não seguiu esses trâmites e a eleição do presidente foi feita com base no novo documento”, criticou ainda a fonte da Cruz Vermelha em São Vicente para quem “os novos estatutos foram feitos para silenciar os voluntários da CVCV”.
A mesma fonte classificou também o relatório de uma auditoria à Cruz Vermelha de Cabo Verde “vergonhoso”, dando como exemplo uma rubrica em que apontam “um valor de cerca de três mil contos para programas relacionados com a covid-19”, mas avançou, “no mesmo relatório não há como comprovar nem especifica se o montante foi usado e como foi usado”.
Por causa desses problemas, adiantou, além da demissão do Conselho Local, a maior parte dos mais de 100 voluntários da CVCV cadastrados na ilha de São Vicente entregou os coletes porque já não querem estar na instituição.
Contactada pela Inforpress, a presidente do Conselho Local da Cruz Vermelha em São Vicente, Romine Oliveira, disse que a demissão “é um assunto interno que deve ser tratado internamente”.
Também instado a reagir, secretário-geral da Cruz Vermelha de Cabo Verde, Salomão Furtado esclareceu que a renúncia é um direito que assiste a qualquer titular de cargo, tal como o direito de ser eleito, porém, não concorda com as alegações dos renunciantes, constantes da carta dirigida ao presidente da CVCV e, muito menos ainda, com as razões alegadas à Inforpress.
Sobre a alegada desautorização, o mesmo explicou que “os órgãos centrais da CVCV não só têm reconhecido a autonomia aos Conselhos Locais, como a vêm respeitando e reforçando, em conformidade com os estatutos e os princípios de separação de poderes entre os órgãos de governança e de gestão”.
Tal separação e articulação entre os poderes, reforçou, são extensivas a todos os Conselhos Locais dispersos pelas ilhas e municípios do País, entre a direção e respectivo órgão de gestão e administração.
Conforme Salomão Furtado, a razão da renúncia tem a ver, essencialmente, com a problemática da liderança local e não com a ausência da auditoria.
“A auditoria às contas da Cruz Vermelha de Cabo Verde são feitas anualmente por uma empresa de auditoria independente. Porém, sempre que necessário e fundamentado poder-se-á desenvolver mecanismos com vista à clarificação de situações e assumpção de responsabilidades, em todas as estruturas da CVCV”, adiantou.
O mesmo esclareceu que convidaram “a presidente do Conselho Local e os demais para a tomada de posse do presidente, vice-presidente e membros do Conselho Superior da CVCV”, que teve lugar nos dias 10 e 11 deste mês e que, “estando criadas todas as condições logísticas para viabilizar a sua participação presencial, não fazia sentido o envio do link para assistirem aos eventos”.
Sobre a denúncia de que os estatutos não tem respaldo legal, o secretário-geral da CVCV revelou que foram colhidos e socializados subsídios para a feitura de uma panóplia de diplomas jurídicos da CVCV, entre os quais os seus Estatutos, no Conselho Local em São Vicente, pelo que não acredita “que tenha sido manifestada tal desconfiança pela direcção”.
“De referir que a direcção do Conselho Local de São Vicente participou na discussão e aprovação dos estatutos e demais instrumentos jurídicos, em sede da Assembleia-Geral da CVCV”, reagiu Furtado desmentindo também a renúncia dos voluntários em São Vicente e da rubrica na auditoria que aponta a falta de justificativos para o gasto de três mil contos, alegadamente destinado a programas relacionadas com a covid-19.
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