TACV. Mas que silêncio é esse?!
Ponto de Vista

TACV. Mas que silêncio é esse?!

Passados esses anos, vários são os fiascos à volta da TACV, sendo visível o desnorte da operadora, cujo Conselho de Administração e tutela têm-se revelado incapazes de reestruturarem a empresa como prometido (o mandato do CA termina dentro de três meses) e incapazes de cumprirem com os compromissos financeiros, obrigações e exigências de natureza técnico-operacional que, por não supridas, deveriam ditar a suspensão de operações pela autoridade competente (AAC); uma operadora sem capacidade para controlar os custos muito menos a produtividade, ao mesmo tempo que vemos a concorrência aumentando a sua quota de mercado e dita regras do jogo, o que conjugado a outros fatores contribuem para colocar uma pressão insustentável sobre os balanços da TACV.

Depois do delírio inicial, ato contínuo à monumental e vertiginosa gabarolice, dos olés e brados dos nabos e strippers “toleradas” da net, naquilo que mais parecia ser um espetáculo tauromáquico provinciano bacoco...(!) , ultimamente esse silêncio tétrico dos governantes, gestores e claque organizada de hooligans travestidos de gurus de economia, é de facto muito intrigante! Chega a ser intimidante mesmo, atendendo à magnitude do que esteve, está e estará em causa, a enormidade dos valores que cada contribuinte é chamado a colocar nesse saco sem fundo da nossa perdição, e toda a charanga que era produzida à volta de cada passageiro transportado, ou aterragem desta ou aquela aeronave!

Isto tudo, uma vez mais, à propósito da TACV, já que evidente se tornou que os governantes e gestores, pretendem estender um manto de silêncio sobre este épico e calamitoso desaire pessoal do UCS, que é a reestruturação e privatização dessa empresa...

Na alternância verificada em 2016, o novo governo liderado por UCS, à semelhança que o então candidato tinha feito durante a campanha, fez muita publicidade à volta das suas opções para incrementar a mobilidade dos cabo-verdianos, quer internamente (transportes marítimos e aéreos) quer na nossa capacidade de vir e ir para o estrangeiro.

Garantiu-nos o UCS que, as frequências das transportadoras aéreas seriam maiores, as opções mais flexíveis, as rotas seriam diversificadas, abrangeriam os quatro continentes, as viagens seriam mais baratas; foi-nos garantido que, a partir de 2017/18, o Sal seria um hub-stopover processando mais de 7.000.000 de passageiros/ano, uma escala incontornável no Atlântico Médio, uma referência nos transportes aéreos na região africana; pela voz autorizada do Ti Gôy Gonçalves (para sempre nos nossos corações) foi-nos garantido que, Santo Antão teria um aeroporto internacional de porte médio (logo maior dos existentes no Sal, Boavista e São Vicente que são de pequeno porte) e que os voos noturnos internacionais passariam a ser possíveis na Boavista e SV, noturnos domésticos na Ilha do Fogo.

É evidente que, passados que foram esses sete (7!) anos o que temos de facto nos transportes aéreos, é uma mão cheia de retrocesso e desapontamento na nossa mobilidade, nas frequências, fiabilidade, patologias graves no sector, com ocorrências, números, ratios, desempenho vagabundeando nas ruas da amargura.

Passados esses anos, vários são os fiascos à volta da TACV, sendo visível o desnorte da operadora, cujo Conselho de Administração e tutela têm-se revelado incapazes de reestruturarem a empresa como prometido (o mandato do CA termina dentro de três meses) e incapazes de cumprirem com os compromissos financeiros, obrigações e exigências de natureza técnico-operacional que, por não supridas, deveriam ditar a suspensão de operações pela autoridade competente (AAC); uma operadora sem capacidade para controlar os custos muito menos a produtividade, ao mesmo tempo que vemos a concorrência aumentando a sua quota de mercado e dita regras do jogo, o que conjugado a outros fatores contribuem para colocar uma pressão insustentável sobre os balanços da TACV.

É de salientar que estamos numa conjuntura em que as agências internacionais que regulam o sector apontam para uma escassez de peças sobressalentes no mercado devido às sanções à Rússia, aliadas às redundâncias de sistemas existentes nas companhias (60% do titânio que é utilizado nos motores e peças vem da Rússia)

Ora, assim sendo, axiomático é que as microcompanhias marginais e falidas como a TACV, estão sob uma pressão e incapacidade de cumprir, dentre muitas obrigações, com os programas de manutenção normalizados! É que sendo a aviação predominantemente um negócio à vista, os preços exorbitantes de peças, escassez das mesmas, os altos custos operacionais (combustíveis e derivados do petróleo), desnorte corporativo, deixam a TACV num estrangulamento e poço de apreensões e incumprimentos insanáveis que o grade público, o comum do contribuinte e até políticos ao mais alto nível (ao mais alto nível) por causa da “iliteracia” aeronáutica predominante, normalmente não se apercebem.

No atual contexto de insolvência e incapacidade de cumprir com os seus compromissos, a TACV vem reduzindo o volume do treinamento, no rigor dos procedimentos e processos, nas atualizações, na manutenção, aquisição de peças, sistemas etc., não cumprindo com os mínimos estabelecidos para a segurança das operações, como aliás os próprios pilotos denunciaram pública e frontalmente. É preciso que se note e bom lembramos que, estudos levados à cabo na indústria concluem que a lucratividade das companhias aéreas está diretamente correlacionada com a segurança das mesmas. Companhias falidas devem ser inibidas de operar devido aos vários riscos que representam para o sector e negócios correlacionados (riscos financeiros, comerciais, segurança operacional).

A situação é grave, e as autoridades devem falar-nos a verdade, para sabermos a quantas andamos com esse falhanço colossal, essa embrulhada, também ela homérica! É uma obrigação, um dever moral da AAC, da TACV e o acionista estado que têm que esclarecer o país, os contribuintes.

Se apreensivos estávamos, aterrorizados ficamos quando colegas de outras latitudes e muito bem posicionados, acabaram de nos informar que a TACV estará negociando e quase concluindo a aquisição de dois Boeings 737-MAX 8... à revelia, mais uma vez, de estudos de frota adequados! Uma aeronave no imediato, a outra no máximo de 12 meses após a chegada da primeira (há uma penalização brutal em caso de desistência da segunda). A AAC, segundo consta, foi colocada à margem deste processo.

Pois bem, uma vez mais colocamos o foco numa tipologia de aeronaves ( à semelhança do famigerado Plano “B” para os transportes marítimos do nosso renomado “Beyoncê”) , sem termos em conta outras dimensões do negócio e da planificação, bem como pressupostos que se não atendidos e equacionados, não haverá frota que resista, senão vejamos:

a) A TACV não tem certificado ETOPS, não tem certificado FAR 129 e por incumprimentos vários com empresas fornecedoras de serviços, aeroportos e autoridades dos EUA (TSA, aeroportos de Boston e Providence) utentes americanos (reembolsos) não pode voar para os States; de 2019 a 2021 voou para os EUA tendo a ICELANDAIR como Sponsor, se o tiver que fazer agora terá que regularizar as dívidas todas e fazer um depósito correspondente a um ano de operações ; a certificação ETOPS ( mesmo uma certificação acelerada) para os B737-MAX 8 não será possível antes dos seis meses de operações depois de adquiridos

b) A TACV perdeu o certificado IOSA e para o voltar a recuperar vai ter que passar de novo por um processo inicial de certificação

c) A TACV continua banida da IATA, tem dívidas pendentes em ITALIA, FRANÇA, BRASIL (para falarmos das mais relevantes), situações que devem ser regularizadas pois da sua regularização, está pendente a reputação e capacidade da companhia operar sem riscos de arresto para esses destinos. Essas dividas têm que ser enxutas, garantir as operações sem sobressaltos, nenhuma agência na Europa vende a TACV devido a dívidas e má reputação

d) Não possui a empresa canais de venda à altura (sem abrangência nem profundidade) de competir no mercado o que está evidente quando se procura comprar na Europa, USA, Brasil voos na TACV; basta apontar que com uma aeronave a operadora está fazendo apenas 130 horas/mês, não conseguindo encher 04 voos/semanais entre Lisboa e CV; os B737-MAX terão cada um deles que fazer 300horas/mês (600 no total) ... - repito estamos nas 130 horas/mês, com uma aeronave. Chegarão essas aeronaves lá com essas limitações comerciais, técnicas e operacionais prevalecentes? Com essa mesma liderança que lá está e desnorte corporativo prevalecente? Note-se que gestores passaram por aí e que chegaram às 400hrs por avião

e) A operadora está em risco de não ver renovada o seu AOC por período superior a seis meses ( anos atrás a TACV já conseguia por 24 meses);em 2018 a companhia renovou o AOC por um período de 18 meses, em 2019 renovou por 24 meses, voltando aos 12 meses em 2022 por incumprimentos e não-conformidades várias, correndo o risco da aeronave ser “grounded” pela AAC pois, prazos para serem corrigidos essas não-conformidades são sistematicamente ultrapassados ( p.e. equipamentos que fazem parte da aeronave, foram trocados em Luanda, sem observação dos procedimentos normalizados e previstos para o efeito, a documentação correspondente não foi entregue);

f) A empresa está há mais de 04 meses operando sem aquilo que a EASA, ICAO e outras agências internacionais e reguladoras no sector chamam do "Post Holder" para o Sistema de Qualidade e Segurança Operacional, ou seja o gestor-auditor de todo o relacionado com à conformidade do sistema da organização para essas sensíveis e vitais áreas de qualquer companhia aérea, primordial nos transportes aéreos, “Safety First/Safety Is a Paramount”! Isso é uma não-conformidade grave

g) As análises de risco em determinadas situações que são normas/obrigações na indústria como por exemplo para suportar determinadas decisões de gestão, mudanças de frota, mudança de Post Holders não têm sido feitas; o Programa de Monitorização de Dados de Voos é gerido pelo Diretor de Treino o que configura um conflito de interesses e falta de transparência na análise dos referidos dados, fragilizando o processo de identificação e mitigação de riscos.

Nós todos temos bem presente o espetáculo que foi o imbróglio relacionado com a Certificação TCO-EASA de Julho passado, os custos da suspensão das operações, os transtornos causados aos passageiros, os custos com o recurso ao mercado para reposição dos voos com outra aeronave; da decisão do MT, Dr Carlos Santos, depois de perderem a face frente ao público, de mandar instaurar com carácter de urgência, uma investigação para apuramento de responsabilidades..., quais os resultados?

Pois bem, também chegaram-nos notícias preocupantes que dão conta de governantes que, face às dificuldades da operadora em cumprir com as suas obrigações e normativas junto à autoridade competente, resolveram dar uma “ajudinha”, intercedendo pela regulada junto do regulador .

A AAC não deve ser condescendente com os incumprimentos da operadora, pois que transportes aéreos não se fazem no fio da navalha. Nem ser tentada a dar cobertura às operações quando essas não estão solidamente suportadas por bons procedimentos, as melhores práticas e sistemas devidamente auditados.

A situação é grave, e as autoridades devem falar-nos a verdade, para sabermos a quantas andamos com esse falhanço colossal, essa embrulhada, também ela homérica! É uma obrigação, um dever moral da AAC, da TACV e o governo que têm que esclarecer o país, os contribuintes.

Mas afinal, que silêncio é esse?!

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