O Governo vai extinguir o Instituto de Estradas para criar a empresa Estradas de Cabo Verde. Aliás, já é ato consumado. Matou o Instituto de Estradas para fazer nascer a empresa Estradas de Cabo Verde. Tudo na tranquilidade, visando mais eficiência e eficácia na gestão. E encomendou um estudo para provar que a nova empresa é viável.
Estradas de Cabo Verde terá como principal fonte de receitas o Fundo Autónomo de Manutenção Rodoviária, que é um dinheiro que sai diretamente dos bolsos de todos os proprietários de veículos privados de Cabo Verde. Portanto, um fundo suportado pelas famílias cabo-verdianas, fixado em 7 escudos por cada litro de combustível adquirido nas bombas de abastecimento. Uma fortuna para o Estado e uma afronta para os parcos rendimentos dos proprietários das viaturas.
Seja como for, é este dinheiro que alimentava o Instituto de Estradas e que a partir deste momento passa a alimentar a empresa Estradas de Cabo Verde. Tudo simples, dispensando qualquer outra matemática mais elaborada, mesmo que seja a matemática da Maritza Rosaball – “a matimatica manual”.
De modo que, não fosse as exigências legais, o Governo nem sequer precisava encomendar estudos, pagando um bom quinhão para o efeito - também suportado pelos parcos rendimentos das famílias cabo-verdianas – uma vez que a viabilidade de tal empresa é certa e registada, não exigindo qualquer esforço de gestão e administração empresarial. É montar as estruturas, os orçamentos – aliás, o Instituto de Estradas tem tudo isso - e começar a gastar, a realizar despesas. Como se diz na gíria popular: “tudo pagu, dinheru paradu”.
Já no preâmbulo do diploma que cria a empresa Estradas de Cabo Verde, o Governo, eventualmente por descarga de consciência, escreve que “o estudo de viabilidade económica e financeira, obrigatório por lei, nessas circunstâncias, mostra a sustentabilidade económica e financeira dessa opção política do Governo, ao que acresce todas as vantagens de economia institucional e de maior eficiência e eficácia na execução das ações que se esperam sejam alcançadas na gestão e conservação das estradas nacionais”.
Tudo certo e justificado. Todavia, não sei se será possível acreditar na bondade deste projeto, uma vez que, para este Governo, o Estado é mau gestor e tem muitas dificuldades em imprimir eficiência e eficácia na gestão. Este Governo não acredita nas competências do Estado para gerir empresas, e tão pouco conseguir “vantagens de economia institucional”. Esta premissa - a descrença nas qualidades do Estado - tem sido a base justificativa de todas as vendas públicas que Ulisses Correia e Silva e o seu vice, Olavo Correia, já fizeram ou estão em vias de fazer em Cabo Verde.
Até porque, o grupo liderado por Ulisses Correia e Silva nunca escondeu o seu amor e compromisso com a privatização das empresas e negócios públicos, assim como a promoção dos empresários amigos, a quem designam, pomposamente, de setor privado.
Hoje ninguém duvida que este Governo é capaz de vender tudo o que tem valor, e que de algum modo pode gerar lucros e riquezas, sustentado no discurso de que com a privatização irá empoderar o setor privado, e por essa via, combater o desemprego, as desigualdades sociais, promovendo assim o crescimento económico e o desenvolvimento nacional.
Ora, não sei se será possível acreditar que um Governo que pensa assim, um Governo que tem no seu programa a privatização de mais de duas dezenas de empresas públicas, com ASA e Electra à cabeça, porque o Estado não sabe gerir e por isso mesmo deve deixar esta missão com os privados, vai criar Estradas de Cabo Verde com a intenção de introduzir eficiência e eficácia na gestão? Um Governo que defende a anulação do Estado – menor Estado – para reativar o setor privado – estará a ser sério quando resolve criar uma empresa pública para gerir o maior fundo público existente em Cabo Verde – o Fundo Autónomo de Manutenção Rodoviária?
Este Governo é um Governo marcado para vender. Vende tudo. Está em vias de vender as empresas públicas mais emblemáticas e promissoras do país. Estradas de Cabo Verde, ora criada, será – é o estudo do Governo a dizer isso – uma empresa viável, portanto, promissora. Os institutos públicos não podem ser vendidos. Será que o Governo criou a empresa Estradas de Cabo Verde para de seguida vender aos empresários amigos?
É pertinente refletirmos sobre esta questão, porque alguma coisa não bate certo neste processo. Estará a empresa Estradas de Cabo Verde a caminho do matadouro, como, de resto, tem sido apanágio deste governo? Vender, vender, vender….
São questões que deixo para reflexão. Porque salvar o Estado de Cabo Verde é um dever de cidadania!
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