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Covid19. Duras consequências às crianças e aos jovens cabo-verdianos
Ponto de Vista

Covid19. Duras consequências às crianças e aos jovens cabo-verdianos

Tenho esperança que o COVID faça com que o mundo coloque o Mindfulness em prática e deixe de viver em piloto automático, percebendo assim a importância do "parar para sentir". Vivíamos a queixarmo-nos da "falta de tempo" e muitas vezes com as prioridades trocadas, anulando-nos enquanto corríamos atrás de uma ou várias metas, que hoje com alguma distância percebemos que se calhar nem eram assim tão relevantes. Por isso, acredito que esta "paragem brusca" das nossas vidas, nos tenha obrigado a refletir se efetivamente os trilhos que seguíamos tinham a felicidade como direção e se estávamos a aproveitar verdadeiramente o "caminho", ou simplesmente a adiar a felicidade para o momento X ou Y. 

Às questões em torno da Juventude VS Covid19 são bastante relevantes e é com tristeza que vejo que têm sido "esquecidas" nas entrevistas realizadas a propósito da pandemia aos diferentes atores sociais, mas principalmente aos atores políticos. Pois por mais que queiramos olhar para o "copo meio cheio" do pós-covid, a verdade é que a curto prazo vai agravar significativamente as assimetrias e as desigualdades estruturais, se não, vejamos:

Apesar de não existir um consenso, os estudos sobre a atenção humana dizem-nos que se a apresentação for boa conseguimos captar a atenção ininterrupta entre 7 a 10 minutos. Por outro lado, se a apresentação for aborrecida, há uma enorme probabilidade de o ouvinte desligar em sete segundos.

Ora, pelo que já vi da tele-escola, a maioria dos professores não estavam minimamente capacitados para ministrar as aulas e-learning, o que é bastante perceptível se colocarmos a televisão em mute e focarmo-nos na comunicação não-verbal, a forma atrapalhada como gesticulam, como andam desenfreadamente pelo estúdio, como desviam o olhar das câmaras... (reconhecendo entretanto o esforço dos mesmos, faltou se calhar uma maioria capacitação prévia por parte do Ministério da Educação e Inclusão social, embora saibamos apesar que não estávamos preparados para este COVID19). Na verdade, parecem pequenos “preciosismos”, mas que no conjunto impedem que a mensagem seja corretamente transmitida e fazem com que rapidamente os alunos "desliguem", sobretudo se tivermos em conta que mais de 10% dos jovens sofre de défice de atenção. Por outro lado, o e-learning pressupõe erradamente que todos os alunos estão no mesmo degrau de aprendizagem, quando sabemos que é mais do que natural que numa mesma turma existam uma série discrepâncias e que é necessário que o professor utilize métodos diferentes para diferentes alunos de forma "personalizada" e "dedicada".

Ainda assim, nem todos os alunos têm acesso aos mesmos meios digitais, se há quem tenha computador e internet em casa, muitos são os que para acederem à internet iam para as praças digitais ou para algum ponto de acesso free com o seu smartphone tablete, computador portátil... Lembro-me bem da quantidade de gente que se juntava no Plâteau para aceder à internet por exemplo... Algo que agora não só seria um problema devido ao "distanciamento social" exigido pela mais versas organizações de saúde, como não seria o desejável, uma vez que não seria esse seguramente o melhor local para estudar e para desenvolver uma aprendizagem profícua.

Por fim, ao retirarmos os alunos até aos 18-19 anos das escolas até ao fim do ano letivo por um lado estamos a protegê-los, por outro podemos estar a condená-los à desnutrição. Quantos alunos matam a fome nas cantinas das escolas, sobretudo nesta fase em que muitos, fruto do COVID19, foram empurrados para o desemprego e as famílias viram reduzir-se ainda mais o já magro rendimento mensal?

Sinceramente, preocupa-me a falta que as cantinas vão fazer a esses alunos e, consecutivamente, a essas famílias...

Acredito que o COVID19 veio colocar novos desafios aos jovens da nossa geração, que saíram da universidade no período em que os vestígios e as consequências da crise de 2008 eram ainda sentidas, principalmente por sermos um país insular. Agora quando tudo parecia "encaminhar-se" levam um novo "rombo" nos seus sonhos e aspirações, aliada à alta taxa de desemprego no país. Tudo isso se associarmos os contratos de trabalho cada vez mais precários, à tendência para não saírem da universidade ou da formação profissional para o emprego, mas para os estágios profissionais (na maioria recebendo subsídios precários), considerando ainda a nova realidade que obriga os jovens a permanecem mais tempo em formação superior, pois apenas uma licenciatura já não garante emprego e empregabilidade, tendo ainda a maioria que enfrentar por algum tempo os encargos dos empréstimos feitos por eles ou pelos pais para pagarem os estudos universitários.

Portanto, quem vai pagar o preço maior e vai sofrer as maiores consequências econômicas e sociais desta crise é a juventude. As consequências na vida das crianças e dos jovens cabo-verdianos são muitas. E é difícil escolher "por onde começar" para mitigar os efeitos que esta pandemia vai ter na vida de todos nós.

Mas, uma coisa é certa é preciso ‘’começar ontem”!

 

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Redação