Apelo ao Voto Consciente. Nas Coerências das Políticas Públicas
Ponto de Vista

Apelo ao Voto Consciente. Nas Coerências das Políticas Públicas

Cabo Verde por ser territorialmente um Estado pequeno e insular, está sujeito a influências externas. Pode ser que os outros Estados influenciam-no com ideologias a troco de financiamentos externos, impondo uma seria de condicionamentos políticos ao ponto de manipular tomadas de decisões quer a nível macro e quer nível micro. Sendo certo que, direta ou indiretamente tem que se alinhar com grandes diretrizes das políticas internacionais. Que influências?

A Guerra Fria trouxe uma tensão geopolítica entre oriente e ocidente mais concretamente entre a União Soviética (o socialismo) e os Estados Unidos (o capitalismo) e os seus respetivos aliados logo após a segunda guerra mundial. O mundo dividiu-se em dois blocos: Bloco Oriental e o Bloco Ocidental. Esses dois blocos tinham ideias políticas muito claras e diferenciadas que obrigaram uma disputa por incongruência estratégica. Enquanto um bloco orientado pelas ideias socialistas com centralidade na família e no associativismo/cooperativismo, o outro dava a primazia ao indivíduo e a sua realização individual ou na empresa.

O filme político que o mundo assistiu por longos anos, está longe de ter um final feliz, devido a (in) coerência entre as principais políticas públicas adotadas. As essenciais incoerências reinam não nas suas primícias mas sim no papel do Estado na gestão da economia e na organização da sociedade civil. Não obstante, os sucessivos esforços na espectativa duma eventual combinação ou duma aproximação tendencial de uma política a outra, que na perspetiva de alguns pudesse unir a política da esquerda com a direita como se tratasse de unir duas pontas duma corda. Outros procuraram aspetos comuns tentando atar e situar-se ao meio, na tentativa de formar partidos que sejam nem tanto da esquerda e nem muito da direita. Sem esquecer que na busca de alternativa delinearam os não-alinhados com total abandono das diretrizes da esquerda e da direita, ressurgindo os partidos populares com enfase na determinação do povo e não do Estado. Todavia, não deixam de ser ideologias políticas assentes em estratégias governativas.

Hoje em dia, uma ideologia politica da esquerda ou da direita molda a vida económica e social do individuo, do grupo, das associações, das empresas, etc. Essa mudança é mais visível com alternância política quando se queira impor uma outra ideologia com mudança abrupta de paradigma, as pessoas ressentem e muitos sofrem consequências na economia cortando as suas espectativas e levando alguns a ter perdas financeiras.

A ideologia da esquerda defende que o governo deve garantir o bem-estar dos cidadãos, garantir emprego, saúde, educação e bens básicos. Para isso, o Estado deve ser grande e forte, controlando todos os setores da sociedade, regulando as empresas e cobrando impostos. As suas políticas direcionam à igualdade de renda, maiores taxas de imposto sobre os ricos, gastos governamentais em programas sociais e infraestrutura, mais regulamentação nos negócios. O governo deve garantir o bem-estar social, mesmo que os seus gastos sejam elevados. O acesso aos cuidados de saúde é um dos direitos fundamentais a todos os cidadãos e deve ser garantido pelo Estado. Ao longo da história grandes cérebros foram mentores dessa ideologia como os mais sonantes Albert Einstein, Chico Buarque, Karl Marx, entre outros.

Doutro lado, Margareth Thatcher e Adam Smith são mentores de um Estado «leve», com redução drástica do gasto público. Não tem grandes políticas públicas e acreditam que o individuo é capaz de se realizar sem interferência do Estado e põe as empresas no centro das atenções. Defendem baixos impostos e menor regulamentação das empresas. Pois, com um tecido forte empresarial os serviços complementam-se e os empregos aparecem naturalmente. Sendo assim, o Estado não precisa de garantir nada ao individuo porque todos lutam por um emprego ou um empreendimento que o leve a ter uma renda que autossustente as suas despesas com a saúde, a educação e com os bens básicos. Cada indivíduo é responsável pelo seu próprio destino e o Estado/Governo controla as leis que regulam o mercado e a organização social.

Essas ideologias não foram meras utopias e até que um cenário mais verídico assistimos com o caso Cabo Verde cujas alternâncias politicas de 1990 a 2000 e de 2016 geraram mudanças nos comportamentos económicos e sociais nos indivíduos, famílias e grupos, empresas e sociedade em geral.

PAICV (Esquerda) MPD (Direita)

As duas alternâncias políticas na história da democracia cabo-verdiana deu para perceber esta linha de ideia e fazer crer que chegou a hora de votar consciente e saber que um voto significa alinhar-se na direita ou na esquerda.

O PAICV no seu percurso como partido sustentador do Governo e das autarquias trabalhou com políticas públicas cuja coerência entre elas geraram empregos, grandes infraestruturas como estradas, aeroportos, portos barragens, drenagens de água, a preservação ambiental, a construção de liceus e universidades assim como garantir os estudos com programas de bolsas do estudo e outros programas. Construiu igualmente centro da juventude, USB- Unidades de base sanitária em localidades para complementar centros de saúde nos concelhos e Hospitais Regionais. Criou programas assistenciais com equipamentos sociais como centros comunitários, centros de acolhimento e proteção social das crianças, jardins e programas de luta contra pobreza, programa casa para todos. Criou empresas públicas e permitiu criação individualmente de empresas, mas não de forma obrigatória para empreendimentos e prestações de serviços. Quer isto dizer que o PAICV permitiu o Estado a agir, envolvendo e interagir para garantir o desenvolvimento e consequente bem-estar social de cada cidadão.

Doutro lado, o MPD não é muito apologista de estudos e planeamento e muito menos de criação de políticas públicas uma vez que o mercado se autorregula pela lei da concorrência. As empresas públicas existentes foram privatizadas. Todos os pequenos negócios foram obrigados a formalização económica com respetivos alvarás e licenciamento comercial. Todos os empreendedores pagam impostos ao Estado e ao INPS. Cada empresa deve formalizar contratos de trabalho de cada trabalhador no INPS. A reorganização e formalização dos negócios norteiam toda intervenção do Estado. O empreendimento do Estado através do Governo central e das autarquias é no sentido de gerar riquezas em termos de negócio. Os programas socias e associativos são fechados para reduzir as despesas do Estado. Os centros da juventude que existiam em todos os concelhos foram fechados; os centros de acolhimento das crianças através do ICCA e Aldeias SOS, foram fechados maioria deles, o «Casa para Todos» não se alinha nas políticas do Estado salvo se forem vendidos (já que o Estado não pode pagar para os indivíduos); os programas de luta contra pobreza devem ser canalizados nas políticas do Ministério da Agricultura ou das Camaras Municipais. As casas clandestinas são arrombadas em detrimento de vendas de terreno a empresas imobiliárias e de construção para revenda em apartamentos.

Posto isto, resumidamente para questionar as coerências das políticas públicas sendo impactante na vida de cada individuo integrado na sua empresa e na sua família. Essas consequências são claras quando o MPD intercalou a governância do PAICV em 2016. As vendedeiras de ruas/ambulantes pobres e desempregadas devem continuar a ganhar um pão de cada dia ou devemos preservar um ambiente citadino organizado? Os proprietários de hiace terão que constituir empresas e pagar imposto ao Estado e operar com um alvará obrigatório ou cada um opere ao seu belo prazer sem pagamento de impostos diretos? Todas as famílias têm que ter uma licença de construção antes de construir, ou cada um construa para ter melhor moradia? Todos os construtores devem formalizar empresas de construção cível, ou …A lei mãe é: todos pagam impostos e a INPS, e ponto. Os programas sociais fechados reabrirão se PAICV ganhar em 2021/22? As empresas passarão a pagar menos impostos se PAICV ganhar? Os políticos e os ricos passarão a pagar mais impostos e pobre menos? As políticas da saúde e da educação passarão a ter outra moldura? A resposta é sim. Mas a questão fundamental é a coerência política para o desenvolvimento de Cabo Verde que se faz sentir outrora incoerente mesmo lá em cima do cutelo onde mora o recém-nascido. Um voto significa necessariamente a direção política que cada cabo-verdiano quer para o desenvolvimento do seu país, do seu concelho e da sua comunidade. Não se iluda com quantidade de obras realizadas, muitas delas nas vésperas das eleições, mas que cada um pense seria e necessariamente se vale a pena votar na coerência política. Basta de votar por dinheiro ou de olhos fechados. Os partidos políticos aniquilam a consciência das pessoas ao ponto de uns se identificarem com o partido. Um cidadão nunca deve dizer que ele é MPD, UCID, PAICV ou PP porque deve estar ciente de que em qualquer hora se alinha com políticas públicas mais convenientes ao desenvolvimento do país e da sua região e comunidade.

Por um voto consciente nas políticas públicas coerentes.

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