Eu estou, como qualquer humano estaria, rasgado por sentimentos complexos e contrastantes misturando pavor e esperança, porque este Momento Judicial é sobre a minha liberdade, a minha dignidade e a minha própria vida. Mas com o maior respeito, não é apenas o meu destino que deve ser decidido, pois o futuro de Cabo Verde, também está em jogo. Posso esperar e rezar para que os nossos destinos não sejam ambos sacrificados no altar do expediente político.
12 de agosto de 2021
Meritíssimos Juízes do Tribunal Constitucional
Esperava finalmente estar presente no tribunal e ter a oportunidade de expressar com a minha própria voz, com as minhas próprias palavras, a desumanidade e a indignidade, a má vontade e os maus-tratos a que fui sujeito durante mais de um ano. Lamentavelmente, não me deram esta oportunidade, pelo que pedi ao Dr. José Manuel Pinto Monteiro que lesse esta breve declaração em meu nome.
“Cumprem hoje 428 dias desde que fui detido na Ilha do Sal.
Muito se tem escrito desde então sobre quem sou, o que estava a fazer na altura da minha detenção, o meu estatuto de Enviado Especial, as muitas irregularidades processuais que ocorreram porque a polícia local, o Procurador-Geral e a Interpol estavam mais interessados em satisfazer as necessidades dos Estados Unidos do que em preocupar-se com os meus direitos legais e como Cabo Verde foi empurrado para o meio de uma batalha política em curso entre o meu país natal, a República Bolivariana da Venezuela, e os Estados Unidos.
Por vezes senti-me como se estivesse à espera de Godot de Samuel Beckett, em algum teatro do absurdo, mas chegámos agora a este "momento judicial" sob a vossa vigilância como Guardiães da Constituição.
Um momento judicial que deve basear-se no Estado de direito, na justiça natural, na Constituição de Cabo Verde, nas obrigações de Cabo Verde ao abrigo do direito internacional e nada mais.
É claro que não sou ingénuo o suficiente para acreditar que considerações políticas não desempenharam um papel significativo na minha detenção e, como a declaração do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo de 12 de agosto sublinha fortemente "...extraditar um diplomata de um país terceiro pode ter um impacto negativo nas manifestações internacionais e pode ter um "efeito bumerangue" em qualquer país...bem como noutros Estados envolvidos em jogos perigosos com o direito internacional".
Hoje, portanto, nesta venerada câmara, é a Lei, deve ser a Lei - Lex, Namos, Qanun segundo as antigas civilizações - que deve ser o vosso único ponto de referência.
Cada ator no Momento Judicial de hoje deve desempenhar o papel que lhe foi atribuído. A vós, os Guardiães do Tribunal Constitucional, é pedido que façam justiça. A vossa "voz judicial" será decisiva para que a justiça não só seja feita, mas também para que seja vista como feita. A vossa Voz Judicial deve seguir rituais judiciais que estão longe de ser triviais e que tornam sagrados este Momento Judicial, a vossa Voz Judicial e a vossa Autoridade Judicial. A Autoridade Judicial, contudo, para ser declarada e aceite como sagrada, deve ser compreendida por todos os atores.
Eu estou, como qualquer humano estaria, rasgado por sentimentos complexos e contrastantes misturando pavor e esperança, porque este Momento Judicial é sobre a minha liberdade, a minha dignidade e a minha própria vida. Mas com o maior respeito, não é apenas o meu destino que deve ser decidido, pois o futuro de Cabo Verde, também está em jogo. Posso esperar e rezar para que os nossos destinos não sejam ambos sacrificados no altar do expediente político.
S.E. Alex Saab
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