O presidente do PAICV estranhou hoje o posicionamento do Governo em reconhecer a integridade territorial do Reino de Marrocos, considerando que isto simboliza uma “mudança substancial” em relação aos compromissos assumidos pelo País, designadamente nas Nações Unidas.
Rui Semedo falava em conferência de imprensa, na Cidade da Praia, para reagir às declarações do primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, que se encontra em Marrocos a participar numa reunião da Comissão Mista Cabo Verde-Marrocos.
Citando as declarações do chefe do Governo, que disse que a visita ocorre num “momento especial das relações entre Cabo Verde e Marrocos, com a formalização do reconhecimento da integridade territorial do Reino de Marrocos por Cabo Verde (…)”, Rui Semedo assegurou que o seu partido não põe em causa nem a visita nem a cooperação.
“A cooperação com Marrocos não é de hoje, é antiga, inclusive todos estão lembrados que temos acordos que permitem a circulação da aviação nos nossos espaços, tem havido cooperação na área da formação, temos estudantes que se formaram e continuam a se formar em Marrocos, há muitos anos”, lembrou.
Entretanto, pontuou, o pronunciamento da continuidade ou da integridade territorial do reino de Marrocos sempre é uma questão que divide a comunidade internacional e que Cabo Verde tem tido um posicionamento coerente a nível das organizações que faz parte, como as Nações Unidas e a União Africana.
“O conteúdo deste pronunciamento representa uma mudança profunda da política externa de Cabo Verde”, referiu a mesma fonte, que indicou que o mesmo simboliza uma “mudança substancial” com relação a todos os compromissos de Cabo Verde, designadamente no seio das Nações Unidas, onde está vinculado um posicionamento formal sobre o processo da autonomia e independência da República Árabe Saaraui Democrática.
Rui Semedo lembrou “um grande impasse” criado pelas reivindicações do Reino de Marrocos e a guerra que se alastrava nesse território, suscetível de perigar a paz frágil daquela zona no norte da África em que a ONU decidiu pela consulta do povo saaraui, através de um referendo, e que Cabo Verde considerou “realista e pertinente” alinhar-se com a posição desta organização.
Neste sentido, para o PAICV o que se vive hoje marca a descontinuidade em relação à posição assumida anteriormente por Cabo Verde, uma vez que, sintetizou, este posicionamento põe em causa a última resolução das Nações Unidas sobre este dossiê a que Cabo Verde está vinculado.
“Estranha-se que uma decisão desta grandeza seja anunciada, por esta via não oficial, fora do País, sem um prévio diálogo ou debate com os cabo-verdianos e sem qualquer informação à oposição parlamentar, designadamente, ao PAICV”, frisou o líder do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição).
Trata-se, segundo a mesma fonte, de uma das questões que deveria ser tratada com “responsabilidade, profundidade, clareza, coerência e com elevado sentido de Estado”, acrescentando que a política externa do País “está a sofrer”, neste momento, de “algum desnorte” que leva a tomada de posições “irrefletidas”.
Lembrou que este episódio não é um facto isolado, referindo-se ainda ao caso de uma aeronave russa que viu recusado o seu reabastecimento na ilha do Sal, sem que o País fosse informado das reais razões desta decisão, lamentando que nem mesmo uma carta endereçada ao primeiro-ministro pelo seu partido não mereceu sequer uma resposta.
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