No dia em que o parlamento cab-verdiano realiza mais uma sessão solene para comemorar 25 anos da constituição democrática, eis que Santiago Magazine acede a uma carta do PAICV, assinada pela líder do grupo parlamentar, Janira Hopffer Almada (JHA), onde a Televisão de Cabo Verde (TCV) é acusada de “atropelos à lei magna, porquanto está a discriminar a oposição e a condicionar a sociedade de ter livre acesso às informações de forma independente, verdadeira e justa”.
A carta, dirigida ao Conselho de Administração da RTC, é um “pedido de esclarecimentos sobre a forma como vêm sendo geridos os conteúdos televisivos na TCV” e surge na sequência de um encontro que o PAICV teve com os responsáveis desta empresa pública, ocorrido no passado dia 11 de Outubro, onde JHA havia criticado os trabalhos da TCV, sobretudo na divugação das actividades políticas do maior partido da oposição, acusação essa que foi prontamente desmentida pelo director da TCV, António Teixeira, segundo o qual o PAICV tem estado na televisão pública mais do que o próprio MpD, que se encontra no poder
No entanto, o PAICV insiste na sua posição a traz novos dados para a ribalta, reafirmando que “de há vários meses, a esta parte, o PAICV tem constatado que vem merecendo um tratamento discriminatório, por parte da TCV”, lê-se na referida carta, que afirma tratar-se "esta postura da televisão pública de um atropelo à própria Constituição da República".
“Escusado será dizer que é a própria Constituição da República que impõe, no número 4º, do seu artigo 60.º, que, nos meios de comunicação social do sector público, deve ser assegurada a expressão e o confronto de ideias das diversas correntes de opinião, proibindo a prática e a apologia de qualquer forma de discriminação (vide o numero 5, do artigo 48.º, da Magna Carta)”, regista a missiva dos tambarinas.
Com efeito, o PAICV enumera factos que considera demonstrativos da discriminação. Em Março, a televisão pública “não cobriu uma visita de trabalho que os Deputados do PAICV, eleitos por Santiago Norte, fizeram ao círculo”.
Só no mês de Abril, o PAICV regista a deslocação ao Fogo da presidente e líder parlamentar do partido e os deputados eleitos pelo Circulo Eleitoral do Fogo para contactos em Chá das Caldeiras e participação na feira agro-pecuária em São Filipe, nos dias 28 e 29 de Abril e a apresentação no dia 22 de Abril do projecto de Lei que institui e regulamenta o Estatuto do Trabalhador-Estudante, sem merecer qualquer cobertura da TCV.
Este mesmo projecto de lei foi objecto de uma jornada de socialização no auditório da Universidade de Cabo Verde, no dia 17 de Maio, e a TCV não apareceu.
Em Junho, concretamente “nos dias 3 e 4, a presidente e líder parlamentar do PAICV fez uma visita de trabalho à Ilha de Santo Antão, tendo estado em contacto com a população, durante esses dois dias, nos 3 concelhos da ilha, mas a televisão pública optou pela ausência, não cobrindo a visita”. Ainda em Junho, o grupo parlamentar do PAICV “promoveu jornadas descentralizadas em Santiago Norte, durante os dias 16 e 17, tendo a televisão pública pautado por uma completa ausência de cobertura jornalística, não se tendo dignado, sequer, a garantir o balanço no final da visita”.
Mais recentemente, a 5 de Outubro, os deputados do PAICV eleitos por Santiago Sul, e a presidente do partido, fizeram uma visita de 1 dia ao concelho de São Domingos e “apesar de terem solicitado a devida cobertura, num momento em que o mau ano agrícola é assunto importante e estava agendado um encontro com os agricultores e criadores de gado, a TCV primou, mais uma vez, pela sua ausência”.
Segundo a referida carta, a TCV alega sempre falta de meios para não cobrir as actividades do PAICV.
No caso concreto da actividade do dia 5 de Outubro, tendo em conta as desculpas da televisão, “alegando falta de meios para se deslocar a São Domingos, o grupo parlamentar manifestou disponibilidade para fazer o balanço da visita nesse dia, no seu regresso, às 18 horas, na sede nacional do partido, na Praia, e a TCV não compareceu”.
Mas os problemas levantados por JHA no pedido de esclarecimento que Santiago Magazine teve acesso, não ficam apenas na falta de cobertura das actividades políticas do maior partido da oposição. Os problemas atingem também “a utilização do tempo de antena e a imposição de certos assuntos na agenda mediática, adulterando o sentido e a ética no serviço público de comunicação social”.
Pluralismo informativo e rigor são necessários
Neste particular, o PAICV considera que a TCV tem reservado aos membros do Governo e aos dirigentes do partido no poder – o MpD – “tempo e espaço privilegiados na televisão pública, prejudicando os trabalhos de fiscalização que cabem à oposição democrática”.
Por exemplo, a carta do PAICV dá conta que “após uma conferência de imprensa do PAICV, enquanto oposição que, democraticamente, está a fazer a fiscalização que lhe cabe, a TCV optou por chamar, para o jornal da noite, no dia 6 de Junho, o ministro da Presidência do Conselho de Ministros e dos Assuntos Parlamentares, que também é vice-presidente do MpD, concedendo-lhe o tempo necessário para as justificações e considerações, isto é, para lhe facultar um tempo de antena alargado. E, essa participação foi de 12 minutos e 46 segundos, enquanto a peça relativa à conferência de imprensa do PAICV não ultrapassou os habituais 3 minutos. Isso configura, claramente, um tratamento desigual e discriminatório”.
A mesma carta regista ainda que “depois da sessão plenária de Maio, em que se discutiu a questão da liquidação dos TACV (e onde a oposição e a maioria, isto é, o Governo e a bancada que o suporta, tiveram o tempo necessário para o debate, nos termos regimentais), o ministro das Finanças, que também é vice-presidente do MPD, foi convidado para o jornal da noite do dia 29 de Maio, para, em 14 minutos e 11 segundos, explicar a sua versão dos factos, sem que tivesse sido dada à oposição qualquer possibilidade de, também nesse espaço, emitir a sua opinião”.
Neste contexto, o partido tambarina afirma que tem havido constantes violações e persistentes atropelos à legalidade, por parte da TCV, que, por imperativo legal e obrigação ética, deveria assegurar o pluralismo informativo, o rigor e a isenção, como mandam o nº 2, do artigo 36, e a alínea b), do nº 2, do artigo 21, ambos da Lei de Televisão.”
E, ao abrigo da alínea k), do artigo 4, do Regimento da Assembleia Nacional, o PAICV pede informações sobre “quem é que decide sobre assuntos de relevância nacional e as entidades que devem ser ouvidas em cada assunto e com base em que critérios ou estribados em que norma legal; e, ainda, em caso de a Lei não dispor directa e especificamente sobre esta questão, quem tem tomado essas decisões, nos últimos 12 meses, na Televisão de Cabo Verde?
Esta carta do PAICV é de 18 de Outubro, mas ainda não foi respondida pelos responsáveis da empresa.
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