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Juiz que suavizou medida de coação a Arnaldo Silva foi seu funcionário
Sociedade

Juiz que suavizou medida de coação a Arnaldo Silva foi seu funcionário

O juiz Elisângelo Moreno Fernandes, que, juntamente com a juiza Mirta Teixeira, assinou no passado dia 9 de Março o despacho que extinguiu a proibição de saída do país a Arnaldo Silva, foi seu funcionário antes de ingressar na magistratura judicial. Facto que poderá anular essa decisão por flagrante incompatibilidade.

A extinção da interdição de saída do país como medida de coacção imposta a Arnaldo Silva, desde que foi detido em Setembro do ano passado, foi decidida no passado dia 9 por despacho conjunto dos juizes do 2º Juizo Crime, a juiz de Direito Mirta Boaventura Teixeira, e o juiz assistente Elisângelo Moreno Fernandes.

Sucede, porém, que Elisângelo Fernandes, além de ter sido colega de trabalho de Arnaldo Silva na ex-TACV, como assessor no departamento jurídico da empresa, foi trabalhar depois no escritório de advocacia do ex-bastonário, que foi então seu patrono.

Esse detalhe, que coloca em causa a rectidão e isenção da justiça no tratamento desse mega-processo de suposta venda ilegal de terrenos da Praia, dá ao Ministério Público arsenal para suscitar Incidente de Suspeição contra aquele magistrado judicial (Elisângelo Fernandes) e, deste modo, pedir a nulidade desse despacho de 9 de Março - os visados foram notificados no dia seguinte.

Outro aspecto a reter dessa decisão conjunta dos juizes Mirta Teixeira e Elisângelo Fernandes prende-se com o facto de o seu despacho não referir à devolução do passaporte ao arguido Arnaldo Silva, apesar deste ter, alegadamente, comentado de forma antecipada com amigos em mensagens a circular na internet, de que iria reaver esse documento por ordem da juiza, dando a ideia de que teria conhecimento dessa informação previamente. E acontece que essa ordem a mandar restituir-lhe o passaporte, segundo documento na posse de Santiago Magazine, só foi dada por Mirta Teixeira aos serviços da secretaria judicial dois dias depois do seu despacho, ou seja, no dia 11 de Março, e alegando "lapso" a sua não menção na decisão anterior.

Recorde-se que o Ministério Público havia solicitado ao tribunal da Comarca da Praia, no despacho de acusação do processo da suposta venda ilegal de terrenos da Praia - conhecida também como Máfia de terrenos -, a renovação da medida de interdição de saída do país a Arnaldo Silva, solicitando inclusive ao tribunal, em alternativa, "a aplicação da medida mais gravosa, a da prisão preventiva" por haver possibilidades de o arguido "não regressar ao país para se entregar voluntariamente à justiça".

Entretanto, a magistrada judicial Mirta Boaventura Teixeira, do 2º juízo crime, em conjunto com o juiz Elisângelo Moreno Fernandes, emitiram um despacho no qual dá por extinta a medida de interdição de saída do país a Arnaldo Silva, mantendo, todavia, o Termo de Identidade e Residência como coação ao ex-bastonário.

Aquela magistrada judicial justificou então que "pela data da aplicação (5 de Setembro de 2019), verifica-se que o prazo dado da medida de coação de interdição de saída do país a que alude o art. 279º nº 1, alinea a) e 7 do CPP, já se encontra expirado".

O tribunal, contudo, manteve o TIR a Arnaldo Silva, "até ulteriores termos do processo", mas não fez qualquer referência à outra medida de coação sob a qual o ex-bastonário estava sujeito: proibição de contactar outros arguidos. O que, no entendimento de certos juristas, pode também anular o despacho de 9 de Março que extingue a interdição de saída do país por nele poder haver contradições na sua aplicação.

O Ministério Público, que vem sendo acusado pela defesa dos principais arguidos de falha processual por não ouvir os implicados durante a investigação, deduziu acusação contra os principais suspeitos da venda ilegal de terrenos na Praia. São 15 arguidos, com destaque para figuras públicas como Arnaldo Silva, Rafael Fernandes (até aqui único político activo envolvido), Alfredo Carvalho e a empresa deste, Tecnicil, todos acusados de burla qualificada, lavagem de capital, associação criminosa, falsificação de documentos e corrupção activa. O MP, que pede julgamento perante Tribunal Colectivo, sugeriu a prisão preventiva de Arnaldo Silva, TIR para os demais réus e confiscação dos seus bens, porque provados em como lesaram aos legítimos donos dos terrenos e ao Estado de Cabo Verde mais de 2 milhões de contos.

Santiago Magazine tentou falar com o Arnaldo Silva sobre este assunto, mas não foi possível. As nossas chamadas - pelo menos 3 - infelizmente não foram atendidas. 

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Redação