Amílcar Cabral, “pai” das independências da Guiné e Cabo Verde, é conhecido pela sua paixão pela política, mas também adorava a família, as duas irmãs gémeas, Arminda e Armanda, um bom peixe escabeche e o futebol.
Quem conta este lado de Cabral é Iva Helena, sobrinha que o revolucionário criou como filha em Bissau, após esta lhe ter sido “oferecida” pelo irmão Ivo, que não queria ter uma segunda filha.
Aos 75 anos, Iva Helena, mãe, entre outros, da cantora guineense Karyna Gomes, contou à Lusa como era Cabral no seio familiar.
A familiar falou à Lusa no âmbito da recolha de testemunhos sobre o político, cujo centenário de nascimento é celebrado na próxima quinta-feira, dia 12.
“Era amigo da família, dava-se bem com toda a família, principalmente gostava de mim, em particular, e gostava de jogar à bola. A comida que ele mais gostava era arroz de feijão e peixe frito de escabeche”, revelou a matriarca.
Cabral “estava sempre a pedir à mãe que o fizesse”, acrescentou.
Iva Helena nasceu em Cabo Verde, no dia 27 de agosto de 1949, mas aos três anos, em outubro de 1952, veio para a Guiné com Arminda e Armanda, irmãs gémeas do revolucionário.
“Eram duas bonecas dele. Tinha uma adoração para as irmãs, principalmente à Arminda que era mais frágil, a mais doentinha”, afirmou Iva Helena.
Com uma memória fresca que a ajuda na precisão de datas, a sobrinha que se considera “primeira filha de Amílcar Cabral”, lembrou que a irmã de Cabral Armanda chegou a fazer parte [da Casa] dos “Estudantes do Império” quando foi cursar enfermagem em Portugal, nos anos de 1940.
A irmã gémea Arminda só não foi porque na altura andava com problemas de saúde e a mãe Iva não a deixou seguir para a então metrópole, referiu Iva Helena.
No ambiente familiar toda a gente tratava Cabral por Amílcar, disse a sobrinha, menos a mulher, a portuguesa Maria Helena Ataíde Vilhena, que sempre o chamou de “Amilcarzinho”.
Cabral ainda era estudante em Portugal quando foi a Cabo Verde, em agosto de 1949, para anunciar à mãe Iva que se ia casar com a portuguesa Maria Helena, tendo sido surpreendido pelo irmão (da parte da mãe) com a “oferta de uma filha”.
O nascimento daquela que é hoje Iva Helena ocorreu a 27 de agosto de 1949, um dia após a chegada de Amílcar Cabral a Cabo Verde.
“Quando eu nasci disseram ao irmão que eu era um rapaz, então puseram-me o nome de Ivo Amílcar. Eu tive duas horas com esse nome, depois disso, quando disseram que era uma menina, o meu pai disse que não me queria, já tinha uma [filha]. Ele disse à parteira que se quisesse que levasse a criança com ela, que ele não precisava”, lembrou, divertida, o episódio.
Ao ver que o irmão estava determinado em oferecer a filha à parteira, Cabral mostrou que aquilo estava errado, contou Iva Helena.
“Então toma é sua filha”, foi a resposta do irmão Ivo, referiu a sobrinha, falando de um episódio entre dois irmãos em que a própria era a protagonista.
Após anunciar a nova à noiva em Portugal, através de uma ligação telefónica, Amílcar contaria à mãe Iva sobre o propósito do casamento e ainda o nome que decidiu dar “à sua filha”.
Iva, em homenagem à mãe, e Helena pela futura esposa, deram o nome Iva Helena que a sobrinha ostenta, embora Cabral lhe chamasse “Leniva” de forma carinhosa.
Cabral queria harmonia na família, mas havia algum ciúme da mãe (Iva) por causa do nome que tinha dado à sobrinha.
“A minha avó sentia ciúmes, porque ela dizia ‘enganaste-me que puseste o meu nome, afinal chamas-lhe Leniva. Pões Helena à frente’”, lembrou, nostálgica, Iva Helena.
Filhas biológicas, Amílcar Cabral teve Iva, que vive em Cabo Verde, e Indira, que reside na Guiné-Bissau, onde recentemente chegou a ser ministra no Governo do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), fundado pelo seu pai.
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