“A realidade é que tem havido em Cabo Verde vários pedidos para se proteger a orla marítima e em resposta a esse pedido, o governo achou por bem legislar sobre a matéria. Agora tudo é centralizado no Ministério das Infraestruturas, e as câmaras municipais já não têm a competência para esta questão.”
Gilberto Barros, Secretário de Estado das Finanças[i]
“Numa publicação nossa do mês de Março deste ano, dissemos que a ponte da Gamboa não tinha condições de ser reabilitada porque encontrava-se totalmente deteriorada e que a solução seria a sua demolição. Constatamos a execução de trabalhos no sentido da sua reabilitação que foi interrompida e agora verificamos que a mesma está a ser demolida e o que realmente se vai fazer é a construção dum restaurante sobre um aterro de basalto no meio da baía. A Câmara afirmou no seu comunicado de 26 de Abril passado que a ponte ia ser "intervencionada" em vez de dizer "demolida". Não entendemos essa teimosia em não falar a verdade aos praienses. Mais surpresas estão para vir tal como o prometido areal da Praia Negra que é uma miragem pois não resistiria à primeira calema que possa surgir.”
Provedor da Praia [ii]
Uma coisa é certa: a zona da Gamboa desde o Casino até a nova ponte/bar será transformada numa propriedade privada e vedada, se ninguém tomar uma posição.
Qualquer investidor racional, antes de avançar com um investimento, uma das coisas que deve ter em conta é a legalidade do seu ato. O risco e a consequência de se infringir ou ignorar as leis devem ser da responsabilhidade do investidor, seja pobre, rico, público ou privado.
Se podem mandar abaixo barracas com famílias (mulheres e crianças) por causa da ilegalidade da construção, porquê que as construções ilegalmente construídas nas orlas marítimas não podem ser derrubadas?
Temos uma lei e posicionamento da Câmara Municipal da Praia (CMP) para as barracas e construção ilegais, e outra para as vivendas, prédios e negócios?
O Estado e todas as estruturas que a compõem, seja cidadãos, partidos políticos ou entidades públicas devem funcionar nos termos da constituição e das leis, em todas as suas atitudes, segundo o art.º 16 n.º 1 e 2 da Constituição da República de Cabo Verde.
Assim, evocando nesta oportunidade a constituição da República de Cabo Verde, no seu art.º 91º nº 1, 7 c) e nº 8, na epígrafe Princípios gerais da organização económica, temos que:
1. A exploração das riquezas e recursos económicos do país, qualquer que seja a sua titularidade e as formas de que se revista, está subordinada ao interesse geral;
7. São do domínio público:
…
c) As estradas e caminhos públicos, bem como, as praias;
8. É, ainda, do domínio público do Estado, a orla marítima, definida nos termos da lei, que deve merecer atenção e proteção especiais.
O Decreto-lei n.º 14/2016 de 1 de março, art.º 3.º h), define como “Orla Marítima” as áreas que compreendem as praias e os terrenos das costas, enseadas, baías contíguas à linha do máximo praia-mar numa faixa de 80 (oitenta) metros de largura, sem prejuízo do disposto na subalínea v) da alínea c).
A alínea c) diz-nos que “domínio público marítimo” é a área marítima que compreende:
…
v) A orla marítima, compreendendo as praias e os terrenos das costas, enseadas, baías contíguas à linha do máximo preia-mar numa faixa de 80 (oitenta) metros de largura, salvo se a lei estabelecer uma extensão da disciplina jurídica para limites diferentes, desde que justificados e devidamente fundamentados.
O facto de o presidente da CMP “fingir” não saber a diferença entre “Mar” e “Orla Marítima”, podemos facilmente deduzir que tudo está a ser feito intencionalmente. Na Gamboa, já ninguém sabe o que irá ser feito, porquê e quem aprovou. Se foi a Assembleia Municipal, se o Governo ou se a Presidência da Autarquia. Já vimos imagens 3D de prédios e de bares. Já tivemos a Gamboa cercada para inicio da obra etc. Ou estão à espera na expectativa de que irão ganhar as eleições e voltar a iniciar a obra?
Dos factos
1º
Através do anúncio público efetuado pelo presidente da CMP, Óscar Santos, difundido nos jornais, rádios e televisão do país, passamos a saber que vai ser construído um empreendimento Hoteleiro em plena praia da Gamboa;
2º
De acordo com o líder da bancada municipal do PAICV, Vladimir Silves Ferreira, “o projeto não passou pelo crivo da Assembleia Municipal, como determina a lei”;
3 º
Segundo o presidente da Câmara Municipal da Praia, Óscar Santos, “nós estamos a falar de um terreno privado que foi comprado há 20 anos, não estamos a falar de uma concessão, caso fosse, sendo na Orla Marítima, obrigatoriamente tinha que passar pela AM, mas, estamos a falar de um empreendimento que está a 160 metros do mar, portanto fora da orla marítima”;
4º
O ministro da Economia Marítima, Turismo e Transportes, José Gonçalves, defendeu que “todos os terrenos e todas as propriedades privadas dentro dos 80 metros da orla marítima têm que ser confrontados com a Constituição e com a Lei” e que “a Lei Magna de Cabo Verde “não é alienável, nem penhorável”;
Só devemos lamentar o silêncio do Governo em relação a estes projetos na Gamboa.
5º
A CMP apresentou vários projetos para a Gamboa (fotos abaixo), em particular no que concerne à ponte que foi demolida, pelo que deve ser esclarecido o que vai ser realmente construído na Gamboa.
Se estes blocos (foto acima) que a CMP aprovou para ser construído estão fora da orla marítima, a areia da Gamboa também estará ou a orla marítima da Gamboa não inclui areia?
Tendo em conta o direito à informação (art.º 48 da CRCV) o país merece que seja tornando público ou publicado no Boletim Oficial: a) as provas da venda do terreno há 20 anos; b) o valor desta venda; c) o comprovativo da entrada deste dinheiro no cofre da CMP; d) o responsável pela aprovação desta obra e as suas fundamentações que permitem provar que tal construção seja legal; e) o projeto e todos os estudos efetuados (em particular o do impacto ambiental), e, f) os fundamentos legais ou os cálculos que foi usado pela CMP para determinar “que esta obra está à 160 metros do mar, portanto fora da orla marítima”.
QUEBRA CANELA
A linha de delimitação das construções na zona de Quebra Canela são os espaços Kapa, Aqua, Alkimist, etc., que foram construídas com base na lei sobre a orla marítima. Este modelo, que se enquadra na lei, permitia que qualquer pessoa absorvesse o horizonte do mar, tanto os que vão a estes Bares & Restaurantes, como o cidadão que queira ir passear nesta zona.
O modelo encontrado pela atual CMP de concessionar a orla marítima, significa que só vê o mar (sentado) em Quebra Canela (Prainha e brevemente a Gamboa) quem tem dinheiro.
A Prainha é o próximo alvo da especulação e favorecimento na orla marítima por parte da CMP.
A direção,
[i] https://expressodasilhas.cv/politica/2018/10/06/construcoes-na-orla-maritima-passam-a-depender-de-autorizacao-do-governo/60382
[ii] https://www.facebook.com/search/top/?q=ponte%20Gamboa&epa=SEARCH_BOX
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