Cabo Verde, um país depressivo
Editorial

Cabo Verde, um país depressivo

A propósito da nomeação de embaixadores políticos e outras promessas – será compromissos? – ou “conversas” para entreter a nação e massagear o ego da manada… Viu?... Quando os dirigentes, os órgãos do poder do Estado e as instituições democráticas são os primeiros a violar as leis, os princípios éticos, o bom senso e a palavra dada, é certo que o país sofre, e com o país, as pessoas. Com estes atos, com esta postura, estaremos a deprimir o país, a molestar a autoestima (dos diplomatas de carreira, dos jovens, dos trabalhadores, das famílias particularmente, enfim, de toda a nação) e a sanidade coletiva! Há que resgatar o Estado de Direito para salvar o país e as pessoas!

Quando em março de 2016, o eleitorado cabo-verdiano resolveu mudar o sentido de voto, colocando o MpD e Ulisses Correia e Silva na liderança do país, houve naturalmente um reavivamento das emoções coletivas em como o desempenho dos órgãos do poder e das instituições da República iriam melhorar, elevando assim a qualidade de vida das pessoas e a competitividade do país em todos os níveis e direções.

É certo que o país vinha sendo governado pelo PAICV durante 15 anos e naturalmente muitas esperanças se sucumbiram pelo caminho. O país dava sinais inequívocos de cansaço e a mudança aparecia como opção apropriada.

Ademais, os discursos sobre a premiação do mérito, a despartidarização da administração (quem não se lembra a célebre linguiça no pescoço do gato proclamado até à exaustão por Ulisses Correia e Silva), a despolitização/despartidarização das representações diplomáticas, os 45 mil empregos dignos para os jovens, a resolução do crónico problema dos transportes aéreos e marítimos, realimentaram as esperanças, e o país, de facto, mudou de mãos.

A campanha  política de 2016 foi violenta, mas alguém se vendeu por cordeiro, e diga-se em abono da verdade, por um bom preço – maioria absoluta.

Acontece, todavia, que o cordeiro afinal era lobo. E logo após a tomada de posse, sairia da toca, insolente e tranquilo, assumindo a sua verdadeira identidade e natureza.

Factos. A nova maioria anulou a lei do concurso, atirando a premiação da meritocracia para o caixote de lixo. Os candidatos aos altos cargos da administração pública obrigavam-se apenas a escrever uma carta para pedir a desvinculação do partido, tornando-se assim, dir-se-ia por um golpe de mágica, num cidadão apartidário e independente, com competência e mérito para ocupar qualquer posto de direção no setor público estatal.

Os 45 mil empregos previstos com base em “contas feitas” foram elevados ao céu, de onde já não querem descer – porém, aqui na terra, trasladaram-se para estágios profissionais, sem direito à reclamação - ao mesmo tempo que Ulisses Correia e Silva daria conta que não era gestor dos TACV, hoje CVA, desculpando-se assim do descalabro por que passa a companhia de bandeira nacional até hoje.

Com a venda de 51% dos TACV, hoje CVA, aos islandeses, o governo fez duas promessas fantásticas aos cabo-verdianos: 11 aviões boeings a voar nos céus do mundo; e nunca mais alocar um único centavo do Estado na companhia. Aqui chegaram apenas 3 aviões e quanto ao dinheiro do Estado, sabe-se que para além de avalizar um crédito de 20 milhões de euros, o governo tem assumido vários encargos de funcionamento da companhia, incluindo salários dos trabalhadores

A regionalização, prometida para o dia seguinte, num fabuloso piscar de olho passaria a ser agenda da oposição. O chefe do governo chegou inclusive a afirmar, na cidade do Mindelo, em 2018, que se dependesse da sua vontade, a regionalização já estaria concluída.

O mesmo homem que havia declarado, em 2016, que a regionalização não era uma promessa, mas sim um compromisso, esquecendo-se que se tratava de um dossier que exige o voto favorável de 2/3 dos deputados, o que requer uma negociação honesta e responsável, incompatível com o inconsequente e presunçoso “gosi é nos ki sta manda”.

É, enfim, muita crueldade de um lobo vestido de cordeiro, e que não só saíra da toca, como também se encontrava ansioso para mostrar ao que vinha, para exibir as garras, as garras todas, para desespero da nação, cuja esperança foi e vem sendo todos os dias traída de forma dramática.

E Ulisses Correia sequer via, e não vê, para os lados. Na verdade, desde cedo se mostrou insensível aos limites que se lhe impunham, ou melhor, se lhe impõem, não se importando com os prantos do povo, ou as reclamações da sociedade civil, a quem passou a chamar de “boiadas desavisadas”.

E foi assim, sem se importar com fosse o que fosse, propôs ao Presidente da República a nomeação de dois embaixadores políticos e partidários – Carlos Veiga, para Washington, e Eurico Monteiro, para Portugal. O primeiro, fundador e presidente do MpD por quase uma década e ex-primeiro ministro, o segundo, fundador do MpD, ex-presidente do Partido da Convergência Democrática (PCD) e hoje um dos dirigentes do sistema rabentola.

Quando o país inteiro esperava que o Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca iria vetar a proposta, eis que o mais alto magistrado da Nação dá o seu aval, para espanto geral. É que Jorge Carlos Fonseca havia vetado a proposta de nomeação de Mário Matos para o cargo de embaixador em Espanha, alegando tratar-se de uma figura excessivamente politizada/partidarizada.

Ora, se Mário Matos, que nunca dirigiu um partido, nunca foi primeiro ministro, é uma figura excessivamente politizada/partidarizada, então que dizer desses dois homens do sistema ventoinha?

E mais, que dizer de Jorge Figueiredo, ex-presidente da Câmara Municipal do Sal, fundador, com Eurico Monteiro e o próprio Jorge Carlos Fonseca, do MpD e mais tarde do PCD, nomeado embaixador em Angola?

A nomeação do também fundador do MpD e ex-presidente da Câmara Municipal de Santa Catarina de Santiago, Francisco Tavares, para embaixada na Nigéria vem confirmar a norma, seguindo-se José Luís Livramento e José Pedro de Oliveira Chantre, que poderão assumir para as embaixadas de Washington e Brasília, respectivamente.

São factos evidentes de flagrante violação dos princípios éticos que regem os atos das entidades públicas e que estão fazendo norma no país.

Quando os dirigentes, os órgãos do poder do Estado e as instituições democráticas são os primeiros a violar as leis, os princípios éticos, o bom senso e a palavra dada, é certo que o país sofre, e com o país, as pessoas. Com estes atos, com esta postura, estaremos a deprimir o país, a molestar a autoestima (dos diplomatas de carreira, dos jovens, dos trabalhadores, das famílias particularmente, enfim, de toda a nação) e a sanidade coletiva! Há que resgatar o Estado de Direito para salvar o país e as pessoas!

A direção,

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