O Conselho de Administração da Electra avisa que o “elevado número” de clientes com faturas de energia elétrica em atraso ameaça a sustentabilidade de todo o setor energético no arquipélago.
Numa nota do conselho de administração a empresa de produção de eletricidade (componente que o Governo já anunciou que será privatizada) e água, aponta que as dívidas de clientes registam “um valor muito elevado, causando enormes problemas na tesouraria”, prometendo “ações urgentes para a sua regularização”.
“A situação de elevado número de clientes com faturas de energia elétrica por liquidar está a causar enormes dificuldades na gestão e sustentabilidade da empresa e de todo o setor energético”, lê-se na mesma nota da Electra.
“A situação é muito mais grave e preocupante no que concerne aos grandes clientes, empresas públicas e privadas, serviços autónomos de água, indústria, setor hoteleiro, indústria de panificação, supermercados, centros comerciais e oficinas”, acrescenta.
A Lusa havia noticiado em setembro passado que os prejuízos da Electra dispararam em 2020 para 505 milhões de escudos (4,5 milhões de euros), mas as dívidas de clientes somaram naquele ano 11.330 milhões de escudos (102,6 milhões de euros).
A informação consta do relatório e contas de 2020 do grupo Electra, indicando que as dívidas de clientes – que a empresa descreve como o maior problema que enfrenta na gestão - até desceram ligeiramente, 1,7% face aos 11.525 milhões de escudos (104,5 milhões de euros) de 2019.
A maior fatia das dívidas ao grupo - que integra a Electra SA, Electra Sul e Electra Norte - era de consumidores domésticos, 5.547 milhões de escudos (50,2 milhões de euros), seguindo-se as autarquias, com 2.059 milhões de escudos (18,6 milhões de euros), as empresas públicas, com 1.918 milhões de escudos (17,3 milhões de euros), as empresas privadas, com 1.458 milhões de escudos (13,2 milhões de euros), e o Estado, com 345 milhões de escudos (3,1 milhões de euros).
Na mesma nota do conselho de administração, de 18 de fevereiro, é referido que “para pôr cobro a esta situação, está em execução, um plano de ação com medidas severas, direcionadas aos clientes de todas as localidades e de todos os segmentos, a nível nacional, com aviso prévio, a solicitar a regularização da dívida, e pagamento imediato das faturas”.
“Sendo que haverá sempre a abertura para negociação da dívida, com assinatura de acordos para amortização das dívidas antigas. Em caso de não cumprimento, recorre ao corte do serviço”, avisa a Electra.
“Os clientes deverão estar cientes e terem a consciência do mal que estão a provocar à empresa e toda economia do país, sendo uma obrigação contratual, moral e legal do cumprimento no pagamento das faturas, pois não o fazendo estão a pôr em risco todo o sistema elétrico, desde aquisição de novos equipamentos, manutenções preventivas das máquinas, principalmente nas centrais de produção, melhorias e extensões de redes elétricas e de água, para poder levar até ao consumidor final, um serviço de qualidade”, lamenta ainda a administração da elétrica cabo-verdiana.
Admite igualmente que para além da “dívida elevada”, a empresa “enfrenta outro mal”: o “furto e fraude de energia elétrica”.
“Um crime cometido por todos os tipos de consumidores, mas com maiores prejuízos e dimensões nas empresas, operadores económicos e bairros de classe média/alta, ou seja, nos chamados ‘clientes que podem pagar, mas não querem pagar’”, reconhece a Electra.
O grupo Electra fechou 2020 com um total de 813 trabalhadores.
O Governo aprovou em julho de 2021 o processo de privatização da Electra, envolvendo a cisão em duas sociedades, de produção e distribuição de eletricidade, e posterior alienação de até 75% do capital a parceiros estratégicos.
Segundo um decreto-lei do Conselho de Ministros publicado em 21 de julho, que aprova o processo de privatização, o mesmo deverá avançar em 2022 e está “em linha com as reformas económicas e estruturais preconizadas no Programa do Governo”, para “redução dos custos e a promoção e eficiência económica” na área da energia.
“O Governo pretende proceder à revisão do modelo de organização do setor elétrico, a restruturação da Electra SA e à subsequente retirada do Estado das duas sociedades em fase de constituição por cisão da atual Electra SA para, respetivamente, o exercício das atividades de produção e de distribuição de eletricidade, mediante alienação de suas participações sociais a parceiros estratégicos selecionados através de concurso público”, lê-se no preâmbulo do decreto-lei.
O processo envolve apenas a componente de eletricidade - a produção e distribuição de água manter-se-á com a Electra, pública - prevê a alienação “a um parceiro estratégico, até ao limite de 75% das ações representativas do capital social de cada uma das sociedades resultantes da cisão e/ou aumento de capital social das sociedades para alienação das ações”, recorrendo a concurso público.
Envolve ainda a “alienação a trabalhadores, emigrantes de nacionalidade cabo-verdiana e pequenos acionistas, até ao limite de 25%”, através de uma oferta pública de venda.
O preço das ações destinadas aos trabalhadores e emigrantes cabo-verdianos “deve ser determinado com o valor médio da avaliação, beneficiando de um desconto de 15%”, prevê ainda o diploma.
Refere também que os processos de alienação “só podem ser iniciados depois da criação das duas sociedades que resultarão da cisão da atual Electra SA, em curso, sendo que esta última mantém a sua personalidade jurídica após a reestruturação operada pela cisão”.
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