“CABOVERDURAS”. Economista Paulino Dias chama de autêntica "salgalhada" novo contrato de concessão dos transportes marítimos
Economia

“CABOVERDURAS”. Economista Paulino Dias chama de autêntica "salgalhada" novo contrato de concessão dos transportes marítimos

“Esta autêntica "salgalhada" nos transportes marítimos em Cabo Verde entrará certamente para a História. E para os manuais de Economia, estudada em Faculdades do mundo inteiro”, é desta forma que o economista santantonense Paulino Dias se referiu, numa publicação feita no Facebook, ao novo contrato de concessão dos transportes marítimos. 

“Tenho optado por estar um pouco afastado das questões relacionadas com a Governação de Cabo Verde, mas este é um daqueles momentos em que somos chamados a nos posicionarmos, enquanto cidadãos, contribuintes e eleitores - e, no meu caso, também enquanto Economista”, começou por dizer este que é dos mais conceituados economistas nacionais.

Conforme disse, primeiro, desenha-se um modelo de concessão que combina a liberalização do setor com a atribuição de um subsídio compensatório a apenas uma das operadoras, acoplado a um mecanismo que protege as receitas brutas totais da concessionária.

A implicação desta "engenharia" é, no seu ponto de vista, no mínimo, assustadora para os cofres públicos, uma vez que, conforme elucidou, a cada vez que um dos tais outros operadores opera numa linha, maior será o montante do subsídio compensatório que o Estado deverá pagar à Concessionária.

“Ora, duvido que esta "arquitetura inovadora", exista em qualquer outra parte do mundo! Porque normalmente ou se liberaliza o mercado (e se subsidia o passageiro, independente de qual operador este utiliza), ou se atribui uma concessão exclusiva e se subsidia a concessionária. Esta salgalhada, repito, é uma cabo-verdura”, acrescentou.

Segundo Paulino Dias, nesta revisão do contrato de concessão, o que se vê é a transferência de todos os riscos para o Estado de Cabo Verde, uma vez que a concessionária fica protegida em caso de perda de receitas operacionais, isto no quesito dos riscos comerciais 

Quanto aos riscos financeiros, Paulino Dias alerta que  o novo acordo estabelece a obrigatoriedade de o Estado prestar garantias aos bancos caso a Concessionária decidir recorrer à banca para se financiar.

Já em relação aos riscos operacionais, este economistas referiu que o contrato isenta a concessionária de penalizações em caso de "avarias ou restrições operacionais dos navios", sem no entanto mencionar quaisquer especificações.

“Ora, as Parcerias Públicas-Privadas - onde se inserem as concessões de serviço público - são acordos de gestão e partilha de riscos entre o Estado (concedente) e o privado (concessionária). Evidentemente, no processo negocial, cada parte procura "empurrar" o máximo de riscos para a outra parte. Faz parte da dinâmica. "Ganha" o melhor acordo a parte que estiver tecnicamente mais preparada para identificar, avaliar, quantificar e prevenir riscos deste tipo de acordos, e/ou que estiver numa posição negocial mais forte”, lê-se.

Neste caso em concreto, fica demonstrado, conforme Paulino Dias, que os riscos essenciais foram "empurrados" para a parte pública. “Resta saber porque”, disse.

“O dispositivo de atualização anual do valor do subsídio compensatório contém uma "subtileza" no mínimo aberrante, mas potencialmente danoso ao erário público: o Anexo III, n° II estabelece um mecanismo de atualização do valor com base no IPC (Índice de Preços aos Consumidores). Mas o n° III da mesma clausula prevê adicionalmente um ajuste indexado a 30% da variação dos preços dos combustíveis (gasóleo para marinha). O problema? O problema é que o IPC já incorpora as variações de preços de combustíveis, pelo que há ali claramente uma duplicação de indexantes”, continuou.

“Quarto (embora este não decorrente do contrato de concessão, mas aparentemente influenciado por este...): se até se pode compreender a atualização de preços de passagens de passageiros (que não são atualizados há vários anos) e a diferenciação de preços entre cidadãos nacionais e não-nacionais (andou bem o Governo neste ponto - o Estado não deve subsidiar cidadãos estrangeiros com o dinheiro dos impostos pagos por cidadãos nacionais), já não se compreende a subida brutal do preço do transporte de viaturas, que afeta sobretudo o comércio e o turismo local entre as ilhas de Santo Antão e São Vicente”, acrescentou.

Segundo afirmou, numa ilha como Santo Antão em que a Agricultura é a principal atividade económica da ilha, em que São Vicente é o único mercado dos produtos agrícolas, o turismo interno, de pessoal de SV que vai a SA aos finais de semana, tem um “impacto extraordinário” na economia da ilha, que está a perder população de forma assustadoramente rápida (sobretudo jovens), por fraca dinâmica económica da ilha e consequente disponibilidade de empregos, aumentar desta “forma brutal” os custos de transporte, além de não ter respaldo nenhum na Ciência, chega a ser uma “imoralidade” e um “crime económico” contra a ilha de Santo Antão,

“Estranha-me (mas nem tanto...!) o silêncio cúmplice dos Srs. Presidentes das 03 Câmaras Municipais da ilha e dos Ilustres Deputados! Penso que o Governo ainda vai a tempo de rever esta medida e arredar o pé. De Economista para Economista: o Sr. Ministro das Finanças Olavo Correia saberá naturalmente os impactos económicos potenciais deste aumento dos custos de transporte de viaturas entre aquelas duas ilhas. Sobretudo para uma ilha (SA), que já enfrenta desafios económicos estruturais muito difíceis!”, pontuou.

“A minha solidariedade aos agricultores, comerciantes, proprietários e condutores de carrinhas que fazem regularmente o circuito SA/SV/SA!”, finalizou.

 

 

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