As teorias extremistas afirmam que: “toda a arte popular não passa de ‘cultura naufragada’”, verifica-se, porém, que não parece que o batuku de Cabo Verde tenha um fim à vista. Até porque, o Dia Nacional do Batuco foi institucionalizado pela Assembleia Nacional, em março de 2021. A data, 31 de julho, foi escolhida para que batucadeiras, músicos, intérpretes, fazedores do batuco e toda a Nação cabo-verdiana celebrem este género musical, género tradicional da ilha de Santiago, mas, também, um património nacional. E como profetizou um dia o saudoso Orlando Pantera (1967-2001): «Batuku sta na moda[3]».
“Batuku e aima di povu” (KD) & “Batuku sta na moda” (OP)
Sobre a música cabo-verdiana muito já se falou e se escreveu.
Monteiro (2003) afiança que Cabo Verde, desde cedo, entendeu o seu papel de um país aberto ao mundo e palco da realização de um singular caldeamento humano, em todos os seus parâmetros. Local de passagem e de encontro, por sua privilegiada posição na encruzilhada das rotas, nele “emerge uma cultura fruto do encontro, cruzamento e interpenetração de culturas várias”.
Queria corroborar com a ideia de Spínola (2004) que o povo destas ilhas possui uma grandiosidade e uma profundidade espiritual caraterísticos. O povo cabo-verdiano ama a sua cultura, preza a sua identidade cultural e é, um grande promotor de atividades culturais.
Pois bem, é o que se verifica hoje, um pouco, no país com os vários grupos de Batuku, sobretudo, do dito «santiago norte» e na diáspora (Portugal, França), homens (em menor número) e mulheres – na sua grande maioria, pessoas de todas as idades, e, destaca-se o envolvimento da camada jovem, que com qualidade e mestria apresentam e dão corpo a esta nobre missão de valorizar o património nacional. O que acontece com BATUKU – tradição oral – que está sempre integrada aos diferentes aspetos da vida social cabo-verdiana, transmitindo códigos de ética e expressão estética é interessante em vários aspetos, sobretudo, nas mensagens carregadas de sentidos e significados que transmitem e querem deixar a todos que amam esta manifestação antes proibida e hoje com orgulho – Património Nacional. O Batuku acentua as formas poéticas ligadas, de modo direto ou indireto, às tradições antigas e às culturas pré-industriais (Zumthor, 1997).
Batuku - Folclore ou cultura popular – criado em 1846 por W. J. Thomas, como sendo folk – povo e lore antiga palavra designando um saber, um conjunto de costumes – não quer significar com isto, que será a única ideia sobre o folclore; “Poesia Popular” ou “poesia tradicional” reconhecidas como uma ação de recriação e de variação é o que por exemplo o grupo de Batuku de Tarrafal de Santiago – RAMANTXADAS – tentam fazer com as suas afáveis melodias, reais letras e copiosas composições que encantam.
Numa autêntica “rima rural”, com uma participação, intensidade fortes, reconhecida uma mensagem profunda que interessam aqueles(as) que com ela identificam-se. Convém, lembrar que BATUKU sofreu muitos preconceitos antes de chegar ao patamar que hoje o conhecemos. Contudo, Batuku é poesia, cântico, música e dança. Tudo isto fora proibido e chamado de manifestação “contrária à civilização[1]”.
Como escreveu Kaoberdiano Dambará (Noti,s/d)
Nha fla-m, nha Dunda, Kuse k’e batuku
Nha nxina mininu kuza k’e ka sabi.
- Nha fidju, batuku N ka se kuze:
Nu nasi nu atxa-l
Nu ta mori nu ta dexa-l
E lonji sima séu
Fundu sima mar
Rixu sima rotxa
E uzu-l tera, sabi nos gentis.
Pois é, BATUKU é sabura. E as pessoas que cantam ou fazem batuku só sabem que ele é uma maravilha “tradison di tera”; “e sabura”, ou seja, não tem explicação; mas emprestamos a palavra do músico, compositor e amante deste género musical Princezito que por sinal é um tarrafalence (piskador di puema y kasador d´inspirason) afirma que, cito: «batuku é a expressão musical mais contagiante, mais empolgante e a mais antiga do arquipélago[2]».
É o que o grupo RAMANTXADAS de Delta Cultura de Tarrafal de Santiago tenta fazer com as suas produções e danças. O Batuku é, tão somente, um dos programas de Delta Cultura Cabo Verde que se estabeleceu o Centro de Educação Tarrafal no ano de 2005, precisamente a 8 de outubro e, desde então, surgiram muitos programas educacionais. Tem sido um ativo no desenvolvimento – acabar com a pobreza através da educação – é o lema que os motiva. Delta Cultura, desde 2004, lidera dois grupos de Batuco. A Coordenadora dos grupos é a Marisa – um dos fundadores da Delta Cultura. Com os grupos quer contribuir na preservação dessa maravilhosa cultura cabo-verdiana (deltacultura.org).
A Delta Cultura tem as suas raízes na Áustria, onde a Associação foi registada pela primeira vez em junho de 2002 com o nome Delta Cultura – Associação para a Comunicação Intercultural. Os fundadores foram Estela Amarília Cabral Correia (conhecida por Mariza – atualmente Diretora do Departamento Cultural da Associação em Cabo Verde), Florian Wegenstein (atualmente Gerente do Centro de Educação Tarrafal) e Walter Loffler. As primeiras atividades realizadas no Tarrafal foram, ainda em 2002, a Escola de Futebol para crianças de rua e em 2004 a criação do grupo de batuco Batukaderas Delta Cultura, são exemplos de algumas de muitas atividades desta associação sediada em Tarrafal de Santiago.
É de recordar que todos os anos em dezembro por iniciativa desta associação em parceria com a CMT, reúnem grupos de batucadeiras e batucadores das nossas Ilhas, em festival de Batuku. Este ano foi a 19ª Edição do Festival de Batuco "Nos Tradição" que tem como principal objetivo a divulgação e promoção do Batuco. Esperamos que tal tenha vida longa e maior contribuição das autoridades local e nacional, bem como, Políticas Públicas e Culturais que garantam a continuidade de trabalhos quantitativos e qualitativos em prol da cultura como fator de desenvolvimento integrado, intervenção social, promoção da democracia e participação condigna ao nível desejado deste género musical, cultural de Cabo Verde.
As teorias extremistas afirmam que: “toda a arte popular não passa de ‘cultura naufragada’”, verifica-se, porém, que não parece que o batuku de Cabo Verde tenha um fim à vista. Até porque, o Dia Nacional do Batuco foi institucionalizado pela Assembleia Nacional, em março de 2021. A data, 31 de julho, foi escolhida para que batucadeiras, músicos, intérpretes, fazedores do batuco e toda a Nação cabo-verdiana celebrem este género musical, género tradicional da ilha de Santiago, mas, também, um património nacional. E como profetizou um dia o saudoso Orlando Pantera (1967-2001): «Batuku sta na moda[3]».
JLFurtado (26 de novembro de 2023)
DAMBARA, Kaoberdiano (s/d): Noti. Ediçao do departamento da informação e propaganda do comité central do PAIGC.
MONTEIRO, César A. (2003): Manuel D´Novas: música, vida, caboverdianidade. Gráfica de Mindelo, S. Vicente. Dezembro, 2003.
SPÍNOLA, Dany (1994): Evocaçoes Vol. I. Ed. IBNL. Dezembro, 2004. Praia.
ZUMTHOR, Paul (1997): Introduçao à Poesia Oral. Editora HUCITEC.
[1] Confere B.O. nº 23, Praia, 8 de junho de 1929.
[2] http: //www.expressodasilhas.sapo.cv/noticias/detail/id/6933/ (10.01.2009)
[3] Os jovens cantores da Geração Pantera (2011) – estudo e pesquisa (em brochura do autor).
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