I
Lisboa do estrangeiro
Cidade perde seu carreiro
Uma vez soube marinheiro
Agora não vê aportar seu veleiro
II
Corvos e gaivotas de mastro quebrado
Divorciaram-se à luz do quebrantado
Largaram vela
Não chamando por caravela
Os negros falantes
Viajantes ao favor dos ventos da inteligência
As outras, devotas
De botas altas
Caíram certeiras
Adentro do fétido arraial
Casadas com o temporal
Abatido à urbe que desencanta urbanidade
Viadutos em bruto com pouco reduto
Que ventania na cidadania
III
Lisboa que é do estrageiro
É cidade que perde seu carreiro
Longe do seu caseiro
Cava fundo seu outro outeiro
PESADELO
I
De sobressalto a um pesadelo
Sem desvelo
Levantei-me beijando a mesa da bica
Reformulando
Pela membrana olvidada
A Terra dos poupados às elites
Daqueles remanescentes
Alguns mantêm os dentes
Finos, fininhas
Afunilados sem vinhas
De outros incluídos
Mas pouco intuídos
Dos ressabiados
Mas sempre assobiados
Dos recalcados
Frustrados, calados
Aos integrados
Dados por degradados
Dos marginalizados
Aos desintegrados
Dos excluídos
Eternizados moinhos moídos
II
De sobressalto a um pesadelo
Atordoado
Pensei no pesadelo da Terra feita guetos
Becos, bairros e bairrismos
Cada afinado a seu tom
Mas há outros que não afinam
Vivem permanente desafino
Desatino permanente
Arrancam-lhes o diapasão ao sol-posto
À Claridade do dia
Não são guetos, becos, bairros ou bairristas
Eles são ruas e ruelas, avenidas, praças e estradas
Arcadas também
E algerozes
De papelão embrulhado por notícias de jornal
Acomodados ao imóvel lancil
III
De sobressalto a um pesadelo
Com desvelo
Voltei à posição neutral
Entornei a bica dentro do pires da chávena
A colher atirou-se ao chão
Estrilhando com tonturas
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